Idadismo e racismo
JORGE JESUS completa hoje 69 anos. É uma idade bonita. Sem ponta de ironia. Querer continuar a treinar e continuar a ser desejado por clubes ou Seleções, mesmo em campeonatos razoavelmente periféricos como o turco e o saudita, é saudável. Significa que ainda não se perdeu entusiasmo para se manter ativo e, sobretudo, que há um dirigente algures no Mundo que confia no trabalho de alguém que se aproxima dos 70 anos, idade em que muita gente é olhada de lado. E não deveria ser. O talento não tem idade. Tal como a capacidade de trabalho. Jorge Jesus, aos 69, prova-o. Parece que tem 50. Ou, no máximo, 60. Não é caso único. Há, aliás, casos quase únicos que, por o serem, se tornam igualmente paradoxais. Falo de um treinador que conheço bem: Vítor Manuel. Só quem não o conhece pode acreditar que, por ter passado os 70, está ultrapassado. Não está. Tal como Béla Guttmann quando chegou ao FC Porto com 74, Mário Wilson quando treinou o Alverca com 69, Jesualdo Ferreira quando deixou o Boavista com 75 ou Carlos Queiroz que, aos 70, está na Seleção do Catar para lavar e durar. Ou Fernando Santos que, aos 68, está na Polónia e é, segundo parece, desejado na Arábia Saudita. José Saramago (Prémio Nobel da Literatura com 78 e a publicar livros aos 87), Manoel Oliveira (a filmar, ativamente, com mais de 100), Pinto da Costa (vai nos 85 e, para o bem e para o mal, está igual), ou o agora falecido Tony Bennett (a cantar já depois dos 80) são casos de outras áreas que contrariam o famoso idadismo. Porém, o idadismo existe e devemos contrariá-lo. O que conta neste Mundo tão estupidamente competitivo é o talento. Seja para treinar, escrever, pintar, cantar, filmar ou outro verbo qualquer. Há quem esteja quase caduco com 30 anos e quem esteja lucidíssimo com quase 80. Se duvidam, avanço-vos com um nome: António Simões da Costa. Esse mesmo, o Magriço de 1966.
TAL como acredito que o idadismo existe e deve ser contrariado firmemente, igualmente acredito que o racismo existe e deve ser ainda mais firmemente contrariado por todos nós. Haverá racismo em Portugal: sim. Encapotado? Talvez. Mas que há, há. Haverá racismo no futebol português? Se existe na sociedade portuguesa, existirá igualmente no futebol. Mas racismo na hora de escolher jogadores já me parece menos crível. Haverá dirigentes ou treinadores que, na hora de contratar um jogador ou de o colocar no onze, tenha em atenção a cor da pele? Não acredito, mas nunca passei por um balneário de futebol ou pelo dirigismo de um clube. Desde o início deste Século, os diversos selecionadores nacionais (António Oliveira, Agostinho Oliveira, Luiz Felipe Scolari, Carlos Queiroz, Paulo Bento, Fernando Santos e Roberto Martínez) estrearam 156 jogadores: 37 de raça negra e 119 de raça branca. Ou seja, 23 por cento de negros e 77 por cento de brancos. Vejamos os treinadores que passaram, no mesmo período, pela principal Liga portuguesa: 220. Brancos: 206. Negros: 14. Ou seja, 6 por cento de negros e 94 por cento de brancos. A percentagem de negros baixa imenso quando se passa da relva para o banco. Significa que há menos racismo na relva do que no banco? Tenho dúvidas. Porém, como não me engano tão raramente como o outro senhor, além de ter dúvidas, dou o benefício da dúvida aos defensores de que existe racismo em Portugal relativamente a treinadores. Aliás, a existir, não é apenas em Portugal. Sê-lo-á em quase todo o Mundo. O que não só é pena, como é degradante.