André Villas-Boas, presidente do FC Porto - Foto: ANDRÉ CARVALHO
André Villas-Boas, presidente do FC Porto - Foto: ANDRÉ CARVALHO

Contas à moda do Porto

#Minuto 92 é o espaço de opinião de Ricardo Gonçalves Cerqueira, jurista, gestor de empresas e sócio do FC Porto

Mesmo sem a participação na Liga dos Campeões na época 2024/25, a SAD do FC Porto alcançou um resultado líquido de 39,2 milhões de euros e uma recuperação significativa dos capitais próprios, que passaram de -113,8 milhões para -10,5 milhões de euros: uma melhoria de 103,3 milhões.

Segundo o Relatório e Contas divulgado recentemente, este desempenho financeiro deveu-se a um conjunto de fatores: resultado operacional positivo antes da abertura do mercado de transferências, aumento das receitas comerciais (impulsionadas pelo crescimento do número de sócios, venda de lugares anuais e bilhética), forte contenção de custos operacionais, receitas significativas com alienação dos passes de jogadores, reestruturação completa da dívida financeira (permitindo alargar prazos e reduzir custos) e uma melhoria expressiva da liquidez, com uma redução de 212 milhões de euros na diferença entre ativo e passivo corrente.

O resultado positivo de mais de 39 milhões de euros representa um dos melhores desempenhos financeiros da SAD portista, que conseguiu inverter o prejuízo de 21 milhões registado no exercício anterior (2023/24), ano em que o clube disputou a Liga Europa e sofreu uma quebra de receitas superior a 47 milhões de euros.

Excluindo as receitas provenientes das transferências de jogadores, o resultado manteve-se positivo em 2,44 milhões de euros – em contraste com os 1,97 milhões negativos do ano anterior. Os proveitos operacionais totalizaram 149,5 milhões de euros, o que representa uma quebra de 14% face a 2023/24. A ausência de participação na Liga dos Campeões resultou numa perda de receita expectável na ordem dos 47,9 milhões, que, ainda assim, foi parcialmente compensada em 17 milhões obtidos com a participação no Mundial de Clubes.

Os custos operacionais sofreram uma redução superior a 29 milhões de euros, destacando-se a diminuição de 10,1 milhões na rúbrica de fornecimentos e serviços externos e de 7,5 milhões nos custos com pessoal.

Relativamente à cedência de passes, os proveitos ultrapassaram os 100 milhões de euros, com receitas totais de 171,5 milhões – valores importantes suportados pelas transferências de jogadores como Evanilson, Galeno e Nico González, bem como pelos valores obtidos através de empréstimos, nomeadamente o de Francisco Conceição à Juventus.

A recuperação dos capitais próprios foi impulsionada não só pelo resultado líquido de 40,99 milhões de euros, como também pela entrada da Ithaka no capital da Porto StadCo, com a aquisição de 30% dos direitos económicos por 65 milhões de euros, podendo ainda este valor vir a atingir os 100 milhões de euros.

A melhoria da liquidez refletiu-se na redução de 212,1 milhões de euros na diferença entre ativo e passivo corrente, passando de -243 milhões em junho de 2024 para -31 milhões em junho de 2025 – eliminando, assim, os desequilíbrios críticos de tesouraria registados no final do exercício anterior.

O esforço encetado pela administração da SAD para estancar o declínio económico-financeiro que se vinha registando ao longo dos últimos anos no universo do Futebol Clube do Porto parece finalmente começar a dar os primeiros frutos. Recuperada a credibilidade financeira, a aposta passa agora por devolver a competitividade à dimensão desportiva.

Em contraponto, e numa análise sumária ao exercício de 2024/25 apresentado pelo Benfica, merece referência a excessiva dependência de alienação de passes de jogadores, uma vez que uma parte significativa do lucro do clube encarnado na época finda advém da intensiva transação de jogadores, sem a qual o resultado líquido seria negativo em cerca de −12 milhões de euros.

Esta dependência torna a sustentabilidade financeira do clube vulnerável a fatores externos como o mercado internacional de transferências, a volatilidade dos valores dos passes dos atletas ou da capacidade financeira dos clubes compradores.

No que concerne aos custos operacionais, regista-se um aumento significativo, na casa dos 21,9% para cerca de 226,7 milhões de euros.  Especificamente, no primeiro semestre de 2024/25, os custos operacionais, sem transações de jogadores, ultrapassavam largamente os rendimentos operacionais, indiciando que, sem estas mais-valias, a operação seria deficitária.

No primeiro semestre, por cada 10 euros de receita operacional sem vendas de jogadores, os custos eram cerca de 13,5 euros. Ou seja, mesmo antes de contar com as transferências, o Benfica apresenta um balanço de despesa superior ao da receita. Isso demonstra que o core-business (bilhetes, quotizações, royalties, venda de produtos, etc.) ainda não está suficientemente robusto para suportar os elevados custos fixos da operação do clube.

Em síntese, o FC Porto dá sinais claros de recuperação e disciplina financeira que permitem reforçar a ambição no plano desportivo, enquanto o Benfica denota uma vulnerabilidade estrutural ao fazer depender o sucesso do exercício financeiro quase exclusivamente das mais‑valias obtidas com a alienação de passes de jogadores.

Jorge Costa (SINAL +)
Centro de Treinos e Formação Desportiva Jorge Costa. Eternizar o nome, a história e o legado do eterno capitão do FC Porto. Homenagem justa, merecida e oportuna.
Seleção Nacional (SINAL -)
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