João Carvalho percorria 1.200 quilómetros por semana quando representava a formação do Benfica e é hoje uma das figuras do Estoril. Foto: A BOLA
João Carvalho percorria 1.200 quilómetros por semana quando representava a formação do Benfica e é hoje uma das figuras do Estoril. Foto: A BOLA

João Carvalho: dez jogos pelo Benfica «sabe a pouco»

O menino que, em tempos, fazia 1.200 quilómetros por semana com o sonho de jogar no Benfica é hoje uma das estrelas do Estoril, fala sobre o seu percurso

– Teve longa passagem pelo Benfica, onde começou ainda muito jovem até atingir idade sénior. E ainda realizou dez jogos na equipa principal, entre provas nacionais e Champions. Olhando para trás, foi um sonho concretizado ou sabe-lhe a pouco?
Claro que sabe a pouco! Acho que tive duas épocas e meia, se não me engano, na equipa B a um bom nível, com uma boa performance e depois fui emprestado ao Vitória de Setúbal. Quando voltei, não soube aproveitar as oportunidades que tive, não soube estar naquele balneário com muita exigência e naquela altura também não fazia parte da minha personalidade ser um pouco mais aberto no balneário e nos treinos, jogos, etc. 

João Carvalho cumpriu a formação no Benfica e representou a equipa principal em dez partidas, incluindo Champions. Foto: A BOLA

– Arrepende-se de alguma coisa?
Arrependo-me mais pela minha parte do que qualquer outra coisa, mas a seguir ainda consegui dar 15 milhões de euros a ganhar ao clube. No final de tudo, apesar de não ter dado aquilo que os adeptos queriam com as minhas performances, ajudei o clube de outra forma, apesar de não ser o que queria. Mas é passado e ajudou-me a estar aqui.

– No Estoril reencontra Pizzi, com quem já havia partilhado balneário no Benfica. É uma referência?
Acho que o Pizzi – falando sem puxar o saco… – foi, se calhar, um dos melhores médios em termos de números que passou na nossa Liga, essa é a realidade. Já na altura era uma referência no Benfica, no clube de onde eu vinha desde a formação, e claro que olhava para eles, para as referências, de outra forma. Vê-lo aqui outra vez é sempre um prazer, jogar e treinar ao lado dele também. É uma pessoa que nos ajuda muito e é uma pessoa extraordinária. Acho que é das pessoas mais fáceis de se estar no balneário.

– No Benfica, havia trabalhado com líderes de balneário, como Luisão. Para alguém que hoje é capitão de uma equipa de primeira Liga, foi possível beber um pouco dessas influências no Benfica para agora aplicar no Estoril?
Encaro esta tarefa de ser capitão com muita naturalidade, sinceramente. Tenho a personalidade que tenho e é claro que se pode moldar de um lado e de outro e é claro que se calhar sou uma pessoa mais tranquila, se calhar por vezes mais tímida, mas ao mesmo tempo sei quando falar e estar. É claro que se bebeu um pouco do passado, foram grandes referências; o Luisão é um grande capitão e o Pizzi também o foi e, claro, um capitão do Benfica, num clube grande vai ser sempre uma pessoa com liderança. Tento beber um pouco de cada e até mesmo se calhar dos jovens que passam por aqui eu bebo da confiança que eles têm em si próprios, porque acho que não tive essa confiança em mim quando era jovem e parece-me bem eles terem essa confiança. Serão muitos momentos altos e baixos e nos baixos é preciso ter aquela confiança, porque mais ninguém ta vai dar, vai haver momentos em que se está sozinho e, lá está, essa confiança em nós próprios é fundamental.

– É hoje um dos valores da Liga portuguesa, mas no início da carreira sujeitou-se a uma logística complicada, vindo de Castanheira de Pera até Lisboa para frequentar os treinos na formação do Benfica
Eram 200 quilómetros [de trajeto], 400 quilómetros por dia três vezes por semana (sorri). Primeiro de tudo, tenho de agradecer aos meus pais. Tive a sorte de terem tido a possibilidade de o fazer. Claro que o Benfica também ajudava e éramos alguns a fazer esse caminho e alguns até de mais longe, de Aveiro, etc., e foi muito gratificante para mim, facilitou muito o meu desenvolvimento porque treinava com os melhores.

– Que benefícios sentiu desse ‘sacrifício’?
Havia a possibilidade de treinar perto da minha casa e depois vir aos fins de semana, mas acho que ia perder com isso e na altura os meus pais foram inteligentes e ajudaram muito nisso, porque é bastante diferente treinar lá perto de casa e vir jogar ao fim de semana ou estar entre os melhores três vezes por semana. Claramente desenvolvi-me muito mais rápido e com mais naturalidade.

– Para alguém que hoje é profissional, olha para trás e pensa que, no fim de contas, valeu a pena?
Claro que sim, acho que o primeiro contrato profissional já vale isso tudo, mas acima de tudo ter uma carreira, poder fazer isto, a minha profissão, é claramente gratificante. No final, tenho de agradecer aos meus pais, claramente que agradeço pelo esforço que tiveram durante esses anos mas acho que irá valer a pena no final, pois sinto que ainda não acabou.