Akwá, herói de Kigali, colocou Angola no Mundial há 20 anos
- Akwá, vinte anos depois que memórias guarda desse momento?
- As melhores... Foi um momento em que demos um presente maior ao povo angolano: a qualificação para o Campeonato do Mundo, o primeiro e o único até aqui. Sabíamos que seria complicado, porque, apesar do Ruanda já não ter hipótese de se qualificar, a Nigéria estava por trás e iria ao Mundial se não ganhássemos. Entrámos no estádio com uma revista inacreditável, tivemos de passar pelo raio-x em cuecas... Mas estávamos mentalmente preparados para todo o tipo de intimidação. Tínhamos de ganhar, Jorge, não tinha como. Era ganhar ou ganhar. Queríamos tanto, mas tanto. Na parte final chegou aquele cruzamento do Zé Kalanga, perfeito... perfeito – podia tentar mais cem vezes, nenhum sairia tão perfeito – vi a bola vir na minha direção e felizmente cabeceei para golo...
- ... e depois uma explosão de emoções...
- Lembro ter chorado de emoção logo após o golo, mas tive o Flávio Amado a bater-me nas costas e dizer «vamos, ainda há jogo para jogar»... Estava emocionado, mas quando ouvi o apito do árbitro para reatar o jogo caiu-me a ficha e consegui concentrar-me.. No final, as imagens de todos abraçados, a chorar, e a pensar na alegria do povo angolano a quem tínhamos dado o maior presente, três anos depois dos acordos de paz de 2002. E lembro o regresso a Luanda. Pela primeira vez, o Presidente José Eduardo dos Santos no aeroporto para receber uma delegação desportiva... A passeata pelas ruas de Luanda. Toda aquela loucura... Como esquecer? Nunca...
- Confirma o que desabafou comigo há uns anos: recebe mais telefonemas e mensagens no 8 de outubro do que no dia do aniversário?
- [risos] Confirmo... E acho que vai ser assim até Angola voltar a um novo mundial... Mas atenção: eu gosto que se lembrem desse golo, desse momento de felicidade para mim, para a Seleção, para Angola.
- Tive a felicidade de ter estado em Luanda, ao serviço de A BOLA, na enorme festa de despedida da seleção para a Alemanha, palco do Mundial... Que memórias guarda desse Mundial?
- Desde logo a estreia com o Portugal, onde sentimos uma mistura de emoções. Com pessoas nas bancadas a cantar os dois hinos, incrível... Acusámos os primeiros minutos, o Figo fabrica o golo para o Pauleta marcar, mas serenámos e demos muita luta, em vários momentos formos para cima de Portugal. Pena não termos conseguido marcar. Depois empatámos com o Máxico e tinhamos de vencer o Irão. Até estivemos a ganhar 1-0, mas o Irão empatou... Ficámos em terceiro lugar, perto da qualificação, mas fica uma história bonita, honrámos o Angola... Só o facto de estar numa competição como aquela é um motivo para recordações impagáveis. A realização de um sonho de criança...
- Por momentos, cheguei a pensar que a melhor homenagem que a seleção de 2006 poderia receber era o Mundial de 2026, 20 anos depois, voltar a ter Angola...
- ... depois do nosso brilhante apuramento para o CAN de 2025, acreditei muito no apuramento para o Mundial. Mas as coisas não foram iguais... Neste tipo de apuramento é importante ganhar todos os jogos em casa. E isso infelizmente não aconteceu. A derrota com Cabo Verde acabou por ter um peso grande.
- O que precisa Angola de fazer para voltar a estar num Mundial?
- Formação, formação e formação. Se nós olharmos só para o topo, esquecemos a base. E sem base não há topo sólido, não há futuro. E nem é preciso inventar nada. Basta olhar para o modelo português e adaptar o que houver para adaptar à nossa realidade. Se isso acontecer, a capacidade de renovação das gerações é mais fácil, o crescimento sustentado e o sucesso fica muito mais próximo. Em Angola existe até um bom exemplo: a vitória no CAN sub-20 de 2001, no Egito, um projeto pensado e que teve por ponto alto esse Mundial de 2006. Não foi por meo acaso que fomos ao Mundial... As coisas começaram a ser preparadas uns anos antes. Não basta só dizer que somos melhores do que Cabo Verde, que somos melhroes do que a Líbia, que o Lesoto... Esqueçam... Os outros também trabalham, fazem pela vida. Se trabalharmos bem a formação e consegurimos exportar cada vez mais jogadores para os melhores campeonatos, então temos a qualidade inata para nos batermos com as melhores seleções africanas.
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