Antigo presidente e agora candidato as eleições do próximo dia 25 de outubro explica porque vai novamente a votos

«Cortar com o passado? Pelo contrário, é para ter orgulho!»

Foi o presidente mais longevo da história do Benfica, entre 2003 e 2021. Em 18 anos nunca perdeu umas eleições e decidiu voltar a candidatar-se. Em entrevista a A BOLA, detalha os motivos que o levaram a tomar esta decisão

- Porque se deve votar em si nas eleições de dia 25?

- O Benfica precisa de um perfil de homem como eu, com a experiência que adquiriu ao longo deste tempo todo e com a vontade de ganhar que eu tenho. Perdeu-se muita coisa no Benfica, o clube não foi bem gerido nestes quatro anos, não teve a liderança que tinha de ter também. Nós temos um presidente a dizer que hoje está melhor quando recebeu o Benfica, quando tem o maior passivo, mais de 100 milhões de euros de dívida imediata… Hoje, quem entrar no Benfica, primeiro que entre, dentro dos corredores… o mesmo na Federação e na Liga, na relação com todos os clubes. Isto não vai ser nada fácil para o Benfica. Porque, além disso, hoje temos um FC Porto bastante forte, um Sporting bastante forte, temos um SC Braga a crescer. Mas eu tenho uma vantagem: quando chegar lá sei o que tenho de fazer de imediato.

- Concorda com este modelo de eleições, com segunda volta, algo que decorre da alteração de estatutos?

- Sou muito crítico em relação aos estatutos. Aquilo foi uma minoria de sócios do Benfica, foram cerca de 9 mil, que aprovaram os estatutos. Os outros sócios, a grande maioria, estava em casa. Ainda hoje ninguém sabe o que é que são os estatutos do Benfica. Acho que isto foi um fato à medida daquilo que eu chamo de tendência radical do Benfica. Fizeram tudo, artigo a artigo, com as alterações que eles pretendiam que fossem feitas. E viu-se bem na última Assembleia, como eles estão organizados e a força que têm neste momento. Aliás, eu penso que há de bloquear um dia o Benfica, a continuarem nesta vida que estamos, de certeza que o Benfica numa dada altura tornar-se-á ingerível. O Benfica vai ter um problema de entrar no que se passou aqui ao lado, com o Sporting, ou seja, constantemente mudar de Direção atrás de Direção.

- Quem são essas pessoas?

- O movimento Servir o Benfica. O candidato Noronha Lopes tem lá uma boa parte.

Como convencer os mais jovens
«Acho que a minha candidatura representa o povo do Benfica. O Benfica é do povo e esta candidatura efetivamente representa isso mesmo. Aliás, isso foi essa aproximação que tive junto dos sócios, o que também fez crescer muito a onda do Benfica. Se não fosse assim também não se estaria a reparar que ao longo destes últimos quatro anos houve um afastamento em geral da Direção do Benfica em relação aos sócios. Basta ver quantas casas o próprio presidente o Benfica visitou. Aliás, visitou mais agora as casas do Benfica do que em quatro anos. Com estes estatutos, parece que estamos a manietar os sócios, pois estão impedidos de fazer o voto eletrónico.»

- É por isso que um dia disse que há democracia há mais no Benfica?

- Quando eu digo democracia a mais tem a ver com a liderança que as pessoas têm de ter, comigo estes estatutos nunca iam adiante. Só foi possível recuperar o Benfica da maneira que foi, tão rápida, precisamente porque tinha alguém com uma liderança forte e tinha uma estrutura profissional a sério que funcionava como uma multinacional.

- Porque decidiu, nesta altura da sua vida, voltar a ser candidato à presidência do Benfica?

- Porque achava que o Benfica não estava no caminho correto. O Benfica paralisou praticamente durante quatro anos. Hoje o Benfica assenta em decisões de duas ou três pessoas e não há coordenação. Toda a gente sabe isso.

Sou contra a remuneração de toda a gente. Ser presidente ou ser dirigente do Benfica já é algo muito importante. Pelo menos viajam e veem jogos à borla

- Já disse que não será remunerado. Os seus vice-presidentes também não o serão, apesar de os novos estatutos o permitirem?

- Nunca fui remunerado do Benfica e não era agora que ia ser. O que me motiva a mim é tentar pôr o Benfica num caminho certo. Quando um profissional é demitido, o Benfica pode mandá-lo embora, já o dirigente não pode ser mandado embora. Está lá e, se houver qualquer situação de litigância, irá manter-se até o final do mandato e sempre a ganhar dinheiro. Ser presidente ou ser dirigente do Benfica já é algo muito importante. Pelo menos viajam à borda, estão a ver os jogos à borla, já têm muitas vantagens, não é? Eu soube que quando saí do Benfica começou logo a haver senhas de presença, aquilo foi tudo profundamente alterado.

- Não tem jogadores consigo nesta campanha. Porquê?

- Não quis. Os jogadores são património do Benfica, não são património de nenhum dirigente. Ainda ontem houve um que queria apoiar-me e disse: ‘pá, esquece’.  Tive dois bastante importantes.

Abolição do voto eletrónico
«Não sei porque é que as pessoas têm desconfiança no voto eletrónico. Eu estou muito à vontade, porque nunca interferi no voto eletrónico, nem sei como é que funciona. A única coisa que me diziam é que aquilo funcionava a cem por cento.»

- Se for eleito presidente, vai querer contar com esses dois e com outros ou não vai querer contar com antigos jogadores?

- Não. Porquê? Aquilo que eu passei, sabe… as pessoas quando não reconhecem os erros que cometeram… eu sei os erros que cometi.

- E que erros foram esses?

- Não quero mais nenhum jogador perto de mim.

- Mas refere-se a cargos como o de Rui Costa ou também nas funções que foram desempenhadas por Luisão, Simão Sabrosa, Nuno Gomes durante o seu tempo?

- Isto não interessa. A minha opinião sobre isso é a minha opinião, há outros que ainda querem [apoiar]. Eu não quero que os jogadores do Benfica sirvam de moeda de troca ou alguém que lhes diga ‘olha tu vais apoiar-me porque vais ser o ‘scout’ do Benfica em tal país.

Nuno Gomes
«Tenho uma relação ótima com o Nuno Gomes. Nada tenho contra nele, nem pensar! Agora, há critérios em termos de gerir. Eu sei o que é que eu sou, como é que eu sou exigente. Sou amigo do Nuno Gomes, tenho uma grande relação com o Nuno Gomes. Foi um dos jogadores que me marcou muito com a situação que nós tivemos, podia dizer-se de incumprimento com ele. Fui um dos que lhe disse ‘não te vás embora, o Pedro Mil Homens vem para aqui, tu vais crescer bastante com ele e isso será importante para a tua formação’. Ele entendeu que não, que tinha que sair, pronto, senão tinha ficado à mesma.»

- Qual será a sua primeira medida se vencer as eleições?

- Ter uma reunião com todo o pessoal e depois pôr o António Ferreira a tratar da manutenção de todas as infraestruturas do Benfica. Quanto ao resto, trataremos com tempo.

«Se eu não vencer, daqui a dois anos teremos eleições»

- Como é que lida quando o acusam de pensar muito em betão?

- Deviam passar as imagens aos mais novos do que era o Benfica no passado. Há muita gente que diz assim: ‘nós vamos cortar com o passado’. Pelo contrário, têm de ter orgulho no passado do Benfica. Porque nós viemos do zero. E essas pessoas que dizem querer cortar com o passado são aquelas que não são competentes para pensar no presente nem para o futuro do Benfica. Se calhar são aqueles que vão deixar o Benfica a pedir novamente, compreende? Neste momento está tudo pago, estádio e Seixal. O Benfica nisso é exemplo, todo património é do clube.

- Além de Domingos Soares Oliveira, quem mais poderá voltar?

- Não tenho autorização para falar nisso, o único de quem posso falar é o Domingos, que falou comigo e está disponível para voltar.

- Mas estamos a falar de mais que uma pessoa?

- Estamos a falar, se calhar, em cinco ou seis pessoas.

- Caso vença as eleições do próximo dia 25, o que é que ambiciona e sonha ganhar no Benfica?

- Temos de ter hegemonia em Portugal. Temos de ganhar, ganhar. Se porventura fizer o tetra, quero fazer outro mandato. Nessa altura eu terei 80 anos, mas também terei uma estrutura altamente profissionalizada que dá conta do trabalho todo, depois só precisa mais da minha presença noutros sentidos, motivação e isso tudo. Quando a linha está preparada, o comboio desliza suavemente.

«Título europeu no futebol feminino em três anos»

- Que visão tem para as modalidades?

-  Nos próximos quatro anos, há modalidades do Benfica que têm de ter, no mínimo, 30 a 40% da formação do Benfica, nos seus plantéis. O clube que melhor forma os melhores jogadores em Portugal é o Benfica, mas eles não ficam lá. Porquê? É uma pergunta à qual não sei responder. Mas há modalidades que, se calhar, vamos baixar o investimento, noutras em que vamos investir mais, como o caso do futebol feminino. Acho que o Benfica tem condições para ganhar um título europeu nos próximos três ou quatro anos.

Como reduzir custos
«Vamos ter uma reunião com pessoal. Mas não vou tomar nenhuma decisão agora, não sou presidente do Benfica. O Benfica tem um presidente que tomou decisões que se calhar não eram as mais lógicas. Nunca aumentou os funcionários e de um momento para o outro, porque há eleições, deu-lhes um prémio. Há pessoas que, logicamente, têm de sair.»

- Há alguma ideia dos outros candidatos que poderia caber no seu programa eleitoral?

-  Não vou fazer esse comentário, porque seria deselegante.

- Se não vencer, quem é que não gostava que ganhasse?

- Os sócios do Benfica é que vão decidir. O que o Benfica fizer, para mim está bem, apesar de eu dizer que, se eu não for o escolhido, daqui a dois anos vamos ter eleições, de certeza.

- Fez alguma promessa para voltar a ter bigode?

- Não. Mas no dia que eu fizer o penta, deixo crescer o bigode. Posso fazer um desconto com o tetra, não há problema.