Liberdade e consciência!...

OPINIÃO27.04.201904:00

Fez anteontem 45 anos que, ao som de Grândola Vila Morena do Zeca Afonso e Depois do Adeus, de Paulo Carvalho, o Movimento das Forças Amadas, que fica na história como o MFA, saltou para a rua para restituir a liberdade ao BOM POVO PORTUGUÊS, como diria o General António Spínola, designado então como Presidente da Junta de Salvação Nacional!


Recordo que do programa do Movimento das Forças Armadas Portuguesas, e entre as «medidas imediatas», se encontrava «a abolição da censura e exame prévio»; e, no que respeitava a medidas a curto prazo, o Governo Provisório obrigava-se a promover imediatamente «a liberdade de expressão e pensamento sob qualquer forma». Esquecer isto, é esquecer o 25 de Abril, é desconhecer o que foi o 25 de Abril e o seu significado.


Mas, para os mais esquecidos, os que eram muito pequenos ou ainda nem sequer tinham nascido, e para os que na sua arrogante estupidez e incompetência ignoram o que é a liberdade de expressão e pensamento, isto é, os masters voice, cartilheiros e afins, lembro-lhes o artigo 37.º da Constituição da República Portuguesa «sobre o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações». E diz mais: «o exercício desses direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura».
E mesmo aos analfabetos, cretinos e ofícios correlativos faço lembrar que a ignorância da lei, designadamente, da constitucional, não justifica a falta do seu cumprimento.


Ter ideias, ter opiniões e pensamentos, exprimi-las é o conteúdo da liberdade de expressão. A liberdade de expressão engloba também os meios de expressão dos mais variados. Mas a liberdade de expressão também engloba o silêncio, o não dizer nada ou não falar ou não responder, nem ser obrigado a partilhar ou defender opiniões de outros ou de outrem, em nome de um interesse que alguém diz ser o interesse nacional, partidário ou clubístico.


É aliás dos iluminados e iluminadas, que entendem ser deles a legitimidade para definir qual é esse interesse nacional, partidário, clubístico ou de qualquer outra natureza, que nascem as censuras que a breve trecho desembocam nas ditaduras. Todas começam pelo abafar da voz, da expressão e do pensamento e rapidamente atingem a eliminação física como forma de controlar a liberdade de expressão e pensamento.
De facto, foi o próprio António de Oliveira Salazar a dizer que «os homens, os grupos, as classes vêem, observam as coisas, estudam os acontecimentos à luz do seu interesse. Só uma entidade, por dever e posição, tudo tem de ver à luz do interesse de todos», como fundamento das limitações à liberdade de expressão e informação, ou seja, da censura prévia. Três anos antes de eu nascer - 1944 - nasceu o um organismo de censura na dependência do Secretariado Nacional de Informação (SNI) que por sua vez estava sob a alçada do Presidente do Conselho, António de Oliveira Salazar.


Algumas das funções do Secretariado Nacional de Informação são hoje também as funções dos gabinetes de comunicação dos governantes, dos dirigentes politico-partidários, dos clubes e das suas direcções e até das empresas públicas e privadas. Começam por influenciar, orientar e controlar a informação e a expressão, sempre com base na definição do que é o interesse geral por eles definido, ostracizando e perseguindo quem acha que o interesse colectivo, do país ou da instituição é outro!
A Constituição também garante a liberdade de imprensa - artigo 38.º - o que implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores, bem como a intervenção dos jornalistas, não dos colaboradores, na orientação editorial dos respectivos órgãos de comunicação social, salvo quando tiverem natureza doutrinária ou confessional. Julgo que é na natureza doutrinaria ou confessional dos órgãos ou meios de comunicação dos clubes que se procura fundamentar o pensamento único a divulgar pelos súbditos e cartilheiros. Tal como a União Nacional e a Acção Nacional Popular- e só elas - defendiam o interesse nacional.


A liberdade de expressão implica também a possibilidade de confronto entre as diversas correntes de opinião. E é precisamente desse confronto que os ditadores e os aspirantes a tal não gostam: do confronto público. Sempre com o argumento estafado de que os assuntos internos se não tratam na praça pública, mas, no caso dos clubes, nas assembleias gerais. Como se nas assembleias gerais se tratassem de assuntos de uma forma séria e fosse possível o confronto de ideias, e não de quem berra mais alto!...
Mas, o que é mais interessante, é o cinismo e hipocrisia com que os responsáveis dizem que os assuntos internos devem ser debatidos internamente, depois desses assuntos virem ao espaço público, de uma forma cirúrgica ou descarada, por iniciativa desses mesmos responsáveis.


O meu tempo acabou em tanta coisa, que não chegava uma edição inteira deste jornal para retratar, exemplificar e comentar. Mas há coisas que há muito tempo acabaram e que resumem muitas delas: já há muitos, muitos anos mesmo, que deixei de acreditar no Pai Natal; e nunca achei muita piada à história da Carochinha!...


Por outro lado, fiz serviço militar entre Janeiro de 1971 e 17 de Abril de 1974, como Oficial Miliciano com a especialidade de Acção Psicológica. Fui bom aluno e fiz um estágio muito interessante e proveitoso para o resto da minha vida na 2.ª Repartição do Estado - Maior do Exército, onde aliás conheci uma cabeça brilhante, superiormente inteligente e sportinguista - o General Firmino Miguel, já falecido infelizmente. Aprendi o que era a acção psicológica e a guerra psicológica; o que era a informação e a contra-informação; o que são acções e operações psicológicas; o que são manobras de diversão e de distracção para não falar no essencial. Também acabou esse tempo, mas alguma coisa me deixou, que me ajuda a compreender certos comportamentos e atitudes.


O que não acabou, e só acabará com a morte ou a demência, são os valores e princípios em que fui educado e com os quais cresci e me fiz homem. Como não acabaram ainda as minhas convicções, ainda que por vezes abaladas, na liberdade e na democracia. Na defesa das minhas convicções e ideais falarei, não ‘até que voz me doa’, mas sempre que a minha consciência imponha!...


Os ideais de Abril, não são para viver apenas no dia 25, como está aliás bem expresso no poema de Manuel Alegre, cantado por Adriano Correia de Oliveira: