Manifestação travou corredores a 56 quilómetros da meta em Madrid. IMAGO

Volta a Espanha debaixo de fogo

UCI junta-se a Israel e condena apoio do primeiro ministro espanhol às manifestações pró-Palestina que cancelaram a última etapa e o pódio que consagrou Jonas Vingegaard, João Almeida e Thomas Pidcock. Diretor da prova lamenta imagem que correu mundo

O desfecho da Vuelta deixou o mundo do ciclismo a ferro e fogo e as posições nada têm a ver com o resultado final que consagrou o dinamarquês Jonas Vingegaard (Visma Lease a Bike) como vencedor e em nada beliscam o segundo lugar de João Almeida (UAE Emirates), que o melhor resultado de sempre de um português numa grande Volta, alcançado por Joaquim Agostinho,vice na Volta a Espanha, em 1974.

O cancelamento da 21.ª etapa da Volta a Espanha devido à manifestação de mais de 100 mil pessoas pró-Palestina que invadiram o circuito final e travaram o pelotão a 56 quilómetros da meta fizeram estalar o verniz. O protesto foi contra a presença da equipa Israel-Premier Tech — de nada valeu o dispositivo de segurança na capital espanhola, o maior de sempre num evento desportivo e o maior desde a cimeira da NATO, em 2022 — e dividiu opiniões.

O pódio da Vuelta 2025 num parque de estacionamento de um hotel em Madrid. Foto Visma Lease a Bike

Os corredores acabaram num parque de estacionamento de um hotel em Madrid, em cima de geleiras a fingir os degraus do pódio e Vingegaard a ouvir o hino dinamarquês saído de uma coluna a pilhas.

«Lamentamos que o primeiro-ministro espanhol e o seu governo tenham apoiado ações tomadas durante uma competição desportiva que poderiam prejudicar o seu bom desenrolar e, em alguns casos, tenham manifestado a sua admiração pelos protestos», disse ontem a UCI, entidade que rege o ciclismo mundial, em comunicado, depois dos caos que se verificou em Madrid. «Esta posição está em total contradição com os valores olímpicos, respeito mútuo e paz», acrescenta. Na mesma mensagem, a UCI admite ainda que tem «dúvidas sobre a capacidade de Espanha para acolher grandes eventos desportivos internacionais».

Indiferente às criticas, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, manteve-se firme nas suas declarações, reafirmando admiração pelos manifestantes: «Sentimos imenso respeito e profunda admiração por uma sociedade civil espanhola que se mobiliza contra a injustiça e defende as suas convicções pacificamente».

A Vuelta ficou, assim, marcada por constantes alterações ao percurso, uma etapa cancelada, outra sem vencedor, e uma outra com uma meta improvisada, culminando nos incidentes de domingo.

Imperdoável, segundo o diretor da prova. «Lamento e condeno o que ocorreu na última etapa da Volta a Espanha. As imagens falam por si. É totalmente inaceitável aquilo que aconteceu, especialmente no circuito. Não se retira nada de bom disso. Lamento a imagem que passámos, não se pode repetir», defendeu Javier Guillén.

«Falámos com a UCI para analisar os acontecimentos, pedimos que tomassem uma posição mantiveram a Israel-Premier Tech em prova. Guiámo-nos pelos seus regulamentos, mantivemo-nos neutros. Informámos que havia um problema», argumentou, recordando que a equipa foi convidada a abandonar a prova, mas recusou.

Já em Lisboa, no dia em que a Volta a Portugal terminou, alguns manifestantes juntaram-se na meta para protestar contra a presença da Israel Premier Tech Academy, equipa de formação que venceu quatro etapas, mas sem causar distúrbios de maior.

Israel tem em curso uma ofensiva na Faixa de Gaza que causou mais de 64.600 mortos no território governado pelo Hamas desde 2007, após um ataque deste grupo no sul de Israel, a 7 de outubro de 2023, em que fez 251 reféns e mais de 1200 mortos.