Supernervos na Supertaça
Nunca pensei escrever isto depois de um bicampeonato e de uma dobradinha, mas sigo para a Supertaça desta quinta-feira com medo. E sim, eu sei que jogos de pré-temporada valem o que valem e oxalá Rui Borges me faça engolir todas as palavras que vou deixar nestas linhas, mas depois dos últimos três jogos não consigo sentir a confiança que seria típica de um adepto de clube campeão que, na verdade, em termos práticos, perdeu um jogador importante, mas manteve toda a restante estrutura.
O jogo com o Celtic foi, todos o vimos, francamente mau, mas confesso que decidi desvalorizar. E vai daí peguei nos miúdos e fomos até ao Estádio do Algarve ver o jogo com o Sunderland. Acontece que, além da vitória, que nestes jogos até é o menos importante, pouco de bom de lá trouxemos. O senhor sentado à minha frente, a tentar consolar-nos a todos no final, ainda experimentou ver o copo meio cheio e soltou um pouco convicto «sempre foi melhor do que o jogo com o Celtic». Mas em resposta recebeu apenas meia dúzia de sorrisos amarelos, entre os quais o meu.
Porque Deus, ou qualquer outra entidade superior à vossa escolha, nos ajude se a equipa não perceber de uma vez que o 3x4x3 já foi (apesar de eu não compreender exactamente qual o motivo para abandonarmos um sistema vencedor) e que, agora, é tempo do 4x2x3x1 de Rui Borges.
No estádio, onde temos sempre uma percepção mais completa, o que se viu foi uma equipa perdida, com uma defesa de dar arrepios, um Pote que ainda não se encontrou — o que até é natural e perceptível —, e um Harder com muita garra e vontade, mas muito trapalhão com a bola nos pés. E não, o jogo com o Villarreal não serviu para tranquilizar ninguém porque, comparativamente ao jogo anterior, a única grande surpresa foi o número 9 estampado nas costas do jovem dinamarquês. O resto? Mais do mesmo. E uma segunda parte do mais ruinzinho que temos visto nos últimos tempos.
Olhando para estes três jogos, confesso que o meu estado de espírito é de apreensão total. E temo que este seja o estado de espírito da maioria dos sportinguistas que estão, neste momento, agarrados à fé e à espera de que se produza um milagre na equipa até quinta-feira. E se esse milagre não vier, temo que o nosso início de campeonato seja toda uma instabilidade com muitos adeptos a acreditar que Rui Borges pode não ter unhas para tocar esta viola.
É certo que o Benfica não parte numa posição mais fácil. Depois dos investimentos feitos e de todas as alterações na equipa, os adeptos exigirão uma vitória ou a cabeça de Bruno Lage. E junto com a de Bruno Lage, em ano de eleições, seguirá, muito provavelmente, a cabeça do atual presidente do clube. É que, perante maus resultados futebolísticos, não haverá Benfica District que o safe.
As duas equipas, parece-me, vão entrar em campo na Supertaça um bocadinho como quem caminha num limbo. Porque uma tem de mostrar que tem a qualidade que a fez campeã e que não foi tudo uma questão de sorte. E a outra está obrigada a dar prova de valor e a mostrar que o investimento feito valeu realmente a pena. Mas mais até do que as equipas, eu diria que este é um jogo fundamental para ambos os treinadores agarrarem a confiança da massa adepta porque, quer de um lado quer do outro, e ainda que por motivos totalmente diferentes, ambos os treinadores estão debaixo de uma certa suspeição.
Do lado do Sporting, que é aquele que me interessa, é altura de Rui Borges esquecer que é só «um rapaz de Mirandela», como tanto gosta de relembrar, e de assumir que é treinador de uma equipa campeã nacional que tem de mostrar personalidade e qualidade na Liga dos Campeões. E nem uma coisa nem outra foram avistadas nestes jogos de preparação.
Juro, juro mesmo, que não costumo ser velho do restelo. E eu quero acreditar que sou eu que estou a ver mal o filme e que o panorama não está tão negro como o pinto na minha cabeça. Adoraria estar enganada. Sou capaz de pagar para estar enganada. Mas este 4x2x3x1 está-me mesmo a mexer com os nervos. E tenho medo que com os dos jogadores também.
E antes que venham os adeptos confiançudos, aqueles que nunca duvidam, dizer cheios de si que um verdadeiro sportinguista não pode duvidar, deixem-me lá já discordar. Nós podemos duvidar, sim. Aquilo que nunca podemos é deixar de apoiar e deixar vazio o nosso lugar em Alvalade. Porque isto, já se sabe, é como os casamentos «na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias da nossa vida».
Já vos disse o quanto quero estar enganada?
No pódio
Em 2023, estive na cerimónia de entrega dos prémios Mulheres Inspiradoras da revista ACTIVA. Uma das nomeadas, na categoria de desporto, e que também esteve presente na cerimónia com uma simpatia e humildade extraordinárias, foi a judoca Patrícia Sampaio que, infelizmente, não saiu vencedora nesse ano. Mas se não ganhou o prémio ali em causa, a verdade é que, desde há muito, não para de ganhar no tatami. Sendo actualmente a terceira melhor atleta mundial na sua categoria de peso, Patrícia Sampaio conquistou agora o segundo Grand Slam da carreira. E se isto não é verdadeiramente inspirador, então alguém que me explique o significado da palavra. Porque eu não vejo mulher atleta que seja, atualmente, mais inspiradora do que ela.
Na bancada
«Tu és do Sporting e, por isso, não podes escrever sobre o João Félix”» — dirão alguns. «Era o que faltava» — respondo eu. E tanto posso que, de facto, vou. E faço-o para dizer que não percebo a decisão do jogador de, aos 25 anos, rumar ao futebol saudita e perder aquela que era, possivelmente, a sua última oportunidade de ter uma carreira de sucesso na Europa. Reparem, o talento de João Félix é inegável — ainda que possamos discutir se os 126 milhões de euros pelos quais saiu para o Atl. Madrid não foram bastante inflacionados —, mas a verdade é que nunca se conseguiu impor num clube sem ser o Benfica. E se no Atlético o jogador pode ter sido vítima de uma incompatibilidade com o treinador, já no Barcelona e no Chelsea é mais difícil explicar a sua dificuldade de afirmação.
O regresso de João Félix ao Benfica podia ser o relançar da sua carreira até porque tem uma idade que ainda lhe permite sonhar. Escolher a Arábia Saudita que é, basicamente, o lugar onde os jogadores vão encher (ainda) mais os bolsos antes de se retirarem cheira demasiado a enterro precoce de um sonho.
Talvez, para o Benfica, a não vinda do jogador tenha mesmo sido uma sorte. João Félix poderia tornar-se, em mais do que um aspecto, um problema no balneário e, caso não se conseguisse afirmar, um problema para a própria direcção do clube devido ao elevado valor do investimento. Mas, para o jogador, não tenho grandes dúvidas de que o Benfica seria a melhor das possibilidades em termos de carreira. Terá falado mais alto a carteira e os 70 milhões de euros que vai receber em duas épocas. Cheira-me a tiro a sair pela culatra. E um daqueles que pode mesmo matar uma carreira.