Volta a Espanha: João Almeida pode vencer Jonas Vingegaard?
João Almeida parte para a sua quarta Volta a Espanha com intenção de a vencer. Conseguindo-o, tornar-se-ia o primeiro corredor português a conquistar uma das três grandes voltas, a Itália, França e Espanha, superando Joaquim Agostinho, segundo classificado na Vuelta em 1974 e terceiro no Tour em 1978 e 79. João Almeida já sabe o que é subir ao pódio final de uma grande volta. Fê-lo em 2023, no Giro, e por duas vezes ficou à beira do púlpito do desporto, na quarta posição, na Vuelta 2022 e no Tour 2024, em ambos na sua estreia.
À nona participação numa grande, João Almeida volta a visar o pódio, mas nesta Vuelta, que hoje inicia, com justificadas pretensões ao degrau mais alto. Aos 27 anos, recentemente celebrados (5 de agosto), e a caminho de completar seis temporadas no WorldTour, o corredor que colocou A-dos-Francos, pequena povoação no concelho de Caldas da Rainha, no mapa do desporto português, está no auge da carreira - ainda que faça questão de ressalvar, sentindo-se com margem de progressão - e assumindo-se preparado, física e mentalmente, para vencer uma grande volta.
A primeira vez que reconheceu a ambição de vitória foi na Vuelta de 2024, a edição que partiu de Portugal (e por cá teve três etapas), motivado pelo simbolismo e a oportunidade, e uma estreia de excelência no Tour, com o quarto lugar atrás dos três magníficos, Tadej Pogacar, Jonas Vingegaard e Remco Evenepoel. Chance perdida devido a doença (covid), forçando-o à desistência (após a 8.ª etapa).
Este ano, repetiu o programa: Tour e Vuelta. Após uma primavera fulgurante, com vitórias consecutivas em três corridas por etapas do WorldTour de grande prestígio, as Voltas ao País Basco, à Romandia e à Suíça, as ambições à partida para o Tour bloqueadas por estar ao serviço do seu líder incontestável, Pogacar, mas com pretensões reforçadas ao pódio (ainda que a presença do mesmo top-3 do ano anterior), João Almeida voltou a abandonar, então devido a queda (na 7.ª etapa e já não partiu para a 9.ª), impedido por fratura de uma costela.
Lesão e Vingegaard
O líder da Visma-Lease a Bike chega a esta Vuelta sedento de vencer, depois de ter sido claramente derrotado por Pogacar no Tour. Não aceitará como sucesso nada menos do que o primeiro triunfo na corrida espanhola, em três participações. Traz uma equipa de luxo, que não fica aquém da que levou à Volta a França e integrando alguns repetentes desta, como os tenentes de montanha Matteo Jorgenson e Sepp Kuss, esperando melhores destes do que na Grande Boucle, e ainda o melhor da formação no Tour, o rolador surpreendentemente tornado trepador, Victor Campenaerts. Jonas Vingegaard não quer facilitar, falhar provocar-lhe-ia revés certamente mais profundo do que a derrota em França contra Pogacar, o melhor corredor do mundo.
Será bastante difícil a João Almeida bater o dinamarquês, para mais num percurso tão montanhoso, com tantos finais em alto, como o desta Vuelta. No entanto, o português está a saber encarar o desafio. Desde logo, com o reconhecimento do favoritismo do adversário - e por este assumido -, coloca-se, e à sua equipa, em posição de expectativa, que, no ciclismo, equivale a seguir na roda, protegido da penetração ao ar.
João Almeida vai mais longe nesta atribuição de responsabilidade no «controlo e endurecimento da corrida» a Vingegaard e à Visma, afirmando que poderá até ser-lhe «favorável», «poupando ao máximo as energias» e procurando aplicá-las eficazmente quando as «oportunidades surgirem».
Uma abordagem sensata
Esta estratégia, mais mental do que prática, parece a ser mais sensata perante a superioridade do oponente. Mas certamente não chegará. João Almeida necessitará da sua melhor versão, de sempre, para, em condições normais, impor-se a Jonas Vingegaard numa corrida de três semanas. Este, até ver, é-lhe superior em alta montanha. Como se viu nas últimas duas edições do Tour, só Pogacar é capaz de o bater nas mais longas e exigentes subidas.
A Visma não demorará e não terá contemplações a tentar explorar alguma situação de mau posicionamento de Almeida para o atrasar. O português terá de estar em alerta máximo e sempre bem apoiado pelos seus companheiros de equipa nestes momentos das etapas – Ivo Oliveira será fundamental, pela capacidade e... fidelidade. Além disso, a formação neerlandesa apostará, mais aplicadamente do que no Tour, em ter Matteo Jorgenson como joker, esperando que o norte-americano esteja em melhor forma do que nas estradas francesas, há pouco mais de um mês. Ainda que Vingegaard não deva estar em disposição de arriscar perder a Vuelta... para o seu colega, com a edição de 2023, cedida a Sepp Kuss - depois de este ter aproveitado uma fuga para agarrar a camisola vermelha - bem fresca na sua memória.
Ser segundo, atrás de Vingegaard, não será um desaire para o João Almeida. Seria o seu melhor resultado em grandes voltas, mais um patamar ascendido. A vitória é um objetivo, o português não o esconde, mas também não se cansa de ressalvar que haverá sempre mais oportunidades.