Quem os viu e quem os vê: e se as Ilhas Faroé forem ao Mundial?
Outrora um adversário acessível, frágil, que dava a derrota praticamente como garantida, os últimos anos viram uma evolução tremenda no futebol das Ilhas Faroé, tanto que a seleção insular está na disputa pelo play-off de acesso... ao Mundial.
É verdade. As Ilhas Faroé estão a escrever uma das histórias mais surpreendentes da qualificação para o Mundial 2026. A vitória por 2-1, em casa, frente à Chéquia - com golos de Hanus Sorensen (67') e Martin Agnarsson (81') -, colocou o pequeno arquipélago nórdico na disputa por um feito impensável há poucos anos: chegar ao play-off de acesso a um Campeonato do Mundo.
A equipa orientada por Eydun Klakstein demonstrou uma maturidade e organização tática que contrastam com a imagem de outsider simpático que durante décadas acompanhou o futebol faroês. «A ordem foi mantida o tempo todo e, embora tenhamos sido pressionados, conseguimos marcar em contra-ataque quando os novos jogadores entraram», destacou o selecionador, visivelmente emocionado após o apito final.
Com este triunfo, as Ilhas Faroé chegam aos 12 pontos, apenas um atrás da Chéquia. Uma vitória na última jornada e um deslize dos checos podem tornar o sonho real. Contudo, não será nada fácil. Isto porque, os insulares deslocam-se... à Croácia, a líder do grupo. Por outro lado, a Chéquia recebe o último classificado, Gibraltar. As odds parecem estar contra os faroeses, mas no futebol nunca se sabe e só o facto de o sonho estar vivo até à última jornada já é bastante revelador da evolução que as Ilhas Faroé têm conhecido.
O passado e o presente
A transformação faroesa é notável. Há pouco mais de uma década, o país era conhecido por sofrer pesadas derrotas - como os 0-6 com Portugal, em 2016 - e por ocupar os últimos lugares nos grupos de qualificação. A vitória era praticamente garantida, um pouco como acontece, hoje em dia, contra Gibraltar ou San Marino. Mas, hoje, a seleção apresenta jogadores mais experientes, vários deles a atuar em ligas competitivas da Escandinávia, como a dinamarquesa ou a norueguesa, e um modelo de jogo mais disciplinado, capaz de competir de igual para igual com seleções muito mais poderosas, na teoria.
E esta mudança é muito culpa do atual selecionador, Eydun Klakstein. Antigo médio e figura respeitada no pequeno arquipélago nórdico, o treinador de 52 anos tem sido o principal arquiteto da transformação da seleção nacional e, desde que assumiu o cargo, em outubro de 2024, conta com uma percentagem de vitórias de 50% (quatro vitórias e quatro derrotas). Em qualquer grande seleção, esta percentagem seria banal ou, até mesmo, má. No entanto, considerando que as Ilhas Faroé têm uma percentagem de vitórias na sua história de... 10%, o número começa a parecer melhor.
Natural de Klaksvík, cidade onde começou e terminou a carreira como jogador, Klakstein representou o KÍ Klaksvík durante quase duas décadas, tornando-se capitão e referência local. Depois de pendurar as botas, iniciou o percurso como treinador no mesmo clube, com passagens pelo futebol feminino e pela equipa principal masculina, onde conquistou vários títulos nacionais e lançou uma nova geração de talentos faroeses.
Assumiu o comando da seleção principal em 2024, depois de anos ligado às camadas jovens da federação, e rapidamente imprimiu uma identidade baseada na organização tática, disciplina e coragem ofensiva, assente no 3x4x3 moderno, que tem chocado a Europa do futebol.
Klakstein e esta geração de jogadores faroeses revolucionaram o futebol faroês e, independentemente, do desfecho em novembro, o feito já é histórico: as Ilhas Faroé, 136.º lugar do ranking FIFA, com pouco mais de 50 mil habitantes, provaram que o sonho mundialista deixou de ser uma utopia e passou a ser uma possibilidade real. E se o futebol é feito de histórias improváveis, esta pode ser uma das mais bonitas dos últimos tempos.
Artigos Relacionados: