João Pinheiro, árbitro da AF Braga - Foto: IMAGO
João Pinheiro, árbitro da AF Braga - Foto: IMAGO

Sr. árbitro, está despedido!

Que consequências têm os erros para os homens do apito?

As ideias neoliberais há muito que convivem com os poderes do futebol. «Não serve, despede-se, venha outro!» é o sonho de muitos dirigentes. É, aliás, prática corrente despedir-se treinadores ou pôr-se jogadores como dispensáveis, ora atirados para equipas B, ora colocados a treinar-se sozinhos. E, com os árbitros, o que sucede?

A resposta, ao nível do que vai na mente de quem dirige os clubes, é simples: se o árbitro não agrada, não deveria constar nas hipóteses para apitar os nossos jogos. Simples. Era dizer-lhe, após erro irreparável que cometesse e ao melhor estilo americano: «Sr. árbitro, está despedido!»

Pois, nem isto são os Estados Unidos, nem o nosso sistema laboral permite poderes ilimitados aos donos. Mas desengane-se quem pensa que nada acontece aos senhores do apito.

Vejamos, então, a que estão sujeitos os árbitros que cometem erros de maior ou menor relevância em jogos. Erros como o que, citando só o último, aconteceu nos Açores, no duelo da Taça entre Santa Clara e Sporting, e que já foi exaustivamente dissecado e comentado, inclusive pelo diretor técnico nacional de arbitragem, o ex-árbitro Duarte Gomes, dizendo que se tratou de «decisão errada», a de assinalar penálti para os leões após 12 minutos de análise VAR, e concluindo: «Um exemplo que não queremos ver repetido.»

Ora, os níveis de castigo são vários. Desde logo, as notas dos observadores: se o árbitro cometer um erro grave (um «erro de direito» ou técnico com impacto direto no resultado que não foi corrigido pelo VAR), a nota é negativa (geralmente abaixo de 2.5). E tem consequências: estas notas acumulam para o ranking final da época; quem ficar nos últimos lugares do ranking, desce de categoria (da C1 para a C2), o que significa deixar de apitar a I Liga e perder o estatuto de profissional. O árbitro pode ainda perder o estatuto de Internacional.

Há ainda a famosa jarra. Não é anunciado publicamente um castigo, mas o árbitro desaparece das nomeações durante 2, 3 ou mais semanas: objetivo é protegê-lo da pressão mediática; mas funciona também como sanção disciplinar implícita.

A isto acrescenta-se a nunca desejada perda de dinheiro. Os árbitros de elite em Portugal recebem um valor fixo mensal, mas parte significativa dos rendimentos vem dos prémios de jogo. Na jarra ou só nomeado como 4.º árbitro ou para a Liga 2, os rendimentos baixam drasticamente.

Por fim, em erros recorrentes ou má interpretação do protocolo VAR, o árbitro pode ser chamado para sessões de formação técnica adicional na Cidade do Futebol, por um período que o afastará dos relvados, portanto com perda de rendimentos.

Ou seja, os erros têm consequências para os árbitros: custam dinheiro (prémios de jogo), prestígio (ranking e internacional) e, até, o emprego (descida de divisão). Resta saber se os processos funcionam...