Se João Pereira cair Varandas perde a face
Com Frederico Varandas na presidência do Sporting, João Pereira (só) pode estar descansado. «Tenho muito poucas dúvidas de que João Pereira estará dentro de quatro ou cinco anos num dos clubes mais poderosos da Europa», proclamou o presidente leonino, a 11 de novembro, na apresentação do sucessor de Ruben Amorim, há menos de um mês, portanto, sinal de que o novo técnico terá margem de manobra e tempo para voltar a fazer o leão rugir.
Alguém acredita que, após palavras tão claras e elogiosas, Varandas fosse dar o dito por não dito e prescindir um treinador que «conquistou a estrutura do futebol e da Academia pela competência e liderança reveladas»? O homem, recorde-se, que estava destinado a assumir o leme no final da temporada caso Amorim tivesse resistido ao canto de sereia oriundo de Manchester.
Também os adeptos ratificaram a escolha de João Pereira, mas os votos de confiança depositados nas bancadas, por vezes, correm o risco de ser mais voláteis do que aqueles que são decretados nos gabinetes a antecipar chicotadas psicológicas que se adivinham. Das tarjas de apoio em Alvalade aos insultos e petardos lançados à chegada do autocarro proveniente de Moreira de Cónegos, bastaram três derrotas seguidas.
Justiça seja feita a Frederico Varandas, que mostrou no passado, em contexto desportivo e financeiro bastante mais adverso, ser capaz de lidar com a contestação. A forma como domou as claques – é preciso lembrar que o clube estava partido ao meio quando venceu as eleições a João Benedito, que, fruto do sistema eleitoral do Sporting, até teve mais votantes do que o atual líder para o qual perdeu nas urnas em número de votos expressos – é disso exemplo paradigmático.
João Pereira tem, pois, a segurança de que Varandas nunca puxará o tapete que lhe estendeu, logo numa altura em que havia cofres recheados para procurar um tipo de treinador com mais estatuto e experiência, português ou estrangeiro, seguramente entusiasmado com a carreira dos verdes e brancos tanto na Liga como na Champions.
Preferiu Varandas colocar a fasquia altíssima e apostar num jovem de 40 anos, sem a tarimba dos grandes palcos, embora, conforme destacou na já citada apresentação, seja alguém com «caráter, competência, entendimento do jogo, coragem e muita confiança». Se em março de 2020 Amorim questionou «e se corre bem?», não creio que o discurso confiante em redor de João Pereira possa justificar agora mudança de agulha aos primeiros reveses sem que a tão elogiada estrutura leonina – segurou Amorim em cenários igualmente complicados, dois quartos lugares, adeus à Taça de Portugal com o Varzim… – perdesse a face.
Na reação à goleada sofrida aos pés do Arsenal, João Pereira, (ainda) longe de ser um comunicador sequer razoável, aludiu a «erro de casting» quando talvez quisesse dizer acidente de percurso para qualificar a noite negra. Mas a expressão, afinal, parecia adequar-se a ele próprio.
«Agora começa uma nova aventura com o novo mister e estamos prontos para lutar!», assim terminou Hjulmand mensagem nas redes sociais selado triunfo em Braga na despedida de Ruben Amorim. O dinamarquês, capitão de equipa, depois do balde de água fria na receção ao Santa Clara, garantiu que a «mensagem [de João Pereira] é muito clara da parte dele e o plano de jogo também» e que as «verdadeiras equipas veem-se quando as coisas começam a ficar difíceis». Ora, é aqui que os jogadores estão obrigados a dar um, dois ou três passos em frente, mesmo que João Pereira já tenha dito que não pode imitar algo que não consegue replicar, referindo-se à maneira de jogar do antecessor.
Custa a crer, diga-se, que o Sporting optasse por um timoneiro que confessa não dispor do livro de instruções para manter em funcionamento uma máquina – das mais fiáveis e brilhantes da história do clube – tão bem oleada.
Culpados da crise? Ruben Amorim porque simplesmente deixou cair o microfone e bateu com a porta, Frederico Varandas por julgar, com tiques de sobranceria, que João Pereira pegaria de estaca, os jogadores por estarem a mostrar falta de estaleca e… Diogo Dalot. Sim, o defesa do Manchester United que falhou golo cantado contra o West Ham e precipitou a saída de Erik ten Hag do Teatro dos Sonhos, início de um pesadelo em Alvalade…