«Sou eu o culpado por não ter vencido no Benfica»
- Chegou ao Benfica em 1994, seguramente com todos os sonhos do mundo. Apenas sete jogos de águia ao peito foi uma desilusão para si?
- Não poria as coisas nesse patamar. Na altura eu era um jovem que saiu do Nacional de Benguela, fiz escala em Luanda e de repente... estou no Benfica. A minha estreia até foi pelos juniores, só depois nos séniores. É verdade que nunca consegui afirmar-me no Benfica. Várias coisas contribuiram para isso, desde a limitação de estrangeiros que vigorava na altura poassando pelas minhas constantes chamadas à seleção de Angola. Muitas vezes para jogos e competições em momentos competitivos na Europa. Era chamado para a seleção sub-23, para a seleção sénior...
- Nunca pensou dizer não a Angola?
- Nunca tive um conselheiro, um empresário, alguém que chegasse ao pé de mim para dizer que não tinha de ir a todas as convocatórias. Que me pusesse na cabeça que ia muitas vezes com o campeonato português em andamento e que estava a prejudicar-me em termos de carreira. Que me ensinasse a ser mais racional.
- No Benfica chamavam-no à atenção?
- Lembro de jogadores como o César Brito, o Tavares ou o Dimas se meterem comigo nos treinos a perguntarem-me se só ia a Lisboa para receber o ordenado... Olhando para trás, de facto, eu passava muito tempo nas seleções de Angola e isso acabou por atrapalhar a minha afirmação no Benfica. Era um grande objetivo, estamos a falar do Benfica, uma equipa enorme, cheia de grandes jogadores e que não pode estar sempre à espera. A concorrência era fortíssima por si mesmo, nunca seria fácil garantir um lugar no onze, menos com estas constantes ausências.
- Reconhecendo esse erro, sobra algum sentimento de injustiça?
- Não, nunca diria injustiça. Não que seja agora útil pensar nisso, mas se houve um culpado... o único culpado fui eu... É verdade que não correu como sonhei, num clube que sonhei; é verdade que deveria ter feito uma gestão mais inteligente e menos emocional. É verdade que nunca fui capaz de dizer não ao carinho e importância que me davam em Angola, mas há momentos em que, para o bem de todos, temos de ser racionais. Como outros jogadores que, de quando em vez, diziam não à seleção para não se prejudicarem nos clubes.
- Curiosamente, eu sinto ao falar com os benfiquistas que pelo menos os adeptos se lembram de si e falam de si com carinho. Sente o mesmo?
- Sinto e isso deixa-me orgulhoso. Guardo boas recordações de Portugal e do Benfica. Não esqueço que um dia estava no Nacional de Benguela e no outro dia num gigante mundial. Eu via aqueles jogadores na televisão, de repente estou a treinar com eles... Sempre fui bem tratado no Benfica, dos dirigentes, companheiros aos adeptos.
- Alguém que recorde com maior carinho?
- Tenho de mandar um grande abraço ao Shéu Han. Grande figura do Benfica, na altura no departamento de futebol, foi sempre impecável comigo. Mantenho amizades, claro, faço parte de um grupo do Whatsapp de antigos jogadores do Benfica e acompanho o que se passa com a equipa, claro. E os adeptos tratam-me com carinho quando vou à Luz.
- Só por curiosidade, algum jogador do seu tempo ficou mais amigo?
- O Mozer ficou grande amigo. E olhe que na altura, como eu era avançado, estava sempre a ameaçar-me nos treinos que me dava porrada... [risos] Também o Valdo... E mantive uma boa amizade com o saudoso Neno. O Abel Xavier, o Veloso, o José Soares... Enfim, vários jogadores com quem sempre mantive uma boa amizade. Sem esquecer o Edgar, com quem praticamente dividia apartamento... Só boas memórias.