Miguel Oliveira 2025. Foto Pramac Racing
Miguel Oliveira estrou-se no MotoGP em 2019 - Foto Pramac Racing

De heróis a vilões

Miguel Oliveira ficou esta semana a saber que não continuará na Prima Pramac no próximo ano e que dificilmente terá lugar na grelha do MotoGP de 2026

Lembro-me da primeira vez que falei com Miguel Oliveira. Tímido, mas não muito, o miúdo mexia na moto, numa tenda no fim da linha do velhinho autódromo do Estoril. Ia com a missão de fazer a cobertura do Grande Prémio de MotoGP com paragem obrigatória em Portugal que recebia mais uma vez estrelas como Valentino Rossi, Sete Gibernau ou Alex Barros.

O saudoso Domingos Piedade fez a visita guiada e disse-me: «Devia falar com um miúdo português que vai chegar longe». Segui o conselho, pouco confiante, confesso, que fosse desta que encontraríamos um piloto capaz de se tornar uma estrela mundial.

Passaram-se anos, muitos, continuei a acompanhar o miúdo e o seu sonho repetido de querer chegar ao MotoGP. Para a maioria das pessoas eram apenas palavras. A primeira experiência, ainda nas 125cc, mostrava como seria difícil entrar naquele restrito clube. Correu mal, mas o miúdo não desistiu. Fui a Espanha à sua apresentação na primeira equipa de Moto3. Em Portugal, muitos continuaram a desdenhar.

O miúdo, de mão dada com o pai, continuou a dizer que queria chegar ao MotoGP. Quando passou para o Moto2, os olhares distraídos viraram-se para Miguel Oliveira. Quando começou a vencer, os aplausos começaram a ouvir-se. Quando se sagrou vice-campeão mundial, o aeroporto estava cheio para o receber. Há seis anos, o MotoGP recebeu o primeiro português e todos passaram a conhecer o Falcão, o piloto de Almada que voou para a maior e mais mediática competição de motociclismo do Mundo.

Quando venceu na Áustria, pela primeira vez, abriu telejornais. Seguiram-se tempos difíceis, com escolhas que podem não ter sido as melhores, acidentes provocados, na maioria das vezes por outros — no ano passado o MotoGP revelou, como sempre faz, os pilotos que mais vezes caíram ao longo da época, e, surpreendam-se, Miguel Oliveira foi quem menos caiu.

Esta semana, o piloto soube que não ficará na Prima Pramac e que dificilmente encontrará um lugar na grelha para o próximo ano.

Podia ter arriscado mais? Se calhar podia. Podia ter tido mais sorte com a Yamaha de que os quatro pilotos se queixam? Se calhar podia. Podia ter feito outras opções? Se calhar podia.

Mas deixou de ser o primeiro português a conseguir algo histórico no motociclismo? Mas poderia ter contornado o azar de ter nascido num País que não tem milhões de pessoas ou euros para lhe encher uma mala? Ou um mercado atraente? Não. Continua a ser o miúdo, tímido, mas não muito, que foi atrás do sonho e conseguiu concretizá-lo.

A velocidade com que os heróis da nossa vida passam a vilões é assustadora.