Carlo Ancelotti, selecionador do Brasil - Foto: Imago
Carlo Ancelotti, selecionador do Brasil - Foto: Imago

A saia justa entre Ancelotti e Abel Ferreira

'JAM sessions' é o espaço de opinião semanal de João Almeida Moreira, correspondente de A BOLA no Brasil

Carlo Ancelotti convocou para os dois particulares da seleção brasileira com o Senegal e a Tunísia, o atacante Vítor Roque, on fire no Palmeiras, clube que perdeu para o clássico em atraso com o Santos também o argentino Flaco López, o sócio do ex-Betis no ataque, o capitão paraguaio Gómez e mais quatro jogadores por causa dos compromissos, a feijões, das seleções sul-americanas.

É um revés e pêras no meio de uma corrida ao título do Brasileirão disputada centímetro a centímetro, ou mesmo milímetro a milímetro, com o Flamengo.

Mas os rubro-negros, por sua vez, terão no duelo com o Sport Recife os mesmos sete desfalques na data FIFA, dois deles, Danilo e Alex Sandro, chamados por Ancelotti para a Operação África.

Como os jogos das seleções ainda coincidem também, ou quase, com a jornada seguinte do Brasileirão, em que o verdão encara o Vitória e o mengão defronta o rival Fluminense, os dois candidatos já preparam fazer complexas operações logísticas aéreas para repatriar os atletas a tempo desses encontros.

Neste contexto, é natural que se diga que os interesses de Carletto, que sublinhou na conferência de imprensa da convocatória que «a seleção é sempre prioridade», chocam com os de Abel Ferreira e de Filipe Luís.

E que tanto o português como o brasileiro se tenham queixado dos particulares do Brasil, o flamenguista a dizer que «com estas situações, as dificuldades para um treinador aumentam» e o palmeirense, sempre mais incisivo, a chamar de «um bocadinho vergonhosa» uma situação «que não acontece em mais lado nenhum».

A imprensa brasileira, habituada no passado a que selecionadores brasileiros evitassem convocar jogadores de clubes locais quando as datas FIFA e as jornadas do Brasileirão coincidiam, apressou-se então a concluir que Abel havia contestado Ancelotti. E a montar um cenário de guerra entre os dois treinadores.

Um cenário de guerra que não existe. Uma contestação que nunca houve.

Um e outro estão só a defender as suas damas: quer lá saber Ancelotti que haja jogos de campeonato, o trabalho dele é preparar a seleção para o Mundial de 2026 e, por isso, deve convocar quem precisa e ponto; por outro lado, Abel tem de ganhar os jogos pelo seu clube e reclama quando forças estranhas dificultam a tarefa para a qual é pago.

Foi contra a CBF — e não o seu competente assalariado Ancelotti — que o treinador do verdão se revoltou. É a CBF e os seus campeonatos estaduais inflados que geram aos selecionadores este constrangimento. Ou, por outras palavras, é o calendário apertado que gera esta saia justa.