Portugal celebra o segundo golo frente à Hungria (José Sena Goulão/LUSA)
Portugal celebra o segundo golo frente à Hungria (José Sena Goulão/LUSA)

Ser equipa grande também é saber sofrer mas conseguir ganhar (crónica)

Vitória muito mais suada para Portugal frente à Hungria do que a estatística pode fazer adivinhar. Lusos dominantes não conseguiram parar Varga, que, com dois remates à baliza, fez dois golos. João Cancelo voltou a destacar-se e fez o golo da vitória

Parecia impossível sofrer e, de repente, parecia impossível não terminar em sofrimento. A lição estava bem estudada mas, seja por boa execução adversária ou má execução portuguesa, o contra-ataque e a bola aérea iam sendo fatais para as aspirações lusas. Não haverá dúvidas da justiça do vencedor, numa partida em que Portugal teve mais dez remates que a Hungria e teve 69% de posse de bola, mas a novidade de ter Rúben Neves a central parece não ter dado os frutos que Roberto Martínez podia ter desejado.

Contudo, se «não há omeletes sem ovos», às vezes parece que há ovos que se partem, mexem, temperam e cozinham sozinhos. E quando uma equipa tem os melhores nomes do Mundo do futebol, fazer acontecer também depende do génio individual, como o que teve João Cancelo quando, a faltar pouco tempo e com o jogo empatado, ganhou a bola e, com um disparo à entrada da área, acabou com a chama da esperança húngara que Barnabás Varga, mais que qualquer outro, fez por acender.

Portugal tentou impor o jogo ofensivo e de posse logo desde início. A construir numa linha de 3, com Vitinha a juntar-se aos centrais, uma das dinâmicas que os portugueses mais quiseram explorar foram as relações entre lateral, extremo e médio-centro e, tal como na Arménia, o lado direito, com João Cancelo, Bernardo Silva e João Neves mostrou-se mais que o esquerdo, em que contava com Nuno Mendes, Pedro Neto e Bruno Fernandes.

Os primeiros minutos foram de maior perigo português, que conseguiu quebrar o estruturado 5x4x1 adversário, ainda que sem conseguir rematar à baliza. Foi, aliás, quando explorou a entrada de um médio nas zonas mais laterais da área que a Seleção Nacional conseguiu, no primeiro tempo, criar mais perigo frente a uma Hungria que, uma e outra vez, recorreu à bola longa e ao tamanho do avançado Barnabás Varga para conseguir… qualquer coisa.

Minuto 21. As bancadas levantaram-se para aplaudir Diogo Jota, o antigo camisola 21 da Seleção Nacional. E, ao contrário do que havia acontecido no primeiro jogo, não foi bom para Portugal. É que esta Hungria tinha uma arma perigosa: o contra-ataque. E com os portugueses projetados, uma perda de bola, que foi parar aos pés de Szoboszlai, foi fatal. O capitão lançou para onde não estava nem Cancelo nem Rúben Neves, Nági cruzou e Varga, marcado na altura por Vitinha, nem teve de saltar para fazer o primeiro para os húngaros, no único remate que fizeram à baliza na primeira parte.

O golo ainda pareceu atordoar Portugal, mas à meia hora já a Seleção jogava como ainda não se tinha visto na Puskás Arena. As oportunidades surgiram uma a seguir à outra, sempre mais descaídas para a direita: primeiro João Neves deu a Ronaldo, que rematou para grande defesa de Tóth. Logo a seguir, foi o médio do PSG a aparecer sozinho na área para fazer o guardião brilhar outra vez. Mas à terceira foi mesmo de vez: Cancelo tocou, Bernardo Silva dominou e, no regresso à titularidade, disparou para fazer o empate, que se manteve ao intervalo.

No início do segundo tempo… mais do mesmo. A Hungria, bem fechada na sua estrutura defensiva, tentava, com relativo sucesso, estancar as investidas portuguesas. Porém, a bola parada seria traidora. Na sequência de um canto, Ronaldo desviou e Loic Négo tocou a bola com a mão. Chamado a converter o penálti, o capitão não vacilou. Golo 141 pela Seleção Nacional, o quinto jogo consecutivo a marcar com a camisola das quinas e um golo que dava a total justiça ao resultado.

A reação dos da casa veio devagarinho, mas sempre constante. Pé ante pé, ora era Varga numa incursão pela esquerda, ora era num cruzamento que acabava aliviado. Devagarinho, quase sem se notar por isso, a Seleção parecia perder um pouco da dinâmica e do discernimento que, até então, tinha mantido. A Hungria não conseguia rematar… até que conseguiu. E no único remate húngaro à baliza do segundo tempo, Barnabás Varga voltou a cabecear para golo. 84 minutos, dois disparos enquadrados dos magiares, dois golos, os mesmos de Portugal, que já havia tentado uma, e outra, e outra vez.

Às vezes podemos esquecer-nos da qualidade absoluta de um jogador como João Cancelo. É certo que joga num campeonato periférico e que, na época passada, acabou por ser muito assolado por lesões, mas isso não muda o facto de ser um dos mais talentosos jogadores do planeta. E aos 86', como quem reage a um choque elétrico provocado pelo golo adversário, ganhou a bola, apareceu à entrada da área e finalizou para o 3-2 e para a festa portuguesa.

Não haveria mais nenhuma alteração no marcador, num jogo pleno de oportunidades, mas sobretudo para um lado, que, se a estatística mandasse, teria tido um resultado bem mais desequilibrado. Por um lado, pedir-se-á maior qualidade à Seleção Nacional no momento de fechar o jogo. Mas são já seis pontos, todos eles conquistados fora, nesta luta pelo acesso ao Mundial 2026. Nem as grandes equipas jogam sempre bem e vencem de forma tranquila. Mas arranjam quase sempre maneira de o fazer, tal como fez Portugal na Hungria.