Emílio, o Almeida foi 2.º!
Na última semana lembrei-me várias vezes do saudoso Fernando Emílio, em como ficaria feliz de ter visto João Almeida subir ao segundo lugar da Volta a Espanha, igualando o melhor ciclista português, Joaquim Agostinho, que fez o mesmo em 1974.
Mas durou pouco esta imagem do seu sorriso orgulhoso, dos elogios rasgados a falar alto e gesticular que lhe deixaria em todas as capelinhas por onde passasse. Voltei a ver aquele que exibia sempre que um corredor nacional brilhava fosse na Volta ao coreto, fosse numa prova de estatuto mundial.
Rapidamente me ocorreu o chorrilho de palavrões, alguns incompreensíveis, que o mais conhecido jornalista especializado em ciclismo debitaria contra a equipa da Emirates e a sua estratégia. Ou a falta dela.
E foi a minha vez de sorrir, pensando que, provavelmente, teria razão naquela lista de argumentos que ia desfiar para justificar porque não discutiu João Almeida a vitória até ao fim: erros táticos, falta de trabalho de equipa, narcisismo de quem tem o melhor líder do Mundo, Tadej Pogacar, e até os ruidosos manifestantes pró- Palestina que atrapalharam chegadas, cancelaram etapas e encurtaram sonhos. O miúdo de A-dos-Francos, aos 27 anos, continua simples, e responderia como um cavalheiro, como fez na magnífica entrevista que deu a A BOLA há dois dias: «Embora às vezes não tivéssemos estado perfeitos, tive uma equipa muito boa ao meu lado, que me apoiou imenso e fez toda a diferença. Por isso, sim, devemos estar orgulhosos do que fizemos.»
E se ele o diz, quem somos nós, meros espectadores e adeptos para duvidar? Ainda se fosse o Fernando Emílio... Ele sim, poderia.
João Almeida é um dos novos heróis do desporto nacional, demasiado discreto dirão alguns. Nas redes sociais, os novos e velhos apaixonados da modalidade pedem-lhe garra e criticam a equipa. Tenho para mim que o corredor liga pouco ao que se diz por aí e faz bem.
João Almeida segue indiferente o seu trajeto e continua a perseguir o sonho de vencer uma grande Volta e tem boas razões para acreditar, depois da Vuelta, depois do terceiro lugar no Giro de Itália e do quarto no Tour de França. Nós também acreditamos, aqui na terra, e, tenho a certeza, que, lá em cima, Fernando Emílio ainda quer escrever essa crónica de uma grande vitória.