O Benfica teve uma grande noite europeia na vitória sobre o Nápoles
O Benfica teve uma grande noite europeia na vitória sobre o Nápoles

Benfica à ‘Special One’ vulgarizou o campeão de Itália

Quantas oportunidades de golo teve o Nápoles? Talvez meia; já os encarnados marcaram dois e podiam ter feito mais quatro, em momentos táticos muito diferentes do jogo: a equipa de ‘Mou’ começou em 4x4x1x1 e os italianos em 3x4x3; os portugueses acabaram em 5x4x1 e os napolitanos em 4x4x2. Em qualquer dos registos, ataque ou contra-ataque, o Benfica foi sempre melhor

Mais do que para pegar na calculadora e fazer contas a um apuramento que continua improvável (aquela derrota em casa com o Qarabag não lembra ao diabo), a vitória categórica do Benfica sobre o Nápoles deve servir para que os encarnados solidifiquem processos e adotem uma filosofia perante o jogo que lhes tem faltado, que passe por tudo aquilo que as grandes equipas devem ter. E não me refiro, sequer, aos nomes dos jogadores, à beleza técnica ou à necessidade de dar mais profundidade ao plantel.

O que fez a diferença na exibição do Benfica face a outras prestações não está à venda, porque a equipa da Luz, antes de tudo o mais, foi disciplinada taticamente, não correu riscos patetas nas saídas de bola e disputou cada bola como se a sorte do jogo dependesse desse lance. Repito, isto não está à venda em qualquer mercado, deve vir de dentro dos jogadores e, antes disso, só funciona se o treinador for capaz de lhes entrar na cabeça, fazendo-os acreditar no que lhes diz. 

AS SURPRESAS DE MOURINHO 

Mas vamos ao jogo e às duas surpresas que Mourinho guardara para Conte, a primeira a troca de António Silva por Tomás Araújo, mais fiável no corpo-a-corpo com o gigante Hojlund e mais certo nos passes em zona recuada que o seu companheiro; a segunda a entrada de Ivanovic para o lugar de Pavlidis, que apenas teve a ver com a estratégia que Mourinho desenhara para este encontro. O croata, mais móvel, rápido, a procurar as diagonais, foi um tormento para os napolitanos e, além disso, abriu crateras, entre linhas, que foram muito bem aproveitadas por Leandro Barreiro e Richard Ríos

António Conte deu-se mal com o 3x4x3, que a defender passava a 5x4x1, frente a um Benfica que jogava em 4x4x1x1 e quando tinha de defender adiantava Leandro Barreiro e passava a 4x4x2, com muitos momentos de pressão alta. E depois, quando quis ir atrás do prejuízo, atirou-se para um 4x4x2 com uma dupla de gigantes na frente – Hojlund e Lucca – a que José Mourinho respondeu à italiana, mandando a jogo António Silva e assumindo em definitivo o 5x4x1, deixando de parte aquele mais envergonhado que o Benfica apresentava quando Aursnes fazia de lateral e Dedic jogava de central pela direita.  

SÓ À TERCEIRA 

Nos minutos iniciais da partida, o Nápoles ainda ensaiou pressão alta, mas cedo percebeu que a equipa não estava compacta, e o Benfica saía a jogar com relativa facilidade, colocando a nu os buracos do tecido napolitano, que a páginas tantas mais pareceu um queijo suíço. 

Foi assim que, sem que os campeões de Itália assustassem Trubin (a coisa mais parecida com uma oportunidade que tiveram foi um cabeceamento, ao lado, de Di Lorenzo, aos 29 minutos), o Benfica precisou de desperdiçar duas oportunidades – aos 11 minutos quando um fantástico calcanhar de Aursnes isolou Ivanovic que, cara a cara com Milinkovic-Savic não conseguiu utrapassar os 2,02 metros do guarda-redes sérvio. Sete minutos depois, após uma fífia de Milinkovic-Savic, que meteu a bola nos pés de Aursnes, o norueguês não teve a melhor opção (que seria dar o golo a Ivanovic) e rematou ao lado. Só depois destes falhanços garrafais chegou o golo do Benfica, por Ríos, aos 20 minutos a desviar subtilmente a bola para o fundo das redes do campeão de Itália. E seria ainda o Benfica, por Otamendi (45+2) a estar muito perto do 2-0.

UM JOGO DIFERENTE 

Para a segunda parte, Conte começou por abdicar dos três centrais, ao mesmo tempo que reforçava o meio-campo, ficando David Neres (sempre virtuoso) no apoio a Hojlund. Mas os buracos do Nápoles apenas deixaram de nascer na inferioridade numérica de McTominay e Elmas e passaram a brotar da defesa, onde a movimentação dos encarnados punha a cabeça em água a Rrahmani e Buongiorno. E foi de uma insistência de Ivanovic pela direita (49), que rasgou os centrais, chegando a bola a Ríos, que a endossou a Leandro Barreiro, fazendo este um golo de belíssimo recorte técnico. 

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A ganhar por 2-0 a 40 minutos do fim, a palavra de ordem de Mourinho foi «não correr riscos». Assim, além do 5x4x1 envergonhado, com o recuo de Aursnes para a lateral direita, os defesas do Benfica passaram a usar um futebol mais direto, só assistindo Barrenechea e Ríos, no meio, com risco-zero. A esta alteração, ainda se juntou uma ordem dada a Trubin, que deixou de sair curto e, nos pontapés de baliza ou nas reposições, procurava Ivanovic (e depois Pavlidis). O pragmatismo de Mourinho, num momento delicado do jogo, foi fundamental para a vitória encarnada. E mantendo o tema no pragmatismo, quando Antonio Conte mandou a jogo os dois metros de Lucca, Mou respondeu com António Silva como central da esquerda, fixando Aursnes à frente de Dedic e Barreiro na esquerda, à frente de Dahl, após a saída de Sudakov, enquanto Pavlidis, ia usando o talento que tem em jogar de costas para a baliza. E de tudo isto o que resultou? Enquanto os napolitanos apenas obrigaram Trubin a uma defesa fácil, a remate de Neres, aos 71 minutos, o Benfica, aos 79 e 84 minutos, voltou a ter duas boas oportunidades, superiorizando-se Milinkovic-Savic a Pavlidis.  

Triunfo claro do melhor Benfica da época, que deve ter aprendido a lição de que, quando se mete a carne toda no assador, ficamos sempre mais perto de ganhar. Há quem chame isto de mística