O protesto dos adeptos do Caldas, ontem à noite, em Torres Vedras - Foto: Carlos Barroso/LUSA
O protesto dos adeptos do Caldas, ontem à noite, em Torres Vedras - Foto: Carlos Barroso/LUSA

As botas são pretas mas esta Taça já não é a prova rainha

Queremos acreditar que houve um racional na decisão, mas a forma como decorreu o processo roça a ofensa a quem ainda acredita num romantismo que fez desta competição especial

Jorge Valdano recordou há uns anos que a Taça do Rei é a prova onde há mais botas pretas e que por isso é onde o futebol regressa de uma certa forma às suas origens, a um tempo quando as chuteiras não eram uma feira cromática nem rivalizavam com coletes refletores com as suas cores berrantes. Mas no mesmo momento em que o cronista fez essa observação também caiu na realidade, aludindo às mudanças de campo em Espanha devido à falta de condições dos estádios dos ditos pequenos clubes, tudo em nome da segurança à luz dos padrões atuais.

Esse é um cenário que também ocorre em Portugal em nome da dita evolução: quando sai o sorteio de uma qualquer equipa que dispute uma competição abaixo da Liga 2 já se sabe que, na condição de visitado, jogará em casa emprestada - em alguns casos, no recinto do próprio adversário para ganhar mais receita de bilheteira.

É sempre um equilíbrio difícil para os decisores: de um lado, respeitar a tradição, culturas locais e um certo romantismo que está arreigado à Taça de Portugal; do outro, impedir que a alegada falta de condições possa pôr em causa o bem-estar de adeptos, jogadores e demais agentes.

Num futebol ideal, qualquer clube da Liga 3 ou do Campeonato de Portugal deveria reunir as condições mínimas estabelecidas pelas regras, mas todos sabemos que isso não é viável e até há casos em que sociedades desportivas do principal escalão são multadas por situações insólitas - quem não se lembra de o Farense ter de pagar 408 euros por ter apenas um bar em funcionamento no jogo com o Casa Pia?

Queremos acreditar que terá havido um racional para, tão em cima da hora, obrigar à mudança de estádio do Caldas-SC Braga. Mas levanta muitas questões a forma como todo o processo decorreu, fosse nas inspeções do relvado ou nas reuniões entre as entidades durante a semana (há quanto tempo se sabe que está a chover?). Mas não lembra a ninguém comunicados emitidos de madrugada, pela calada, que pouco ou nada respondem às inquietações não só de jogadores, treinadores, dirigentes e staff, mas sobretudo dos adeptos das Caldas da Rainha, que adormeceram sabendo que no dia seguinte iam apoiar a sua equipa no Campo da Mata (onde o Benfica de Roger Schmidt só passou nos penáltis) e de manhã acordaram com a obrigação de rumar a Torres Vedras. É ofensivo.

Muita coisa falhou neste processo, mas fundamentalmente falhou o respeito pelas pessoas e pelos valores que fizeram da Taça de Portugal a prova rainha. É uma nova era em que vivemos, mas não vai deixar saudades.

Elevador da bola

A subir

Sidny Cabral: Está prestes a ser reforço do Benfica com apenas meia época de amostra na Amadora. É um ambidestro que lembra outro lateral que o Benfica contratou em Portugal (Nélson, ao Boavista), um 2 em 1 que muito o valoriza. E marca livres como poucos.

Estacionado

João Pinheiro: Esteve no olho do furacão pelo que se passou no Santa Clara-Sporting e por isso entrou pressionado no Alverca-FC Porto, mas mostrou personalidade no Ribatejo com uma exibição ao seu nível - sim, os árbitros também merecem ser elogiados.

A descer

Pedro Proença: A Federação Portuguesa de Futebol, do qual é o rosto mais visível, não saiu bem neste episódio do Caldas-SC Braga. Imaginemos que em vez dos minhotos seria qualquer um dos três grandes o beneficiado: por quantos anos iríamos falar disto?