Mundial: O campeão por um ponto
Por um ponto se ganha, por um ponto se perde. A máxima de quase todos os desportos caiu que nem uma luva nas mãos dos vencedores do Campeonato do Mundo.
A África do Sul conquistou o título mundial na final de sábado com a Nova Zelândia, no Stade de France, em Paris, ao vencer por 12-11. Pela diferença de um ponto apenas, o suficiente para que a Taça Webb Ellis fosse erguida pelo capitão Springbok, Siya Kolisi, e fugisse das mãos de Sam Cane, seu homólogo All Black. Uma diferença tangencial que a seleção sul-africana transformou neste Mundial como marca de água. E sempre na capital francesa, no Stade de France.
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— Rugby World Cup (@rugbyworldcup) October 28, 2023
A tendência começou a 15 de outubro, nos quartos de final, diante a França. Vitória por 29-28 (perdiam ao intervalo por 22-19). Foi o fim das aspirações francesas e o começo do sonho de outra nação. Sete dias depois, no mesmo palco, a Inglaterra foi o adversário que se seguiu, na meia-final. Ainda vivo nas memórias dos dois países estava a final do Japão-2019. Nesse ano, a África do Sul conquistou o terceiro título mundial e igualou a Nova Zelândia. Em território gaulês, mais um duelo entre a seleção da Rosa e os Springboks, mais uma vitória sul-africana pela diferença mínima. 16-15, um triunfo saído da bota de Handre Pollard (penalidade aos 78’), quando ao intervalo estavam seis pontos (12-6) em desvantagem (do minuto 3 até aos três pontos concretizados a dois minutos do final).
Depois de ultrapassadas duas nações do Hemisfério Sul, a anfitriã, França e a Inglaterra, finalista vencida de 2019 e única seleção europeia campeã mundial e única a colocar-se no meio da Hall of Fame reservada às seleções do Hemisfério Sul (África do Sul, Nova Zelândia e Austrália), chegou a final e a vez da vizinha Nova Zelândia.
28 de outubro, perante mais de 80 mil espetadores que lotaram o Stade de France, os dois monstros do râguebi internacional e protagonistas de uma centenária rivalidade, encontraram-se, pela segunda vez na história, na final de um Mundial. Uma repetição do duelo que tinha acontecido em 1995, na África do Sul, edição que coroou a seleção sul-africana como campeã mundial, o primeiro título, na estreia na competição. Em 2023, repetiu-se a história e escreveram-se novas linhas. Os Springboks venceram pela margem mínima: 12-11, num jogo em que foram para intervalo a vencer por 12-6.
No ano das celebrações dos 200 anos do râguebi e na 10.ª edição da competição planetária, a África do Sul passou a ser a primeira seleção a conquistar quatro vezes o campeonato do mundo de râguebi. Três dos títulos foram conquistados longe de casa: dois em França, 2007 e este ano, e no Japão, há quatro anos. Passaram a ser a segunda nação, depois da Nova Zelândia, a conquistarem o título de forma consecutiva (Japão 2019 e França 2023) e Siya Kolisi tornou-se o segundo capitão a levantar, pela segunda vez, a Taça Webb Ellis.
O caminho triunfal levou-os ao topo do ranking mundial. Começou no grupo da morte onde saíram derrotados pela Irlanda, seleção que morou os 15 meses anteriores na liderança da hierarquia. O triunfo saiu das mãos da mais experiente seleção sul-africana em campo (987 internacionalizações), para a qual contribuíram 10 jogadores que fizeram parte do XV inicial na final do Japão-2019.
A despedida dos centuriões
A Nova Zelândia despede-se de quatro All Blacks, todos campeões do mundo em 2015 e que estão ligados intrinsecamente à história da modalidade no pequeno (em população) país da Oceânia e da bola oval internacional. Brodie Retallick, 109 internacionalizações e Aaron Smith, 125, começaram juntos em 2012 e saem, 11 anos depois, lado a lado. Sam Whitelock dispensa apresentações. O mais internacional de todos os que vestem de preto (153 vezes), e segundo a nível mundial, foi o primeiro jogador a cumprir quatro meias-finais e poderia ter-se transformado no primeiro a vencer três mundiais. E, por fim, Sam Cane, a 10 internacionalizações de entrar no grupo dos centuriões (mais de 100 jogos pelo respetivo país), despediu-se, estreando o primeiro cartão vermelho mostrado a um jogador numa final de um mundial de râguebi.
Do lado do campeão mundial, África do Sul, a veterania é imagem de marca e deixam rasto de títulos. O carismático capitão da África do Sul, Siya Kolisi, 32 anos e 80 internacionalizações, o primeiro negro a colocar a braçadeira acima dos bíceps, deverá ter feito o último mundial, mas o legado que deixa será eterno. Duanne Vermeulen, 37 anos (76 jogos), não tem dúvidas: vai pendurar as botas.
Olhando para os semifinalistas, os centuriões ingleses (129 partidas), Ben Youngs e Courtney Lawes (111) deixarão de ter a bola na mão. Do lado argentino, outros dois jogadores que dobraram as 100 internacionalizações Agustín Creevy (108) e Nicolás Sánchez (104). Dos que chegaram aos quartos de final, o capitão irlandês, Jonathan Sexton (124), Keith Earls, os galeses Leigh Halfpenny e Dan Biggar (116) são alguns dos nomes que deixam de aparecer nas fichas de jogo.
Todos os jogadores acima nomeados têm em comum o facto de terem feitos as despedidas em campo. Um conto de fadas que não aconteceu com o capitão escocês Stuart McInally. De fora dos 22 da Escócia, por lesão, seria chamado para a competição por lesão de Dave Cherry, mas voltaria a lesionar-se (pescoço) e regressaria a casa sem um minuto jogado. «Quando estava na escola tinha um sonho: jogar râguebi pela Escócia. O sonho realizou-se e tive o melhor tempo da minha vida», resumiu no Instagram.
Os números do mundial
Owen Farrell, capitão inglês, foi o melhor marcador. 75 pontos, mais um que Thomas Ramos (França), francês que teve menos um jogo nos pés, mas que seria o rei das conversões (21). Samuel Marques aparece em 26.º dos pontos marcados (24) e 18.º nas conversões (seis).
Will Jordan (Nova Zelândia) somou oito ensaios e igualou o recorde de Jonah Lomu, em 1999, e posteriormente igualado por Bryan Habana, em 2007, e Julian Savea, em 2015. Raffaele Storti fez 3 e entra no top-30 (22.º) do França-2023.
O argentino Marcos Kremer foi imperial nas placagens: 92 em 6 jogos, 12 acima do segundo da lista, o inglês Ben Earl. Nicolas Martins surge em sétimo na lista (63).
O All Black, Scott Barrett, foi o jogador mais utilizado nas sete partidas efetuadas; Marius Simionescu (Roménia) e Matias Dittus (Chile) foram os mais amarelados: dois cartões amarelos em dois jogos (os lobos Pedro Bettencourt e Francisco Fernandes entram nesta lista também, com um cada).
A nível de corridas com a bola na mão, Ardie Savea (Nova Zelândia) subiu ao topo da lista, com 82, mais uma que Bundee Aki (Irlanda). Savea foi também o melhor jogador do torneio.
O melhor Portugal de sempre
O França 2023 foi a segunda e a melhor participação de sempre de Portugal. Os lobos conquistaram a primeira vitória (Fiji) e o primeiro empate e respetivos primeiros dois pontos (Geórgia). E atingiram o melhor resultado de sempre no ranking: 13.º.
Nicolas Martins entrou na lista dos melhores placadores, Vicent Pinto entrou, por razões menos boas, na história como um dos 8 jogadores a receber um cartão vermelho. Jerónimo Portela e Nicolas Martins foram MVP e, na comparação com 2007, este foi o único ponto em que a seleção de 2023 não se superiorizou à de 2007 (Vasco Uva, Diogo Coutinho e José Pinto receberam essa nomeação na estreia dos lobos em Campeonatos do Mundo).