Cláudio Borges rodeado de alguns dos jogadores com quem trabalha, entre os quais Rui Silva, guarda-redes do Sporting - Foto: D. R.
Cláudio Borges rodeado de alguns dos jogadores com quem trabalha, entre os quais Rui Silva, guarda-redes do Sporting - Foto: D. R.

Boost Campus: ser melhor é sempre possível, com trabalho e boa orientação

Rivaldo acompanha a evolução dos filhos, Isaque e João Ferreira, ambos jogadores do Chaves, que complementam treinos na academia, com cinco pólos em Portugal, onde trabalham com mais de 100 jogadores profissionais. 'Off season' é fulcral

O que têm em comum Akturkoglu, Pedro Malheiro, Jota Silva, Rui Silva, Nuno Santos, Zé Carlos, Dolores Silva, Nuno Moreira, Nuno Lima, Encada, Fábio Ronaldo, Gabriel Rodrigues, Afonso Patrão, Rodrigo Ribeiro, Isaque e João Ferreira, estes dois últimos filhos de Rivaldo? São alguns dos jogadores profissionais que recorrem ao Boost Campus Academy para complementar o trabalho que realizam nos clubes.

Falamos de um espaço de treino individualizado que conta com mais de 700 atletas, 100 dos quais a jogar em ligas profissionais e até no estrangeiro, distribuídos por cinco pólos, nomeadamente em Esposende, Porto, Guimarães, Braga e Lisboa.

João e Isaque Ferreira, filhos de Rivaldo, com Cláudio Borges - Foto: D. R.

É fundamental o trabalho aí feito individualmente e as conversas com os jovens

Rivaldo acompanha os dois filhos no Boost Campus - Foto: D. R.

«Começamos a acompanhar os atletas desde os cinco anos até ao final da carreira. E há um aspeto curioso: a maioria dos treinadores da academia são ex-atletas que estavam aqui a treinar, em final de carreira e, ainda em atividade. Fizeram a transição para dar treino, como por exemplo o Daniel Candeias, da Académica, que tem na carreira passagens por Benfica, FC Porto e Rangers. Já com 37 anos não sabia muito bem aquilo que queria fazer, se ser diretor desportivo, se ser treinador. Convidei-o para treinar aqui na academia e ele percebeu que é isto que quer, ser treinador. Também já faz parte do nosso trabalho ajudar os jogadores na vida pessoal», revela Cláudio Borges, fundador do Boost Campus.

Fernando Andrade, que já representou o FC Porto, e agora é jogador dos turcos do Amedspor SK - Foto: D. R.

Literacia financeira

Além do treino em si, a academia oferece uma panóplia de serviços: da nutrição à psicologia, passando pela optometria desportiva e literacia financeira, um assunto pouco dominado pelos jogares e que é fundamental.

«Vou dar o meu exemplo. Quando fui jogar para Angola — e em Portugal ganhava pouco — passei a ganhar dez vezes mais. Se eu, na altura, tivesse a mentalidade que tenho agora e tivesse pessoas ao meu lado que me pudessem ajudar, no sentido de orientar no que havia de investir, teria sido diferente», começou por realçar Cláudio Borges.

Excelentes profissionais que contribuem para o meu sucesso ano após ano

Pedro Malheiro elogia trabalho feito na academia - Foto: D. R.

«Daí termos um consultor na empresa que dá aulas de literacia financeira, principalmente aos profissionais, porque têm muito dinheiro para investir, mas também àqueles que começam agora a ganhar dinheiro, como é o caso, por exemplo, do Afonso Patrão [SC Braga], que trabalha connosco. É um miúdo que não estava habituado a ganhar dinheiro, começou a ganhar mais e também protagonismo, tem um contrato de trabalho que não é mau para a idade dele. São pequenos detalhes que fazem com que no campo se torne melhor jogador, porque está tranquilo, é menos uma preocupação», conta o responsável do Boost Campus.

Gelson Dala trabalhou visão

Outro aspeto que Cláudio Borges aponta como sendo fulcral para o bom desempenho dos jogadores é a optometria desportiva. «A performance vai muito além daquilo que é a parte técnica, por isso temos esses serviços todos para cuidar da parte psicológica, financeira, de nutrição e também de optometria. Dou o exemplo do Gelson Dala, que jogou no Sporting e está agora no Qatar. Trabalha connosco há mais de quatro anos e em 2024, numa avaliação normal — não se suspeitava de nada —, percebeu-se que quando a bola vinha rasteira, tanto do lado direito, como do esquerdo, ele não tinha visão periférica quase nenhuma», contou.

«Ou seja, o remate dele, nesse caso que é a ponta de lança, era condicionado, porque só via a bola quando chegava a ele. Precisou de treino muscular da visão para corrigir e, claro, melhorar. Ora, se alguém tivesse dado conta da situação há mais tempo, o Gelson já há muito que tinha melhorado. Reforço, são pequenos pormenores que podem fazer muita diferença no rendimentos dos jogadores», concluiu.

Pseudo-craques são difíceis

Uma centena de jogadores profissionais trabalha na Boost Campus. Qual é o período mais importante desses treinos, tendo em conta que no decurso dos campeonatos há menos disponibilidade, tanto de tempo como também a nível geográfico?

«É a off season. Após pausa de três/quatro semanas, de férias, sabem que têm de chegar aos clubes nas melhores condições. É claro que não pomos o atleta a voar na pré-época, mas chegam aos clubes com o peso certo, o tato com bola, o cardio no sítio, não se cansam tanto, não têm dores musculares nem bolhas nos pés. São aspetos que parecem de menos, mas, tal como diz o nosso slogan, todos os pormenores contam», realçou.

«Temos todas as condições, trabalhamos em relvado natural, formamos grupos com ambiente espetacular e trabalhamos ali durante uma hora e meia com alegria. Após as sessões temos psicólogo, nutricionista, fisioterapeuta, banheira de gelo, massagens, e ainda temos uma parceria com a Move Better, que trabalha a parte física [ginásio]. Depois temos a in season, em que trabalhamos com menos jogadores profissionais, até porque muitos deles jogam no estrangeiro, mas já aconteceu deslocarmo-nos ao Vietname, à Austrália ou a Marrocos para trabalhar com os jogadores», responde o antigo atleta profissional.

Quanto às situações mais complicadas de lidar, Cláudio Borges não tem dúvidas: «São aqueles pseudo-jogadores que acham que são jogadores e que não o são. Porque trabalhar com profissionais, e felizmente trabalho com muitos, é muito fácil. Ouvem o que tu dizes, concordando ou não. Obviamente, nem sempre concordam, mas dou-lhes abertura para falarem à vontade, às vezes a meio do treino dizem que podíamos ajustar isto ou aquilo, fazer assim ou de outra forma. Mas há jogadores que estão a olhar para ti e tu notas mesmo na cara deles que estão ali a dizer ok, não concordo com nada, mas vamos fazer isto. Esses são os mais complicados», acrescentou.

A excelência é atingida quando te tornas na melhor versão. O Boost Campus ajuda a isso

Zé Carlos satisfeito com treino à margem do clube - Foto: Gil Vicente

Em relação ao trabalho diferenciado no Boost Campus em relação aos clubes, o treinador sublinha a atenção individual para cada atleta. «No clube, num treino de uma hora e um quarto, talvez toquem 20 vezes na bola, connosco, na hora de treino, têm, no mínimo, de tocar 200 vezes na bola, não é fazer 200 vezes a mesma coisa, mas eles tocam 200 vezes na bola. Portanto, vão evoluir obrigatoriamente», sublinha.

Afonso Patrão, um sucesso
No que a caso de sucesso diz respeito, o treinador aponta Afonso Patrão, ponta de lança de 18 anos do SC Braga, que foi aposta de Carlos Carvalhal no jogo contra o Sporting na época passada, lançando-o aos 83 minutos, e que viria a marcar o golo do empate (1-1), na 28.ª jornada, em pleno Estádio José Alvalade. «Conheço o Afonso quase desde que nasceu, porque o pai dele foi meu fisioterapeuta num clube aqui em Esposende. Ele tem uma personalidade um bocadinho difícil, no sentido de ser calado, não fala com ninguém, não sabemos o está na cabeça dele. Se está muito feliz, está com a cara trancada, se não está contente, tem a cara trancada, nunca se sabe o que é que sai dali, está sempre com cara de chateado [risos]. E nos primeiros dias que trabalhei com ele disse-lhe 'és um chupa-limão', e ele, com 13 anos, respondeu-me 'Estou aqui para trabalhar, não é para me rir'. É um miúdo que trabalha comigo desde os primeiros dias, sinto que tem ali um dedinho meu na evolução dele e isso enche-me de orgulho», conta.
Afonso Patrão trabalha há quatro anos com Cláudio Borges - Foto: D. R.

Futebol feminino em crescendo

Também no feminino a afluência ao Boost Campus é maior, com Dolores Silva, capitã da Seleção Nacional, que esta temporada se transferiu do SC Braga para os espanhóis do Levante, a ser cabeça de cartaz. «Surpreenderam-me muito pela positiva. Trabalhamos com a Ágata Filipa [SC Braga], a Dolores Silva, a Laura Luís [Valadares Gaia], o profissionalismo delas é incrível. Depois, a concentração das mulheres é muito superior à dos homens. Falo uma vez e elas fazem, percebem logo à primeira, são muito mais dedicadas e querem sempre mais e mais. É um trabalho muito rentável e, no geral, estão a evoluir cada vez mais», elogia Carlos Borges.

Ajuda-me a potenciar capacidades, sobretudo em 'off season'

Dolores Silva foi a porta-voz da equipa portuguesa na antevisão ao jogo de estreia no Europeu, frente à Espanha
Dolores Silva trabalha na Boost Campus - Foto: Nuno Veiga/LUSA
Maior deceção: desistência
Cinco anos após a criação do Boost Campus Academy, Cláudio Borges não hesita em responder à pergunta sobre qual foi, até ao momento, a sua maior desilusão. «Tinha um atleta que treinava aqui comigo duas vezes por semana, certinho nos três primeiros anos da academia, depois comecei a sentir uma falta de vontade da parte dele, não conseguia cativá-lo, chateava-me com ele e para mim é uma mágoa ele ter deixado o futebol e por não ter sido capaz de convencê-lo. Acho que foi a minha maior mágoa que tenho», revela.

Cláudio Borges ambiciona integrar equipa técnica

Mentor do Boost Campus Academy, Cláudio Borges, 42 anos, natural de Esposende, foi lateral enquanto jogou em Portugal, com passagens por Esposende, Marinhas, Fão, Freamunde, Macedo de Cavaleiros, depois passou a central quando, em 2012, ingressou no Kabuscorp e naturalizou-se angolano, tendo representado a seleção de Angola. Passado meia dúzia de anos voltou a Portugal, jogou no Limianos, terminou a carreira no Leça e na sua cabeça sentia que podia fazer algo diferente.

Cláudio Borges foi jogador profissional - Foto: D. R.

«Eu, principalmente nos últimos anos de carreira, a partir dos 30, comecei a pensar no pós-carreira. Ainda por cima, entrei na faculdade cedo, acabei a licenciatura antes de ir para Angola, antes dos 26 anos, e fui fazer uma licenciatura porque sabia que tinha de haver um plano B para o futebol, porque cheguei a profissional um bocadinho tarde. Sentia nos treinos que se dava pouca importância àquilo que é o aspeto individual do atleta e muita importância, e que deve ser dada, obviamente, ao aspeto coletivo. Só que depois a maior parte esquece-se que posso ter uma tática 3x5x2, 4x3x3, 4x4x2, o que for, mas depois o que interessa, além das dinâmicas, são as características técnicas individuais cada atleta», sublinha.

A partir desta premissa, Cláudio Borges, licenciado em Educação Física pela Universidade da Maia, com mestrado em Treino Desportivo de Alto Rendimento e curso UEFA B, lançou um projeto que, após cinco anos, é de sucesso. Com mais de seis mil horas de treino de desenvolvimento individual e também em parceria com clubes, como Leça, Lusitânia de Lourosa e Vianense, ambiciona integrar uma equipa técnica das ligas profissionais. «Sinto que posso ser muito útil a uma equipa. É um desafio que sinto estar preparado para abraçar», afirma.