Dois pontas de lança foram um risco ganho
É verdade que já lá vão alguns dias, mas voltando atrás, confesso que foi uma absoluta surpresa a aposta inicial em Nice, no recém-aterrado Ivanovic.
O facto de se tratar da Liga dos Campeões, o jogo ser fora e, por isso, de dificuldade acrescida, inclinavam o meu palpite para uma única alteração, e forçada, de Akturkoglu por Schjelderup.
O facto de essa, para mim, improvável mudança obrigar a mudar o sistema tático habitual, ainda mais me fazia duvidar da estreia logo a titular do novo avançado do Benfica. A verdade é que as opções são sempre boas quando resultam, o mesmo valendo para as substituições.
Foi, felizmente, o caso. Tentando perceber a decisão de eleger Ivanovic para o início de tão importante jornada, podemos imaginar alguns argumentos.
O avançado croata, também com a preparação mais adiantada do que os novos companheiros, ter-se-á integrado bem nos poucos treinos realizados.
Por outro lado, o facto de o Nice utilizar só dois médios, contra Enzo e Ríos, — e ainda reforçados por Aursnes —, permitia prescindir de Barreiro, abrindo caminho a um segundo avançado, surpreendendo o adversário. Finalmente, outro argumento era o facto de o centro da defesa adversária estar debilitado por lesões — tanto que o Nice viria a acabar o jogo com três centrais sub-21.
A coragem de Lage foi, assim, premiada com uma exibição segura e com o novo avançado a ser protagonista principal de uma justificada vitória. Não podia ter corrido melhor. Provada que foi a compatibilidade dos dois atacantes, é bem possível que o Benfica repita a fórmula vencedora, regressando às tradicionais duplas ofensivas que fizeram história no clube.
Quanto aos restantes, os novos ganham pontos. Dedic manteve o seu fogo ofensivo, mas revelou-se mais sólido lá atrás. Ríos e Enzo coordenaram bem os seus avanços, como convém quando se joga com dois médios-centro.
Já os antigos, também estiveram em bom nível. Destaque para o importante golo de Florentino e a pouco vista eficácia do seu remate. Atrás, a defesa esteve bem, com António Silva a assumir, finalmente, a sua qualidade com bola. Na frente, Scheljderup confirma o seu talento. Menos agressivo no espaço do que Akturkoglu, mas tecnicamente superior e mais forte no ataque ao adversário direto.
NOTA: O comentário do jogo de ontem não pôde ser incluído nesta crónica, por limite de tempo. Espero que tenha correspondido às expectativas criadas em Nice.
Dupla de gémeos
Cardozo e Saviola são talvez o melhor e menos antigo exemplo de um casamento feliz, de uma dupla de contraste com êxito no Benfica. É claro que a diferença de estatura saltava à vista, mesmo não sendo isso o mais marcante das suas características complementares.
Saviola, rápido e móvel, difícil de controlar, surgia do nada para finalizar. Cardozo era a chamada referência do ataque, o farol que orienta os médios pelo apoio frontal que garantia.
Famoso ficou o seu pé esquerdo, especialmente potente, e a intuição goleadora, que até hoje se mantém (!). O jogo de cabeça não era o fator-mais de qualquer deles, tal como não é de Pavlidis e não parece ser de Ivanovic, a última dupla utilizada.
No caso atual, as características de grego e croata são quase gémeas. Podem coexistir, sim, muito pela disponibilidade defensiva que já sabíamos que Pavlidis tinha e que Ivanovic já mostrou ter. Jogar com dois na frente é bom e reforça a presença na área, mas obriga a esforço defensivo repartido ou, pelo menos, alternado quando não se tem a bola. Nesta fórmula, a equipa ganha mais peso atacante e dobra a arte finalizadora.
Abel
Abel aplaude. Por muito educados que possamos ser, o insulto sofrido é sempre de difícil digestão. Seja no estádio, no trânsito ou onde for, o melhor é cerrar os dentes e não ligar. No estádio ganha uma expressão diferente, porque são muitos contra um, num contexto de stress público, duro de aguentar. Abel Ferreira é só o mais titulado treinador da história do Palmeiras, mas nem isso o livra de ser desconsiderado da maneira mais vulgar. Não importa o que de bom se fez na semana passada. Irónico ou não, — ele disse que não —, reagir a uma provocação com palmas é tão difícil quanto revelador do estofo e grande capacidade de quem o consegue. Quem ofende quer uma reação e é frustrante não a ter. É a melhor resposta do visado.
Entretanto, sucedem-se as visitas pouco cordiais aos centros de treinos das equipas brasileiras. Tornou-se num triste passatempo.
Nacional
Fui tristemente surpreendido pela morte de Jorge Costa muito perto da entrega da última crónica, sem tempo para um obrigatório tributo. Mas nunca é tarde para valorizar quem merece e deixa saudades. Ao contrário, é um dever. Claro que o sofrimento que afeta a sua família não se imagina, bem como a falta que fará aos seus amigos mais próximos. Mas todos os que o conheceram perdem alguém que realmente valia a pena conhecer e será sempre bom lembrar e valorizar. Fomos colegas de seleção, ele no seu início e eu caminhando para o final da minha carreira de internacional. Vivia duas personagens opostas: em campo era rude, agressivo, temperamental. Socialmente, era bem-humorado, irónico, simples, um bondoso e afetivo amigo. O último de alguns grandes amigos que, entretanto, perdi prematuramente, em circunstâncias semelhantes. Abraço às famílias de todos eles.