Edo Bosch: «Mandei-o tomar banho e abandonar o treino!»

Disse que não queria treinar o filho, mas no Valongo não teve alternativa. Repetiu a história na Oliveirense e agora, Xano Edo chegou ao Sporting para ser, novamente, orientado pelo pai. Que até hoje só expulsou um jogador de um treino: o filho.

— O pai tinha dito que nunca iria treinar o filho. Disse isso uma vez. Já vai para aí terceira vez…

EB: Terceira.

— O Xano é talismã?

EB: Sempre tinha dito que não queria, porque desde pequeno tínhamos conflitos, onde a mãe sempre intervinha. Pensava que ia ser muito difícil para mim treiná-lo. Foi um diretor do Valongo que, quando o Bernardo decidiu ir para o Benfica, disse que a única opção que tinha era ele. Fui obrigado [risos]. Na minha cabeça era uma opção válida porque era o momento dele regressar a Portugal, para o campeonato que era muito melhor e sabia que aquela equipa do Valongo era uma equipa com uma projeção fantástica e que ia ajudá-lo a crescer. E cedi. Sinceramente, se o meu filho fosse jogador, seria muito mais difícil porque ali oito jogadores. No caso do guarda-redes, normalmente escolhe-se um e o outro não joga.

— É fácil de lidar?

EB: Sempre tentei não levar o hóquei para casa, para já está a funcionar bastante bem e estamos a entender-nos.

— É verdade que até hoje só expulsou um jogador de um treino?

EB: Sim, sim [risos].

— E quem foi?

EB: Foi ele [aponta para o filho]. Estava a preparar a final da Champions, contra o Sporting, e era uma semana de treinos e muitos nervos, claro. Sei que a cabeça de um guarda-redes é fundamental e decidi fazer uns exercícios de finalização para o guarda-redes. Imagina, de 10 jogadores a rematarem o normal é que, a um guarda-redes que está bem preparado, marquem um, no máximo dois golos. E a ele, naquela série, marcaram-lhe quatro ou cinco golos. Eu achei que aquilo ia fazer-lhe mal à cabeça e disse para repetirem. Ele, em vez de entender como uma coisa positiva, entendeu pelo lado negativo. E, em vez de dois, voltaram a ser cinco ou seis.

XE: Pois... [risos]

EB: Ele cruzou, perdeu o foco e ficou ainda pior. A tensão do treino começou a aumentar até que ele estava fora do treino. Até que eu estou recuado na tabela e ele sai com a frase: ‘Quero ver se no ano que vem com o Girão se és igual’. Eu fiquei boquiaberto. Pensei: ‘Eu não ouvi isto’.

XE: Ele ia para o Sporting a seguir e eu ia ficar na Oliveirense [risos].

EB: Virei-me para ele e disse: ‘O que é que disseste?!’ E ele: ‘Nada, nada’. Fiquei louco. ‘Nada?! Tchau! Vai tomar banho!’. Mas depois comecei a pensar ‘E agora!? Faltam cinco dias para jogar a final da Champions. Como vou resolver isto? Ele parece muito calmo, tem esse lado da mãe, mas também tem o lado do pai revolucionário. Como vou resolver isto?!’ Mas ele tomou banho, acalmou, pediu desculpas aos jogadores e a mim, ficou lá, e ainda foi motivo para juntar mais ao grupo e estarmos mais fortes.

— Como é que o trata?

XE: Como treinador, mas não o chamo [risos]. Peço a alguém para o chamar [risos]. Se sai ‘pai’… Às vezes não é fácil. Acho que nunca aconteceu, mas começam logo as brincadeiras dos outros.

— Como foi a experiência em Espanha? Com 16 anos sozinho num clube como o Barcelona?

XE: Foi uma experiência que me mudou, mais que ganhar títulos, perdi muito mais [risos], foi uma grande aprendizagem. Estive três anos no Barcelona, três anos em que aprendi muito.

— A perder?

XE: A perder. Mas ainda bem que foi lá e não agora [risos]. Vive-se de uma maneira diferente, porque o hóquei está muito centrado na Catalunha. Mas quando vim para o Valongo vi realmente o que é um país de hóquei. Foi um salto na minha carreira, também por ser treinado pelo meu pai, mas foi um salto como profissional.

— Não se arrepende de ter ido para lá tão novo?

XE: Às vezes penso o que teria acontecido se eu tivesse ficado. Mas serviu para aprender, serviu para crescer. Estou bem comigo, com quem sou dentro e fora da pista, acho que foi a decisão correta.

— Nunca hesitou em relação à Seleção que ia defender?

XE: Não. Vivi a minha vida toda aqui. Toda, menos esses cinco anos. Tenho muito carinho por Espanha e por ter dupla nacionalidade, a minha família é de lá e sempre foi um país onde eu tive muito carinho, muita ligação.

— Quando há um Portugal-Espanha...

XE: Pois… Mas agora menos, estou na baliza a defender Portugal!

— E o avô também era jogador, pai do Edo?

EB: Sim, mas não guarda-redes [risos]. Era um grande jogador, foi campeão do Mundo em 1970 e em San Juan recordou-me agora quando fomos à Argentina. Pensei logo que ia dar sorte.

— E faz comentários?

EB: Sofre muito com o neto. Imenso. Vê o jogo duas e três vezes, depois diz, aqui saiu de imagem, aqui e tal… Nunca foi guarda-redes!

XE: Diz à minha avó [risos] e ela diz-me: ‘O teu avô hoje não gostou muito, diz que falhaste ali e ali’.