Mourinho e a luz ao fundo do túnel
Quando Rui Costa apresentou José Mourinho terão sido poucos aqueles que discordaram de que o treinador seria o remédio de que a equipa precisava para o momento. Também houve, é preciso reconhecer, quem discordasse, mas até pela reação adulta dos restantes candidatos às eleições de 25 de outubro depressa se instalou a perceção de que se tratou de escolha certa. Essa ideia só poderá ter sido reforçada, na generalidade, depois das primeiras conferências de Imprensa e da vitória na Vila das Aves.
Mas, seja com Mourinho ou outro treinador qualquer, nesta voragem pelo imediato tudo mudou com o empate do Benfica, na Luz, com o Rio Ave.
A realidade é, como sabemos e muitas vezes ignoramos, consciente ou inconscientemente, sempre mais complexa. Não é que o futebol, como anunciou o treinador Renato Gaúcho quando anunciou a demissão do Fluminense, ontem de madrugada, esteja a acabar, para jogadores e treinadores, sob o efeito ruim das redes sociais, que amplificam os elogios quando se ganha e as críticas quando se perde. Mas, por essa circunstância, também muito mudou.
Não apenas no futebol, a política é também um bom exemplo. Tudo se tornou ainda mais epidérmico, não há paciência ou tolerância para nada que fuja das bolhas em que vivemos e nas quais nos sentimos confortáveis.
É, pois, num contexto de más exibições e piores resultados, agravado pelo contexto das eleições, sob um manto de escuridão, que muitos, no Benfica, corroídos por dúvidas e incertezas, interpretaram o regresso de Mourinho à Luz como um sinal de esperança, uma luz ao fundo do túnel.
Mourinho voltou ao futebol português com pezinhos de lã, mais maduro, conciliador, generoso nos elogios, prudente nas críticas, argumentativo nas explicações, como uma espécie de senador, como os italianos, que bem conhece, gostam de dizer.
Bem diferente daquele Mourinho que saiu de Portugal, ainda na Primavera de uma carreira já com títulos com que alguns só podem sonhar, com sangue na guelra. Lembro-me, como se fosse hoje, da reação dos jornalistas e operadores de câmara na cerimónia de apresentação como treinador do Chelsea, que tive a felicidade de acompanhar, em Stamford Bridge, em 2004 — não sabiam bem o que estava a acontecer, nem o que iria acontecer, ficaram a saber que ali estava alguém especial.
E o Benfica precisa, mais do que nunca, dessa aura, de Mourinho combativo, desafiador, provocador, cru, irritante e arrogante. O Benfica precisa de um abanão forte que ninguém melhor que Mourinho pode dar, por conhecer bem as idiossincrasias do clube e do futebol português e por nelas saber navegar.
Que chame, em bom português, os bois pelos nomes. Que aponte o dedo aos jogadores ou a quem quer que seja. Sócios e adeptos precisam, neste momento e mais que nunca, de um líder. E Mourinho disso não se pode demitir.
O Benfica e os adeptos e sócios do Benfica, órfãos de felicidade nos últimos anos, precisam de Mourinho especial, sob o risco de a luz de esperança ao fundo do túnel mais não ser que a luz de um comboio a aproximar-se a alta velocidade.