Pedro Gonçalves rendido à Tanzânia: «Cheguei aqui de madrugada e fiquei fascinado»
- O que o levou a aceitar o convite do Young Africans?
- Ser um grande desafio. Um clube muito grande, que representa uma legião de fãs fervorosos que acompanham minuciosamente todas as atividades da equipa. E um país como a Tanzânia, que sempre me despertou a atenção, com uma grande comunidade árabe e indiana, mas muitas outras influências que, juntas, conferem uma identidade peculiar ao povo. Um país muito comercial, muito aberto ao exterior e seguro.
- Como classifica a paixão dos adeptos do Young Africans?
- Incrível. Imensa. Que se vê ainda mais nos jogos internacionais e nos dérbis. O Estádio Nacional enche sempre, com 60 mil adeptos em grande festa. Todo o ambiente que criam e emprestam ao jogo é absolutamente fantástico.
- É um clube que oferece condições para fazer um bom trabalho?
- É um clube gigante e que está a crescer em termos de projeto. Um clube em crescimento ao nível das condições de trabalho. Um clube que ocupa a posição 12 no ranking da CAF. Que acabou de garantir lugar entre os 16 melhores na fase de grupos da Liga dos Campeões. E um clube que é atualmente tetracampeão nacional e procura o penta... Temos condições para evoluir. O clube tem aquilo que designa de um centro de estágio, onde existe um condomínio com moradias e valências para treino. Mas que podem ser melhoradas. E uma das minhas missões é contribuir para isso mesmo.
- Do pouco que já viu, como classifica a qualidade média do futebol na Tanzânia?
- Ao nível de clubes, tem evoluído substancialmente. Basta dizer que é um dos quatro países, em 54, que apurou quatro equipas para a fase de grupos da Liga dos Campeões e para a fase de grupos da Taça Confederação, após duas eliminatórias. Isso representa aquilo que é a evolução do campeonato. Bastante interessante também a forma como se faz o acompanhamento do campeonato, com todos os jogos televisionados e muita promoção e mediatismo. Tem muitos internacionais, consegue pagar razoável e atrair talento. Tem tudo para progredir.
- Quais as primeiras impressões de Dar es Salaam, a maior cidade da Tanzânia, a quinta maior de África, com 7 milhões de habitantes?
- Uma cidade a fervilhar por todo o lado, com muitas obras e investimentos em curso. Um crescimento visível que o país está a ter com o futebol a acompanhar a nível de infraestruturas. É uma cidade cosmopolita, com muitas culturas e religiões que vivem pacificamente. É uma cidade segura, onde todos se respeitam. Cheguei aqui às três e meia da madrugada e fiquei fascinado por, a essa hora, ver tanta gente na rua, muitos deles turistas. A Tanzânia é um país que gosta e sabe receber. Tem bom clima, uma costa belissíma, zonas paradisíacas....
«Serei sempre angolano»
- Há cerca de um mês foi demitido pela Federação Angolana de Futebol do cargo de selecionador. Era até o que estava há mais tempo no cargo em toda a África. Ficou surpreendido por ter acontecido a três meses da CAN?
- Evidentemente que me custou imenso. Pela relação que tenho com Angola. Não tenho como dizer o contrário. Até me emociono ao pensar nisso... Sou português, mas sou também angolano. Foram dez anos a lidar de perto com o povo, seis deles na seleção principal. Fizemos juntos um percurso tremendo... Subimos e muito a qualidade da equipa. Subimos dezenas de lugares no ranking da FIFA. Batemos recordes. Hoje Angola é uma seleção. Hoje bate-se com qualquer seleção africana. Hoje tem jogadores que cresceram muito nos últimos anos. Hoje, há cada vez mais jogadores, em especial na diáspora, a sentir orgulho de representar Angola. Hoje há cada vez mais jogadores nas melhores ligas e equipas. O percurso ainda não está terminado, dentro de dois a três anos. Angola vai mesmo ser uma seleção de topo em África. Foi um orgulho ter feito este caminho com todos, fica a ligação a Angola, às suas gentes e ficam todos os amigos que fui fazendo nesta viagem.
- Na apresentação do novo selecionador, o presidente da Federação, Alves Simões, reconheceu que há muito andava a ‘namorar’ o francês Patrice Beaumelle. Sentiu-se melindrado?
- Eu prefiro olhar para o meu percurso em Angola pela dimensão e pela abrangência e não pelo momento final. Até porque esta Direção foi eleita em dezembro e eu coloquei o lugar à disposição do novo presidente se ele defendesse um outro rosto para o projeto desportivo. Naturalmente há coisas que custa ouvir, mas o tempo é de me mostrar grato e orgulhoso. Muita gente ficou surpreendida, recebi muitas chamadas até de outros selecionadores, muita gente se solidarizou e recebi imensos convites para trabalhar. Só não recebi convites da Oceania... Dei o melhor, sei o legado que fica, felicidades a Angola. Por me sentir angolano, a felicidade de Angola é a minha felicidade. Virei a página, agora estou a duzentos por cento no Young Africans.