Viagem do Sporting para Nápoles, onde jogou na fase de liga da UEFA Champions League, foi muito atribulada
Viagem do Sporting para Nápoles, onde jogou na fase de liga da UEFA Champions League, foi muito atribulada - Foto: Imago

Sporting: pré-jogo, quando a rotina fica em terra

'Desportiva_MENTE' é o espaço de opinião quinzenal de Liliana Pitacho, psicóloga e docente no Instituto Politécnico de Setúbal

Este artigo analisa a importância das rotinas na fase de pré-jogo e os incidentes que marcaram a deslocação do Sporting a Nápoles. É escrito ainda antes do apito inicial e não pretende comentar o resultado, mas sim refletir sobre a forma como as rotinas, ou a sua perturbação, impactam na performance desportiva.

Como primeiro incidente as quatro horas dentro de um avião imobilizado. Esta espera provoca desconforto físico prolongado, em espaço apertado, com circulação comprometida e postura forçada. A isto junta-se a incerteza: vamos ou não vamos? Chegamos hoje ou já é demasiado tarde? Esta combinação de desconforto físico e incerteza é um terreno fértil para aumento dos níveis de stress. São, então, acionados uma série de mecanismos como o aumento da frequência cardíaca, tensão muscular e libertação de cortisol. A ansiedade não nasce apenas do eventual medo, mas também da ausência de controlo.

Ao tempo de espera segue-se uma refeição tardia (após as 22h00). Do ponto de vista cronobiológico, este horário de refeição interfere negativamente na produção de melatonina e altera a arquitetura do sono. O corpo entra num estado de digestão quando o que precisava era de iniciar um processo de recuperação. Uma refeição tardia, aliada à ativação prévia provocada pelo stress da viagem, compromete a transição para um sono profundo e reparador. Mas a perturbação à rotina e processo de preparação não ficou por aqui, a noite foi novamente interrompida por fogo de artifício, símbolo sonoro que não permite o desligar necessário. Sabemos que o sono, especialmente nas fases profundas, é o momento em que se libertam hormonas anabólicas responsáveis pela regeneração muscular e recuperação. É também durante o sono que o cérebro realiza processos de consolidação da memória e de regulação emocional. Um sono fragmentado, encurtado ou de má qualidade afeta diretamente a performance física e cognitiva do dia seguinte, os atletas acordam mais lentos, mais irritáveis e com maior propensão ao erro e também à lesão.

A pré-competição faz-se de rotinas, é na sua repetição que se cria previsibilidade, segurança e que se recupera de forma eficiente. E isto nada tem a ver com superstição, trata-se de neurociência. O cérebro otimiza-se quando sabe o que esperar, quando o inesperado sucede instala-se um ruído interno difícil de silenciar. Mas isto determina o que esperar do resultado? Claro que não, existem outros fatores cruciais, mas aponta para condicionantes desfavoráveis e implica um maior esforço dos atletas e uma maior atenção de gestão da equipa técnica.