Ricardo Araújo Pereira vai estrear-se a solo. Foto Miguel Nunes
Ricardo Araújo Pereira vai estrear-se a solo. Foto Miguel Nunes

Ricardo Araújo Pereira já teria sido despedido...

Nos Estados Unidos, o programa 'Messing With the Working Class' já teria sido banido... Não é exagero: estamos a assistir à maior batalha civilizacional da história americana... Eu sou o Jorge Pessoa e Silva e porque o Trump nunca mandaria em A BOLA continuo a escrever semanalmente a minha crónica de Desassossego...

Hoje sinto-me americano, convocado para uma das mais intensas e dramáticas batalhas que a nossa civilização já conheceu… Sem ponta de exagero. Sei que podemos andar distraídos com os primeiros dias de Mourinho no Benfica ou a rir-nos com alguns dislates de André Ventura sobre o hambúrguer – e todos os temas são merecedores da nossa atenção - mas neste momento, nos Estados Unidos, está a travar-se uma luta titânica e sem precedentes pela liberdade de expressão. Luta que já custou o despedimento de vários apresentadores de televisão, quase todos humoristas, pressões inimagináveis, ameaças em público e comentários de Donald Trump sobre quem deve ou não ser despedido. Com a arrogância de quem se considera o pai da nação e protetor dos valores ocidentais – seja lá o que isso for – alguém que se considera intocável e que tudo fará para continuar a sê-lo.

Jimmy Kimmel é, por estes dias, o rosto desta luta. Um dos mais conhecidos e populares apresentadores da televisão americana, cujo programa foi retirado do ar pela Disney, dona da ABC, por pressão da administração Trump. Mas a pressão dos telespetadores foi tão grande e a solidariedade, até de profissionais de outras televisões, tão avassaladora, que a Disney teve de recuar e anunciou o regresso do programa Jimmy Kimmel Live!. Contudo, dezenas de estações locais continuam a boicotar o apresentador e não emitem o programa. E a Disney sabe que vai ter problemas sérios com Donald Trump.

No regresso do programa, um Jimmy Kimmel emocionado colocou o dedo na ferida: é importante que as pessoas digam aos políticos que o importante não é o que eles têm para dizer mas ouvirem o que as pessoas têm para dizer. Trump celebrava o despedimento de Kimmel, mas o golo foi anulado por intervenção do VAR. Mas há mais golos já marcados e celebrados.

O resultado final vai ser decidido no último minuto, pelos jogadores que mostrarem mais resiliência, mais espírito de sacrifício, mais coragem. E todos somos convocados. Uma das maiores armadilhas que enfrentamos na vida é não nos incomodar o que não tem nada a ver connosco em vez de vermos um incêndio que pode propagar e chegar a nossa casa se ninguém o começar a combater… E fica a prova de que todos os direitos mais básicos nunca, mas nunca, podem ser dados por garantidos.

Em relação à liberdade de expressão, prefiro uma besta a dizer disparates a ter alguém que decida por mim o que deve ou não ser dito. Em relação à besta eu posso dizer que é uma besta, posso não ler ou ouvir o que tem para dizer, posso não votar nele se for político, posso até aceitar um debate para provar o meu ponto de vista. Em relação à segunda hipótese, sou pressionado para obedecer, castigado se não cumprir, silenciado até.

O assassinato do ativista Charlie Kirk está a ser usado como arma de arremesso republicana. Como conservador moderado que me considero, concordava com aplauso com várias coisas que defendia, discordava visceralmente de outras. Mas ouvia-o para aplaudir ou discordar. E aplaudi-o quando defendeu que «as guerras começam quando as pessoas deixam de falar». Bem dito. É que enquanto as pessoas estão a discutir, mesmo que violentamente, não estão a disparar armas.

Em última análise, a liberdade de expressão é também isso: um espaço onde podemos até gritar com todos. É que quando os gritos dão lugar ao silêncio começa a ouvir-se o silvo da bala…