O espanhol Mario Aparicio foi expulso do Tour de Mentougou na China. IMAGO
O espanhol Mario Aparicio foi expulso do Tour de Mentougou na China. IMAGO

Ciclista expulso de prova e ameaçado de morte por causa de um emoji

Um dos 3.953 emojis oficialmente reconhecidos no padrão Unicode de 2025 bastou para causar uma enorme confusão numa corrida de ciclismo na China. O espanhol Mario Patricio viu-se em 'maus lençóis' por causa de um porco e chegou mesmo a ser intimidado no Tour de Mentougou, em Pequim

A equipa espanhola Burgos Burpellet BH alcançou um feito notável no circuito asiático, ao garantir os três lugares do pódio na classificação geral do Tour de Mentougou, em Pequim. Clément Alleno, Carlos García Pierna e Antonio Angulo foram os protagonistas mas aquilo que tinha tudo para ser um excelente momento na história da equipa acabou numa enorme confusão, com um dos seus corredores a ser expulso e a sair rapidamente do país.

O ciclista em questão é Mario Aparicio, de 25 anos, que se viu no centro de uma onda interminável de críticas nas redes sociais chinesas. A polémica começou com uma publicação que o espanhol fez no Strava onde, ao lado do mapa da etapa e dos dados da corrida, colocou o emoji de um porco junto à bandeira da China.

Ora, num regime onde a liberdade de expressão é limitada, as represálias foram imediatas.

A imprensa local, controlada pelo Partido Comunista Chinês, noticiou o caso de imediato, escrevendo: «Um ciclista espanhol publicou conteúdo inapropriado nas redes sociais, justapondo a bandeira nacional chinesa com o emoji de uma cabeça de porco, o que desencadeou uma grande controvérsia».

A interpretação negativa espalhou-se como um rastilho. «Alguns internautas chineses a viver em Espanha assinalaram que o ciclista tentou fazer uma associação ofensiva, porque em espanhol a palavra cochina [porco] é frequentemente usada como um termo depreciativo. Foi um insulto à nossa nação», referiu outro jornal.

Com a imprensa a fazer eco da polémica, os utilizadores chineses dedicaram-se a pesquisar o histórico de Aparicio no Strava e constataram que, em outras provas, ele publicava apenas a bandeira do país, sem qualquer emoji adicional, o que foi visto como mais prova de «uma clara intenção grosseira».

A publicação foi apagada, mas já era tarde demais. A organização do Tour de Mentougou desqualificou o atleta, justificando a decisão com o facto da publicação constituir «um comentário inapropriado que atenta contra o espírito desportivo, prejudica a imagem do evento e tem um impacto social negativo».

Nas redes sociais chinesas, como o Weibo, multiplicaram-se os apelos por um pedido de desculpas público que, no entanto, não aconteceu.

Em declarações ao jornal espanhol El Mundo, a equipa Burgos defendeu o corredor, alegando que a situação foi descontextualizada. «O Mario publicou o emoji do porco como uma brincadeira interna para o colega que tinha vencido a etapa [Carlos García Pierna], algo sem malícia e sem qualquer relação com o povo chinês. Foi apenas uma infeliz coincidência», alegou.

Só que a situação escalou rapidamente.

«Começaram a surgir inúmeros comentários no seu perfil do Strava e nas redes sociais chinesas com insultos e até muitas ameaças de morte, uma situação completamente descontrolada. Depois disso, os organizadores e o júri decidiram desqualificar o ciclista», explicou a equipa, acrescentando que tentaram esclarecer o mal-entendido. «O ciclista já abandonou o país e tudo foi resolvido».

Outras polémicas

Esta não foi a primeira vez que aconteceram incidentes diplomáticos no ciclismo.

Recentemente, o ciclista alemão Vinzent Dorn, da equipa BIKE AID, gerou muita polémica após o Tour do Lago Poyang, quando fez um post a relatar a sua experiência: «Obviamente, a China não é o meu país favorito, pois carece de liberdade de expressão e de padrões democráticos».

O agente de outro ciclista da mesma equipa, Oliver Mattheis, contactou o diretor de uma equipa chinesa para falar sobre uma possível transferência. A resposta do diretor chinês, partilhada nas redes sociais, foi agressiva e incluiu insultos e ameaças. A tensão terá sido agravada por uma «brincadeira» de Mattheis, que escreveu palavras ofensivas num saco de brindes do evento.