«Eleições no Benfica? Um estrangeiro diria que são eleições políticas»
A precisamente um mês das eleições à presidência do Benfica, os seis candidatos que irão a escrutínio têm apresentado os seus argumentos. E no momento de convencerem os adeptos de que são o homem certo para liderar os destinos do clube contam com grandes máquinas de campanha, com modelos cada vez mais semelhantes aos da política, segundo José Quintela, ex-membro da Direção do Sporting e consultor em comunicação estratégica.
«Estamos a assistir às eleições do Benfica, quem trabalha cada uma das candidaturas são atores que trabalham nas campanhas políticas, os modelos são cada vez mais similares», observa o investigador, que assina a tese de doutoramento do ISCTE Os 'Jogos' do Jogo: Comunicação e Poder no Futebol Português, falando no contexto eleitoral que centra atenções no emblema da Luz.
«A notoriedade dos candidatos é completamente diferente. Os que têm mais notoriedade são o atual presidente, Rui Costa, que foi grande futebolista, foi dirigente e é presidente, é sobejamente conhecido; o anterior presidente, Luís Filipe Vieira, conhecido pelo período em que esteve no poder; um candidato que já foi candidato, Noronha Lopes, que já tem alguma notoriedade e terá maior naqueles a quem se dirige; João Manteigas, que é um desafiador, com conhecimento do clube, e que era comentador, terá menor notoriedade; Martim Mayer tem uma notoriedade muito reduzida, daí a associação a Borges Coutinho, usar a ligação familiar a ver se alavanca, algo que já foi usado por José Couceiro; e Cristóvão Carvalho», enumerou.
«As grandes máquinas de campanha estão em Rui Costa. Tem vantagem porque está no poder, tem uma estrutura que o ajuda, quem está no poder tem sempre vantagem. Luís Filipe Vieira tem uma máquina poderosíssima de campanha, tal como Noronha Lopes, e vemos isso no espaço mediático — não tenho visto de forma aprofundada, mas do que me dá a parecer estas três estão mais sólidas. E quem trabalha nestas campanhas são consultores, estruturas que trabalham na política e que participaram em campanhas políticas. Uma bolha comunicacional com os mesmos atores a desempenharem papéis diferentes», observou.
Encontramos analogias nos discursos de Alberto João Jardim e de Pinto da Costa. A força da Madeira ou do Norte contra o centralismo de Lisboa, os 'cubanos' ou os 'mouros'... são narrativas muito similares: trabalharmos a coesão interna através de inimigo externo
«Analisámos as campanhas do FC Porto e do Benfica. Talvez se as mostrássemos a um estrangeiro, ele diria que seriam eleições políticas de um partido qualquer. Porque todo o espetáculo montado à volta é da política. Não é de agora», sublinhou, antes de recuar no tempo para estabelecer um paralelismo.
«Se fizermos uma análise dos discursos de Alberto João Jardim e de Pinto da Costa iremos encontrar analogias. A força da Madeira ou do Norte contra o centralismo de Lisboa, os cubanos ou os mouros... são formas de pensamento e narrativas muito similares, de agregarmos e trabalharmos a coesão interna através de inimigo externo. Esta associação da política ao futebol pode ser vista de diversas formas, não é por acaso que vemos vários políticos a quererem estar no futebol», verificou.
«O líder do Chega é uma personagem que emerge num programa desportivo como comentador-adepto, porque teve aí exposição mediática, e a forma como debatia nos debates desportivos transporta-a para a vida de político. O espaço anterior de debate constituiu um laboratório de aperfeiçoamento e treino. Por exemplo, no primeiro caso chegou a usar a expressão 'Palhaço é a tua tia' e depois, no Parlamento, disse 'Mentirosa é a tua tia'. O registo, o confronto, são muito similares. Estes programas de debate desportivo são centros de estágio e formação para outro tipo de projetos. É o fenómeno desportivo a alavancar e a encobrir outro tipo de ambições», sublinhou.