Três amigos, um sonho olímpico: o trio do Triatlo português
Unidos pelo Triatlo, Vasco Vilaça, Ricardo Batista e Miguel Tiago Silva representam o presente e o futuro da modalidade em Portugal. Mais do que treinos e pódios, os triatletas partilham uma amizade e um sonho olímpico em conjunto - Los Angeles 2028.
O percurso começou cedo. Vasco Vilaça iniciou com apenas cinco anos, ainda nos duatlos. «Devagarinho» aprendeu a nadar e passou para o Triatlo. Mas não foi o único. Ricardo Batista começou na natação, mas aos 11 anos, por influência do treinador que o acompanha até aos dias de hoje, acabou por trocar as piscinas pelo Triatlo. Já o início do Miguel Tiago Silva foi um bocadinho diferente: começou no karaté, até que um dia experimentou o triatlo e rapidamente deixou-se conquistar pela modalidade que o acompanha até hoje.
Entre treinos e uma rotina marcada pela exigência - os triatletas chegam a dedicar três a quatro horas por dia à prática da modalidade - o trio reconhece que a complementaridade é uma das grandes forças do grupo: «O Miguel é o melhor nadador, o Ricardo é muito bom ciclista e o meu ponto forte é a corrida», afirma Vasco. «Se nos juntássemos os três, éramos imparáveis», acrescenta Miguel, entre risos. «Não tinham hipóteses os outros países», conclui Vasco, também entre risos.
O Bronze Mundial conquistado com a ajuda silenciosa dos amigos
Recentemente, Vasco Vilaça conquistou o bronze no Mundial de Triatlo em Wollongong, na Austrália, mas não foi apenas mais uma medalha. Sem qualquer aviso ou desconfiança pela parte de Vasco, Ricardo e Miguel decidiram ajudar o número três do Mundo na conquista do pódio: «Não fazia ideia que me iam ajudar. Já tinha tido uma conversa com o Diretor Técnico e disse que não era justo para eles. Sei bem o que trabalham, tanto quanto eu e não queria que comprometessem os resultados por minha causa. Foi uma surpresa que fui percebendo devagarinho durante a prova. Foi mesmo na última volta de ciclismo, em que já estávamos a um minuto do grupo de frente, e que o Ricardo foi para a frente, eu fui atrás dele e estava à espera que ele saísse da frente (...) Passou-se um, dois quilómetros e o Ricardo continuava à frente. Vinham os outros atletas e ele não dizia para ninguém passar. Foi para a frente, trabalhou, trabalhou, trabalhou (...) Vi o Ricardo a olhar para mim a tentar ver onde é que eu estava. Ou seja, não estava apenas a dar tudo, como estava a pensar ajudar-nos a chegar o mais possível à frente antes de começarmos a correr. E diria que foi aí que comecei realmente a perceber o que eles (Ricardo e Miguel) estavam a fazer por mim», recorda Vasco sorridente.
«Não foi planeado, nem uma indicação da Federação», afirma Ricardo. Enquanto que Miguel recorda o momento com naturalidade: «Sabíamos que no ciclismo era onde podíamos ler melhor a prova. Acabei por sair no grupo da frente e sabia que não podia ajudar os rivais do Vasco. O Ricardo estando no grupo do Vasco, o principal objetivo era encurtar a distância, estar na frente e fazer precisamente o contrário daquilo que eu fiz. Não havia bem uma estratégia delineada, foi tudo improvisado. Mas demos o nosso melhor para que o Vasco pudesse lutar pelo campeonato do mundo.»
Para o número três do mundo, que tinha os pais presentes em Wollongong, o momento foi ainda mais especial: «Com o nosso estilo de vida, é raro ter a família por perto. Ter os meus pais lá, tão longe de casa, deu-me paz e diria que tornou o momento especial, ainda mais especial», admite o medalhado.
O sonho em conjunto: Los Angeles 2028
O bronze mundial é, no entanto, apenas mais um passo num caminho que aponta para próximos Jogos Olímpicos - Los Angeles 2028. Depois de Paris 2024, onde Vasco e Ricardo terminaram com diplomas olímpicos, em quinto e sexto lugar, respetivamente, os triatletas acreditam que o futuro será ainda mais promissor: «Paris foi importante para aprendemos o que são os Jogos Olímpicos. Agora, já sabemos o que nos espera. Estamos mais preparados para irmos mais descontraídos», admite Vasco. «É uma vantagem já termos vivido a experiência», completa Ricardo.
Miguel sonha juntar-se aos colegas em Los Angeles e não esconde a ambição de marcar presença pela primeira vez nos Jogos Olímpicos ao lado dos amigos: «Seria um sonho estar lá com eles. E viver isso com amigos e companheiros seria ainda mais especial. É para isso que trabalhamos todos os dias.»
Entre os nomes que inspiram o trio, há um nome que surge inevitavelmente: falamos de Vanessa Fernandes, a primeira medalha olímpica de Portugal no Triatlo, em Pequim 2008. «Foi por ela que comecei a fazer triatlo. Se não fosse ela, eu não fazia triatlo. Inspirou-me desde pequeno e criou o sonho dentro de mim em ser profissional no Triatlo», revela Vasco. «A Vanessa deu um enorme boost ao Triatlo português. Hoje somos talvez uma das maiores potências mundiais, e isso começou com ela», reforça Ricardo. Já Miguel recorda João Silva: «Ver o João no nono lugar nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, serviu-me de inspiração. Mais tarde treinámos juntos. Foi surreal para mim.»
Os três triatletas partilham o desejo de deixar uma marca no Triatlo. «Gostava que o meu exemplo mostrasse que tudo é possível, mesmo quando achamos que não pertencemos a este desporto ou não temos capacidade física», afirma Miguel. Já Ricardo sublinha o valor da persistência: «Dedicamos horas e anos a este desporto. O que nos move é acreditar num sonho. Se formos consistentes e acreditarmos, podemos chegar mais longe do que imaginámos». Vasco espera que o legado não seja ter nadado nas águas sujas do Rio Sena, em Paris, mas sim «mostrar que, mesmo sendo um país pequeno, podemos chegar longe».
O trio admite que o reconhecimento pela modalidade tem crescido, mas ainda há um caminho a percorrer: «Quanto melhores forem os resultados, mais se fala do Triatlo. Se houvesse mais interesse em falar da modalidade, seria melhor, mas esse interesse cresce com os resultados. Por isso, o que podemos fazer é ter melhores e mais resultados», afirma Vasco.
O Triatlo é saber usar o corpo todo para nadar, ter pernas fortes para pedalar e ainda conseguir ter pernas rápidas para correr
E quando se fala de inspiração para os mais jovens, a mensagem é clara: «O futebol é giro, mas há muito mais. A diversidade que existe no Triatlo é a parte mais bonita do desporto. No triatlo não é só jogar com os pés. É saber usar o corpo todo para nadar. É saber ter pernas fortes para conseguir andar à volta das curvas e pedalar dentro de um grupo. É conseguir ter pernas rápidas para correr a seguir» afirma Vasco. «O Triatlo acaba por ser muita entreajuda e muito companheirismo, o que torna este desporto especial no final do dia», conclui Miguel.
Vasco Vilaça, Ricardo Batista e Miguel Tiago Silva são o rosto de uma geração jovem, que não só ambiciona maior reconhecimento e elevar o nome de Portugal aos maiores pódios do mundo, como também o verdadeiro significado de inspiração, companheirismo e trabalho de equipa.