Martínez, Varandas e Lage: uma questão de perspetiva
Em Portugal, o futebol tem um enorme peso mediático. Esta realidade faz com que a comunicação ganhe cada vez maior peso tendo em conta a perceção que se quer passar aos adeptos. Por este motivo, as empresas de comunicação têm vindo a crescer. Muitas vezes o objetivo destas empresas é tentar transformar uma informação com conexão negativa em algo extremamente positivo.
Roberto Martínez
O selecionador nacional chegou e rapidamente se tentou integrar na nossa cultura. Esforçou-se por falar português nas conferências e é sempre afável com todos aqueles com quem contacta. Neste campo não tenho nada a apontar.
A questão muda de figura quando o tema é o que se passa dentro das quatro linhas. Importa referir que existem vários caminhos para se ter sucesso e que não existe apenas uma fórmula para vencer. Assim, admito que não concordo com a forma como Roberto Martínez pretende alcançar o sucesso.
O trabalho de um selecionador é mais complexo do que o de um treinador de uma equipa que joga semana a semana. O tempo de treino é muito mais reduzido. Isto faz com que as rotinas que se pretendem implementar sejam mais difíceis de alcançar. Quando vejo a Seleção Nacional a jogar penso muito nisto.
Roberto Martínez opta, de uma forma regular, por colocar jogadores em posições que raramente jogam e altera constantemente sistemas táticos. Baralha os adversários e baralha os nossos jogadores. O melhor exemplo é o de Nuno Mendes. Quando é que Nuno Mendes mais brilhou com Martínez? Na fase final da Liga das Nações onde pôde explorar todo o corredor esquerdo. A conquista da Liga das Nações demonstra isto que estou a referir. Foi quando o selecionador alterou a equipa (entrada de Nélson Semedo), e simplificou, que nos conseguimos sobrepor aos adversários. Nem tudo está mal quando se perde e nem tudo está bem quando se ganha.
Apesar de Martínez ter uma percentagem de vitórias elevada, a realidade é que estamos a perder tempo. Ao fim de quase três anos de Martínez no comando, entendo que devíamos ter outra capacidade exibicional. Esta ideia ganha ainda mais força quando vemos um jogo de Espanha e nos questionamos: a Espanha tem melhores jogadores que Portugal? Não creio. Então porque joga um futebol encantador e nós não? Simplesmente porque, como dizia Cruyff «no futebol o difícil é fazer o simples».
Se o selecionador nacional tivesse implementado uma forma de jogar similar a que De La Fuente implementou em Espanha teríamos tido mais sucesso desportivo? Não consigo responder a esta pergunta. O que sei é que se o tivesse feito, antes dos jogos começarem, a nossa confiança seria muito maior do que a que temos neste momento, porque, a realidade, é que nunca sabemos que Seleção vamos ter dentro do relvado.
Frederico Varandas
Esta semana surgiu uma informação que o Al Ahli, da Arábia Saudita, pretendia contratar Frederico Varandas para ser o CEO do clube. Inclusivamente surgiu a informação que a proposta seria de €12 M.
Não sei se quem deu a notícia teve a noção de que a proposta deveria ser em SAR (moeda da Arábia Saudita), ou seja, com o câmbio feito, a proposta seria de €2,7 M em três anos… Apesar deste pormenor, não é o valor ou não da proposta que me causa estupefação. O que me deixa intrigado é o facto de Frederico Varandas ter chegado até ao momento da apresentação de proposta. Seria incrível que um clube quisesse contratar um CEO sem o entrevistar.
Ora, assim sendo, Frederico Varandas, atual presidente do Sporting, aceitou passar por um processo de recrutamento quando dirige o clube do seu coração? Tudo isto ainda é mais confuso porque Varandas foi eleito e não contratado pelo Sporting. Para baralhar ainda mais, a proposta apresentada pressupunha a entrada em funções no imediato.
Aqui surgem várias questões: o atual presidente do Sporting entrou num processo de recrutamento colocando a hipótese de sair imediatamente do Sporting? Podemos equiparar um presidente a um diretor-geral ou a um diretor-clínico? Não deveria ter, desde logo, recusado a abordagem inicial que lhe foi feita?
O mais interessante é que a forma como a informação nos chegou é que até na Arábia Saudita pretendem contratar o presidente do Sporting, tentando com isto reforçar o seu valor e qualidade. A minha interpretação é que ao passar por todo o processo até chegar à formalização de uma proposta, Varandas deu um tiro na cultura leonina.
De agora em diante o presidente do Sporting não vai ter moral para questionar um seu colaborador (jogador, treinador ou diretor) quando, com contrato, falar com outros clubes que o abordem. A cultura vem de cima para baixo…
Bruno Lage
Mais uma vez foi infeliz a comunicar. Não sei se leu mal o que tinha no caderno ou não. A realidade é que referiu que este foi o primeiro mercado em que a direção desportiva e o presidente dos encarnados ouviram a opinião do seu treinador.
O gabinete de comunicação do Benfica apressou-se a corrigir o que o seu treinador tinha acabado de dizer na conferência de imprensa: o treinador encarnado queria afinal dizer mercado de verão!! Tiro várias conclusões sobre esta questão.
A primeira é que esta declaração não saiu da cabeça de Lage. Se analisar apenas o que treinador encarnado referiu, o projeto desportivo encarnado fica muito mal na fotografia. No mercado de Inverno o Benfica contratou Bruma, Bellotti, Dahl e Manu.
Numa altura em que o Benfica estava na Liga dos Campeões e com aspirações na Taça de Portugal e campeonato, a estrutura encarnada contrata jogadores sem falar com o treinador? Estas palavras de Lage não quererão passar a responsabilidade do insucesso da última época para a administração?
Por outro lado, se o que Lage queria dizer era mercado de Verão, será que ele quis mandar um recado a Vieira? A rápida reação do gabinete de comunicação do Benfica quererá dizer que a mensagem foi concertada e não da autoria do treinador encarnado? Faz sentido um treinador de uma equipa querer envolver-se nas eleições? O treinador é um funcionário do clube ou de um Presidente?