Grande golo de Ruben Neves salvou a noite no lavar dos cestos
Grande golo de Ruben Neves salvou a noite no lavar dos cestos

Neves com a camisola de Jota resolveu tudo à ponta-de-lança (crónica)

Estava escrito nas estrelas que na noite em que Alvalade se uniu, ao minuto 21, num aplauso estrondoso à memória de Diogo Jota, fosse o melhor amigo do malogrado jogador, que fez questão de passar a jogar com camisola 21, habitualmente usada pelo antigo craque do Liverpool, a resolver o jogo para Portugal, não com a sua temível meia-distância, mas com uma cabeçada, fulgurante, aos 90+1, que colocou a Seleção Nacional com um pé no Mundial de 2026...

Este triunfo da turma das quinas frente aos irlandeses, terá sido, pelo menos, tão arrancado a ferros quanto foi a vitória de Portugal sobre a Irlanda em 2021, no Algarve, com dois golos de CR7, fora de horas. E, diga-se desde já, que os três pontos que a equipa de Martínez arrecadou em Alvalade foram tão difíceis de alcançar quanto justos, já que foi o único onze que quis ganhar o jogo, dispondo de uma mão cheia de oportunidades, uma até da marca do castigo máximo, que desperdiçou.

 Mas avancemos já para o paradoxo que explica as dificuldades de Portugal, que esteve durante 86 minutos em 4x1x4x1, contra uma Irlanda que trouxe um autocarro de dois andares, um ‘double decker’ - para tapar os caminhos da baliza de Kelleher - pintado com as cores de um 5x4x1 espartanamente aplicado.

O problema de Portugal, não esteve na forma como atacou, algo que contra uma espécie de grande muralha da China arquitetada em Dublin, seria sempre muito complicado e requereria uma enorme paciência; o problema da Seleção Nacional, e aqui é que reside o paradoxo, esteve essencialmente na maneira como defendeu, à zona, sem pressionar adversários de qualidade técnica limitada, deixando-os até, em demasiadas ocasiões, sair a trocar a bola de trás, como se pertencessem à elite mundial.

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Aliás, os números ilustram o que se expôs. Na primeira parte, os irlandeses, apesar de só terem preocupações defensivas, tiveram 44 por cento de posse de bola, gerida essencialmente no seu terço defensivo, onde Portugal marcava com os olhos. Tivesse a turma das quinas uma atitude menos passiva neste capítulo, e fizesse pressão alta, recuperaria a bola mais cedo e apanharia os irlandeses em contrapé amiúde, o que lhes seria fatal.

Assim, apesar de Diogo Costa ter tido uma noite descansada, e de a equipa portuguesa ter disposto de uma dupla ocasião soberana aos 17 minutos, quando Cristiano Ronaldo rematou ao poste e, de baliza aberta, o pé direito traiu Bernardo Silva, que desperdiçou uma recarga fácil, voltando a estar muito perto do golo aos 41 minutos, na sequência de um pontapé de canto apontado da esquerda por Bruno Fernandes, a que Gonçalo Inácio correspondeu com uma cabeçada detida magistralmente por Kelleher, o nulo com que se chegou ao intervalo lançou dúvidas na Seleção Nacional e deu moral aos irlandeses, que a cada minuto que passava acreditavam mais de que podiam regressar com pelo menos um ponto no bornal. 

MARTÍNEZ MEXEU BEM

Na segunda parte, Roberto Martínez trocou Inácio por Renato Veiga (questão física) e passou Pedro Neto, o melhor português até então, para a esquerda, por troca com Bernardo Silva. Mas na sequência do jogo, em que Portugal teve um remate perigoso de Cristiano Ronaldo ao lado aos 57 minutos e duas boas defesas, a disparos de Bruno Fernandes e Vitinha, aos 60 minutos, sentia-se que era preciso mexer na equipa lusa. Martínez fê-lo aos 62 minutos, refrescou as alas com Rafael Leão (que sem espaço mas costas dos defesas nunca esteve na sua praia) e Trincão, e fez entrar, com vantagem, Nélson Semedo para o lugar de Diogo Dalot.

Os irlandeses, que nunca desmontaram o ‘double decker’ foram refrescando a equipa, mas depois de um falhanço incrível de CR7 a cruzamento rasteiro de Nélson Semedo (71), foi Trincão, com uma remate forte, a provocar uma grande penalidade por mão do defesa O’Shea. Mas não era noite de Cristiano Ronaldo, que nem rematou mal dos onze metros, mas viu Kelleher atirar-se para a direita e deter a bola, a meio da baliza, com o pé, em posição acrobática.

Empurrada por um público fantástico, a equipa lusa nunca se entregou e sucederam-se jogadas de desespero, infrutíferas, na grande área irlandesa. Roberto Martinez, aos 86 minutos, decidiu desfazer o 4x1x4x1,colocou Gonçalo Ramos ao lado de Cristiano Ronaldo, com sacrifício de Bruno Fernandes, e apostou num duplo pivot formado por Ruben Neves e Bernardo Silva, Com maior presença portuguesa na área os irlandeses panicaram, abriram mais espaços, e, aos 90+1, uma entrada fulgurante de Ruben Neves, que impulsionou a bola, de cabeça, para o fundo das redes da Irlanda com a velocidade de um bólide, colocou justiça no marcador e deixou Portugal muito perto da sétima presença consecutiva num Mundial (todos os realizados no século XXI). 

Depois, e porque o árbitro concedera uma compensação de sete minutos, assistiu-se a um número de prestidigitador de Bernardo Silva, que escondeu a bola dos irlandeses de todas as maneiras e feitios, beneficiando das linhas de passe que a movimentação dos companheiros criava. 

Acabava em festa uma noite em que as coisas pareceram malparadas, mas o destino não quis deixar de premiar a memória de Diogo Jota no primeiro jogo da Seleção em Portugal após o seu desaparecimento, com um golo do camisola 21 da turma das quinas.

 Terça-feira há mais, com a Hungria, e a questão do Mundial pode ficar carimbada. No entanto, será bom que Roberto Martinez medite na forma como Portugal foi pouco agressivo no primeiro terço irlandês, algo que não deverá constar do portefólio de uma equipa que sonha erguer a Taça de Campeão do Mundo.