Rodrigo Mora esteve perto de se estrear por uma das seleções mais competitivas do planeta e agora vai ter de voltar a lutar pelo lugar no FC Porto
Rodrigo Mora esteve perto de se estrear por uma das seleções mais competitivas do planeta e agora vai ter de voltar a lutar pelo lugar no FC Porto

Afinal, Rodrigo Mora espera porquê e... pelo quê?

O jovem é apenas um entre muitos que tiveram de lutar contra perceções erradas. Vitinha sofreu para se afirmar no Dragão, mas será que se tornou mesmo um jogador 'completo'?

Farioli é um treinador jovem, determinado nas ideias e com uma visão nada turva sobre como o jogo deve ser jogado. Apesar de trazer um processo novo, consegue rapidamente plantá-lo, fazê-lo florescer e dele colher frutos enquanto outros ainda lutam para impor conceitos. Nem sempre os finais das temporadas correm da melhor forma, como aconteceu em Nice e em Amesterdão ao serviço do Ajax, o que mantém o FC Porto em alerta para a necessidade de uma profundidade de plantel que dê para muitas batalhas numa longa época. Se antes já existia essa quase obrigatoriedade de aguentar as portas abertas (sobretudo para negócios cirúrgicos), com a lesão do lateral Martim Fernandes, ainda se tornou mais urgente ser proativo na procura.

A entrada fulgurante na Liga, somada aos particulares positivos, dá sinais de um Dragão de maior cilindrada do que nas eras Martín Anselmi e Vítor Bruno, contudo há um jogador de baixa estatura a meio do gabinete do técnico a projetar uma sombra de elefante. Rodrigo Mora, do alto dos 1,68 metros e com a irreverência dos 18 anos, carregou praticamente às costas o FC Porto quando tudo o resto corria mal e poucos se sentiam capazes de colaborar, estabeleceu dinâmicas que reativaram um muitas vezes perdido Samu e bateu às portas da Seleção, ainda que não tenha sido utilizado na meia-final e final da Liga das Nações, respetivamente diante de Alemanha e Espanha.

A caminhada parecia triunfal e nada fazia prever o que se tem passado nas últimas semanas. Ao mesmo tempo que se falava do interesse do campeão europeu PSG e do colosso espanhol Real Madrid, e se tornava candidato a melhor jovem do ano para France Football, Farioli projetava um 11 sem ele. O técnico justificou com a necessidade de adaptação às novas dinâmicas, sem, todavia, especificar. E os outros? Já se adaptaram? Não terá essa maior adaptabilidade que ver com os minutos que passaram em campo nos particulares? Por que razão tem de ser Rodrigo Mora a esperar? Não venham agora dizer que sobressaiu porque os colegas eram maus demais. Digam antes que sobressaiu com 10 golos e 4 assistências APESAR de os colegas atravessarem dos piores momentos das carreiras, que é o que faz sentido atirar num desporto que se quer coletivo.

Muitas vozes se levantam dizendo que a sua vez irá aparecer. Que lhe basta ter paciência. Que é um novo processo, um novo treinador e muitas vezes estas coisas acontecem. Todos sabemos que o italiano tem facilidade de se adaptar a novas realidades. Treinar o FC Porto ou o Ajax não é a mesma coisa do que orientar Nice ou Alanyaspor. Farioli sabe que nos dois primeiros tem de ganhar muito mais vezes, mesmo que coloque alguma coisa em causa, até mesmo a estética. Se tiver de ser pragmático será pragmático. Se for um emblema que não aspira a campeonatos, aí sim, pode aproveitar a maior liberdade para construir outro tipo de processo. Talvez seja isso que se passe com Mora, talvez Farioli queira estabilizar rapidamente uma equipa vencedora e não correr riscos com a irreverência própria da juventude. Talvez trema com a fragilidade física do miúdo, com eventual falta de força nos duelos, as bolas aéreas, algum mau passe em zona sensível que resulte em problemas… Não sei.

É sobretudo curioso que o transalpino olhe para Rodrigo Mora como um 10, o que não só lhe retira espaço no futebol moderno como o torna concorrente de Gabri Veiga, que custou 15 milhões. Mas não acho que seja esse o seu perfil. Reconheço-lhe coisas de João Vieira Pinto, um 9,5 feito Menino de Oiro ou Grande Artista, ou de alguém que jogue mais perto do avançado, mesmo que parta de um flanco. Veiga é mais médio, Rodrigo é mais avançado e afastar o segundo da baliza não faz grande sentido. Mesmo que o talento possa camuflar uma menor aptidão.

Na frente, à esquerda, talvez a sua posição natural, está outro reforço, o também espanhol Borja Sainz, que custou 13,3 milhões a André Villas-Boas e companhia. À direita, Farioli recuperou Pepê, que depois de uma época a somar exibições horríveis a um ou outro ato de indisciplina, recebeu prémio que certamente não esperaria. Tem agora feito pela vida e, naturalmente, não há quem não possa reclamar mais oportunidades, porém o que pensará Rodrigo Mora de tudo isto?

Será que o italiano se colocou no lugar do jovem, isto se é que foi mesmo informado da situação? Será que a política desportiva dos portistas, certamente alinhada, nem que seja em parte, com o novo técnico, foi pensada de forma a manter aberto o caminho para a evolução do seu jogador mais promissor? Não parece. Todos os treinadores têm o direito às suas próprias decisões, mas esta parece realmente pouco racional e até um crime lesa-pátria.

Acredito que Rodrigo Mora continue feliz por estar no FC Porto e até possa encarar como natural, aos 18 anos, ser ele o sacrificado e começar do banco. Afinal, quantos da sua idade nem sequer a estreia conseguiram? O que está aqui errado, para mim, é a premissa. É sempre o mais jovem aquele que pode esperar, que tem tempo, que deve lutar, mesmo que seja melhor do que os demais e já o tenha provado inúmeras vezes e sob contextos complicados.

Na dimensão física (ou falta dela), alegada imaturidade e até menor compromisso no processo defensivo (de um grande, que está sempre a atacar), há um denominador comum como elo mais fraco. Viveu-se o mesmo com Vitinha, aqui há uns anos, exatamente com as mesmas desculpas por parte de um treinador português (Sérgio Conceição), que o fez sofrer uns meses até ver nele coisas que só ele via. Rapidamente se tornou um candidato à Bola de Ouro, quando teve quem lhe reconhecesse o talento em toda a sua plenitude.

Se Yamal lesse este texto iria sorrir, tal como Endrick, Estêvão, Mbappé, Messi, Ronaldo, Raúl González, Rooney, R9 Fenômeno, Maradona, Pelé, Owen, Jude Bellingham e agora o irmão Jobe, Pedri, Gavi, Musiala, Camavinga, Haaland, Vinicius… Continuo? Figo, Rui Costa, Simão, Futre, tantos outros. Ainda são exceções à regra? Ou a regra? No futebol português, o talento não tem idade, mas, pelos vistos, a coragem de apostar nos mais jovens sim. E não mudará tão cedo, amigos.