Diomande celebra golo de Pote frente ao Alverca (Foto: Miguel Nunes)
Diomande ganhará ritmo em competição. (Foto: Miguel Nunes)

Na noite das bruxas, o feitiço estava no caldeirão dos leões (crónica)

Contra um Alverca que reconheceu as suas limitações, fechando-se muito e jogando de forma prática, Rui Borges teve de ir buscar ao banco os ingredientes que tornassem uma realidade que estava cinzenta, na magia da vitória. O treinador do Sporting mostra-se cada vez mais confortável na forma como maneja o plantel que tem a disposição...

Três dias depois do Sporting ter goleado o Alverca para a Taça da Liga, haveria quem esperasse as mesmas facilidades no jogo do Campeonato. Porém, como cada jogo é ele e as suas circunstâncias, e desta feita, apenas subiram, como primeiras escolhas, ao relvado de Alvalade, cinco jogadores, todos dos visitantes, que tinham estado no 5-1 de 72 horas antes, a história foi naturalmente outra. Quer isto dizer que, depois do passeio anterior, Rui Borges, desta feita, perante uns ribatejanos que se fecharam com unhas e dentes, num 4x5x1 que quase não contemplava saídas de bola floreadas e privilegiava o futebol direto, teve de recorrer às reservas de ouro que tinha no banco para fazer com que a estratégia de Custódio Castro entrasse em falência.

Como o treinador do Sporting tinha argumentos fortes, e o do Alverca nem por isso, acabou por prevalecer a lei do mais forte. Mas este jogo também deu para ver que Rui Borges, que tem um plantel construído numa base old school, com dois jogadores de raiz por posição, sem dar demasiado valor às polivalências, se sente cada vez mais confortável na forma como maneja os seus jogadores, criando, durante o jogo, novos problemas que os adversários têm dificuldade em combater. É possível dizer que é mais fácil explicar a forma como o Sporting joga do que, propriamente, encontrar forma para contrariá-la. 

ALVERCA E SPORTING

Custódio Castro não trouxe coelhos na cartola para Alvalade, muito menos, em noite de Halloween, se sentou na vassoura da bruxa para lançar um feitiço aos leões. O que preparou foi aquilo que vimos vezes sem conta na nossa Liga, onde se defrontam equipas com orçamentos obscenamente díspares, que passa por fechar a baliza com um 5x4x1 com linhas baixas, deixando na frente um jogador — Mariza Milovanovic que protagonizou um duelo de titãs com Diomande —  à espera de que o anzol lançado no meio do mar trouxesse peixe.

Apesar de o Sporting ter disposto de pelo menos três ocasiões claras para marcar, a que o poste (17), Meupiyou (35), Abdulai (45) se opuseram, além de um golo anulado a Suárez (50) por estar deslocado oito centímetros, a verdade é que se chegou aos 68 minutos com o nulo no marcador. E, até lá, como jogou o Sporting? A uma defesa em que Inácio dava a profundidade que Diomande ainda não tem, e em que Fresneda (mais) e Vagiannidis (menos) exploravam a direita, enquanto Maxi reinava na esquerda, Catamo surgia mais encostado à linha junto primeiro ao espanhol, e depois ao grego, e Pedro Gonçalves, do lado contrário, dava a linha a Maxi e deslocava-se para zonas interiores, onde criava desequilíbrios significativos. Por seu turno, Hjulmand, horizontal, e João Simões, vertical e com chegada à área, funcionavam como uma espécie de Keane e Scholes à moda do Sporting. Enquanto isso, Trincão, jogando nas costas do incansável trabalhador que é Suárez, era uma espécie de agente do caos devido a uma mobilidade constante, o que, tudo junto, resultou em muitos sobressaltos para defesa ribatejana, resolvidos no limite do desespero.  

AS RESERVAS DE OURO 

Por vezes, não basta ter ouro no banco, é preciso saber usá-lo. E foi isso que Rui Borges fez quando, aos 59 minutos transformou o 4x2x3x1 em 4x4x2, com a saída de João Simões e a colocação de Ioannidis junto a Suárez (Pedro Gonçalves passou a oito, puro e duro), ao mesmo tempo que refrescava a ala direita, trocando Catamo por Quenda. Percebia-se que o golo estava a chegar, era apenas uma questão de tempo, e acabou por ser ao décimo pontapé de canto para os leões, batido por Pedro Gonçalves, que Ioannidis fez o 1-0, de cabeça, estavam jogados 68 minutos. 

Como lhe cumpria, Custódio Castro reagiu, trocando Lincoln por Davy Gui no minuto seguinte, mas seria Pedro Gonçalves a assinar o lance que valeu o preço do ingresso em Alvalade na noite chuvosa do dia das bruxas: aos 74 minutos, o internacional português trabalhou bem a bola fora da grande área do Alverca, e concluiu a ação com um petardo cruzado, que não deu a mínima hipótese a André Gomes. Desta feita, não fez o seu habitual passe para a baliza, preferiu usar a artilharia pesada e explodir as redes ribatejanas. 

Nesse instante, pese embora o treinador do Alverca ainda tenha mexido na equipa com Tiago Leite e Kauan (81), toda a gente percebeu que estava tudo resolvido, a começar por Rui Borges, que a partir dos 78 minutos começou a pensar no compromisso com a Juventus, poupando Pedro Gonçalves e Suárez. Até ao fim da partida, recorrendo a um ‘cliché’, pode dizer-se que o Sporting deixou escoar os minutos, descansando com bola, enquanto que, à medida que o final se aproximava, até os ribatejanos suspiravam pelo apito final.  

Num jogo em que provavelmente não esperariam tantas dificuldades, os leões mostraram argumentos de plantel muito interessantes, e, acima de tudo, passada que foi uma fase mais cinzenta, as cores brilhantes parecem ter regressado ao grupo liderado por Rui Borges.