A selecionador romena, Camelia Voinea, está debaixo de fogo. IMAGO
A selecionador romena, Camelia Voinea, está debaixo de fogo. IMAGO

Ex-ginasta acusa selecionadora romena: «Quis suicidar-me»

O testemunho chocante de uma ex-ginasta que acusa Camelia Voinea, treinadora da Roménia, e mãe de Sabrina Voinea, reabre o caso tornado público por Denisa Golgota há uma semana. Entre as humilhações agora relatadas estão chicotadas, socos na cabeça e ginastas a urinarem com medo da treinadora

As declarações de Denisa Golgota, no regresso do Campeonato do Mundo de Jacarta, abalaram o mundo da ginástica e a Roménia. A ginasta denunciou agressões e um ambiente de grande tensão na seleção feminina, revelando que tinha ouvido coisas como: «Quero esmurrar-te a boca até que tenhas de fazer uma cirurgia».

Denisa revelou ter apresentado uma queixa na Federação Romena de Ginástica por assédio físico. Fontes do GOLAZO indicaram que a pessoa que a ameaçou foi a sua colega de equipa, Sabrina Voinea, filha da selecionadora romena.

Contudo, além de Denisa Golgota, outras duas ginastas, Mara Ceplinschi e Anamaria Mihaescu, apresentaram queixas semelhantes na federação.

Nessas queixas, que o presidente Ioan Suciu terá ignorado antes do Mundial na Indonésia, surge também o nome de Camelia Voinea, mãe de Sabrina.

Uma antiga ginasta do clube Farul de Constanța, onde Camelia Voinea treinou após terminar a carreira, decidiu agora fazer revelações chocantes sobre os seus métodos. Em entrevista exclusiva ao GOLAZO.ro, acusa a treinadora de abusos físicos e psicológicos que a levaram a ter pensamentos suicidas.

«Ainda hoje tenho medo da Camelia Voinea. Tenho 28 anos, vivo no estrangeiro e, talvez as pessoas se riam, mas continuo a ter medo dela. Fiquei muito traumatizada», explicou a atleta, que pediu para que o seu nome não fosse divulgado.

«Era 2001 e eu e os meus pais víamos na televisão as nossas grandes ginastas, como a Andreea Raducan, a Maria Olaru e a Simona Amânar. Fui para o Farul, em Constanța, e calhei no grupo da senhora Camelia Voinea. Após oito anos de calvário, aos 12 anos, não queria mais. A razão? Camelia Voinea», identificou.

«Fiquei com traumas porque ela se tornou muito violenta connosco, cada vez mais. E também sofri um acidente. A senhora Voinea não me prestou atenção e magoei-me com bastante gravidade. Foi assim que ganhei medo daquele aparelho. Não queria mencionar qual, porque ela vai perceber quem sou. E, como disse, ainda tenho medo...», insistiu.

«Dos quatro aos sete anos, quando não se vai a competições, tudo corre bem. Sentimos que nos estamos a divertir, parece que não há nada de mal. Depois, quando começámos a competir, começou o calvário. Insultos a toda a hora, agressões verbais, gritos. Mas o pior não era isso», contou a antiga ginasta.

«Batia-nos com um chicote»

«Ela arranjou um chicote, não sei onde. Era de borracha ou de um material semelhante. Se não fizesses bem um elemento, zás!, batia-te com o chicote nas pernas ou nos braços. Batia-nos como se fôssemos animais... Tinha 8, 9, 10 anos e ainda hoje me lembro, como se fosse ontem, daquelas chicotadas», revelou.

«Tinha nódoas negras, sobretudo nas pernas. Dizia à minha mãe que tomava banho sozinha, que me desenrascava, só para ela não ver as marcas. Vestia rapidamente uns collants e pronto. Se ela notava alguma coisa, mentia e dizia que tinha caído da trave», continuou.

«Não conseguia dormir, não conseguia descansar, tremia do nada. Vivia constantemente com medo. Ela ameaçava-nos, dizendo que se contássemos alguma coisa em casa, seria ainda pior. Uma das minhas colegas contou à mãe, que foi ao ginásio para falar com a Camelia. Ela disse à mãe da rapariga: 'só lhe dei uma bofetada, só um bocadinho'. Era muito boa a esconder o que se passava connosco e as pessoas acreditavam nela».

«Urinávamos com medo»

Os espancamentos que relata garante que eram de um cinismo horrível.

«Tínhamos pavor de ir para o balneário, porque era lá que ela nos batia. Se alguma errava num aparelho, levava-a para o balneário, mas obrigava todas as outras a esperar do lado de fora, no corredor. Alinhadas, para ouvirmos o que se passava lá dentro! Para ouvirmos como ela batia na que estava no balneário, para nos meter medo».

A ginasta que agora decidiu denunciar os maus tratos diz que só foi agredida com o chicote, mas que havia pior.

«Até fui uma sortuda. A algumas meninas, ela batia-lhes simplesmente com os punhos na cabeça. E aquela espera no corredor para entrar no balneário e levar a nossa dose de pancada, deixou marcas profundas na minha psique. Algumas raparigas urinavam nas calças, literalmente, de tanto medo»

«Tive pensamentos suicidas»

As agressões acabaram por provocar-lhe distúrbios alimentares e pensamentos suicidas, traumas que, segundo a atleta, a acompanharão para o resto da vida.

«Tive períodos com pensamentos suicidas. Os traumas que ela me deixou são para toda a vida, não apenas para os oito anos que lá estive. Frequentei terapeutas na Roménia e em Inglaterra», confessou a ex-ginasta.

«Lembro-me de pensar em atirar-me de uma ponte. Da Ponte Velha, perto do City Mall. Eu não sabia nadar, e isso ter-me-ia livrado de tudo, não é? Cheguei lá, mas alguém passou por mim e perguntou-me se eu estava bem. Falei com essa pessoa, que me levou ao hospital. Os meus avós e o meu tio chegaram e levaram-me para casa», recordou.

«Vi o que a Denisa contou e ganhei coragem. Não consigo explicar por palavras o que é ter 28 anos e ainda sentir medo de alguém. Quero que as pessoas saibam quem é a Camelia Voinea, não apenas a imagem que ela projeta na televisão. Poderia ter chegado mais longe na ginástica se tivesse tido outra treinadora. Estive perto de ir para o centro de treinos de Deva, mas ela não nos deixou», acrescentou.

A entrevistada explicou também que suportou tudo aquilo que contou porque a ginasta na Roménia é ainda uma forma de encontrar uma vida melhor. «Venho de uma família modesta. A minha mãe queria que eu tivesse um futuro, viu que eu gostava de ginástica e inscreveu-me no clube de Constança. Fiquei presa entre a pressão da família, o amor pela ginástica e as agressões da Camelia Voinea. Tinha 8, 9 anos. Como poderia saber o que fazer? A minha mãe percebeu que algo não estava bem comigo quando, aos 12 anos, eu ia a caminho do ginásio e voltava para casa, com medo».

«Lembro-me de ter caído da trave numa competição. À noite, saímos todos para jantar. As outras raparigas receberam o que quiseram, bife panado, batatas fritas, e eu recebi uma pequena porção de salada grega. Ela disse-me que eu não merecia mais nada porque não era suficientemente boa. Senti-me humilhada»

Camelia Voinea nega acusações

Tal como aconteceu com as declarações de Denisa Golgota, Camelia Voinea negou veementemente todas as acusações.

«Não existe tal coisa na ginástica, com chicotes e coisas do género! Agora surgem casos prescritos e acusam-se pessoas. Assim, qualquer um pode dizer qualquer coisa sobre qualquer pessoa. Acreditem, eu nunca levei uma bofetada dos meus treinadores, e vivi na era comunista. Não disse nada até agora precisamente para recolher mais informações sobre as pessoas que me difamaram», declarou a treinadora.