Rodrigo Mora  - Foto: Catarina Morais/Kapta+
8. Rodrigo Mora

O homem não mordeu o cão porque o dono está de baixa

Diz-se que notícia é quando o homem morde o cão, e foi essa a inspiração de Nuno Markl para o título de um dos maiores clássicos da história da rádio portuguesa. Com Markl de baixa - rápidas melhoras – no Dragão tudo decorreu segundo a normalidade, o homem não mordeu o cão, e o Dragão lançou labaredas sobre o Sintrense, do quarto escalão...

Não terá sido o mais entusiasmante dos jogos da temporada, mas pelo menos houve uma atitude séria das duas equipas, que cedo disseram ao que iam: o FC Porto queria carimbar, sem correr quaisquer riscos, a passagem à próxima fase da Taça de Portugal, mesmo que para isso nunca colocasse o pé no acelerador, como aqueles fundistas que não mudam de passada, ficando à espera que o desgaste dos adversários seja insustentável; já o Sintrense entrou no Dragão com a sensação de dever cumprido. Depois de ter eliminado o Vizela, da Liga 2, e o Rio Ave, do escalão principal, tinha a certeza de já ter deixado a sua marca nesta edição da prova rainha do nosso calendário, e apenas procurou garantir que não saía do embate com o FC Porto vergado a uma goleada humilhante.

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Portistas e sintrenses atingiram os objetivos a que se propuseram, os primeiros tiveram uma noite descansada, e os segundos podem dizer que caíram de pé. Mas, na verdade, o embate entre estes dois pesos tão díspares teve momentos de tédio e previsibilidade, que justificaram alguns bocejos captados pelas câmaras indiscretas da televisão. 

Numa semana em que Nuno Markl, um dos ícones da rádio portuguesa, autor de «O Homem Que Mordeu O Cão», teve um AVC do qual está a recuperar, no Dragão não houve notícia (que só existe quando é o homem a morder o cão), porque, com a maior das naturalidades, foi o cão que mordeu o homem, respeitando-se a ordem natural das coisas. 

UM SÓ SENTIDO 

A equipa de David Maside, filho de Rui, uma das unhas do leão contratadas para o Sporting por Jorge Gonçalves no final da década de oitenta do século passado, apresentou-se bem fechada, com um 5x3x2 que rapidamente passava a 5x4x1, consoante as necessidades, e abdicou de qualquer ambição atacante, procurando sair com danos mínimos do Dragão. Foi por isso que a primeira parte acabou com dez a zero em cantos e 78 por cento de posse de bola para o FC Porto.

Fez mal o Sintrense ao optar por esta estratégia? Não creio, porque era a única que podia ter linha direta com a Senhora de Fátima e dar corpo a um milagre. A metade inicial acabou com 1-0 para o FC Porto, ou seja, qualquer erro dos dragões ou uma bola parada podiam colocar a equipa de Sintra de volta à discussão do resultado. Qualquer outra abordagem ao jogo traria como consequência, tratando-se do líder da Liga e do nono classificado da sua série na quarta divisão, uma noite de bar aberto para a equipa de Farioli. 

E o que fez o técnico italiano? Bem, a meu ver, transformou este jogo num treino, deu ritmo a muitos jogadores com que conta e minutos a outros, como De Jong, que regressava de lesão. Não correu riscos, teve a eliminatória sempre no bolso e ficou apto a encarar os desafios que se seguem com mais unidades operacionais.

RODRIGO MORA 

Diz-se que Francesco Farioli está a ajudar Rodrigo Mora a crescer, fazendo-o entrar gradualmente na equipa. Talvez. E talvez até possa ter razão. Porém, aquilo que se vê é que Mora está mais do que preparado para ser titular e fazer a diferença num conjunto que por vezes mostra défice de criatividade.

Na partida com o Sintrense, Borja Sainz foi expedito no pontapé que deu o 1-0 (25); Deniz Gul mostrou codícia e sentido de golo na recarga que valeu o 2-0 (70), mas foi Mora a levantar o estádio e a valer a ida ao Dragão quando, aos 80 minutos, rematou em arco de pé esquerdo, fazendo a bola anichar-se no fundo das redes do Sintrense, após uma receção orientada perfeita, que tornou todo o movimento, além de harmonioso, aparentemente simples.

Farioli acompanha diariamente os progressos de Mora e terá, na sua posse, todos os elementos da equação. Porém, de fora, mete-se pelos olhos dentro que é o jovem talento quem faz a diferença, torna o difícil em fácil, e cria condições para o futebol portista fluir com outra suavidade e encanto, sem perder eficácia. 

No mais, este jogo, na ótica do dragão, serviu para se constatar a polivalência de Pablo Rosário, a seriedade e profissionalismo de Varela e Eustáquio, as dificuldades de Samu quando tem pouco espaço, e a melhoria e maior confiança de Deniz Gul. Tudo somado, não terá sido pouco e, embora o FC Porto-Sintrense não passe à história, acabou por ser interessante para os dois clubes.