Funeral de Jorge Costa. Foto: Catarina Morais/Kapta+

Como se pode no FC Porto lidar com a morte de Jorge Costa?: «Ignorar é o pior que se pode fazer»

Num momento muito delicado no universo azul e branco, a equipa de Farioli prepara a estreia na Liga, agendada para esta segunda-feira. «Cada atleta vai vivenciar o luto e a dor de forma distinta» e é importante «abrir espaço para partilha», sublinha Filipa Marques, mental coach e especialista em performance no desporto de alta competição

A notícia fez tremer o FC Porto e o futebol português. Jorge Costa morreu na terça-feira, aos 53 anos, e deixou um enorme vazio no universo azul e branco. Na antecâmara da estreia dos dragões na Liga, marcada para segunda-feira, diante do Vitória de Guimarães (20h45), a turma orientada por Francesco Farioli vai preparando a primeira jornada num momento delicado, atravessando uma enorme dor pela perda de uma das suas maiores referências.

Nesta fase, é importante «abrir espaço para partilha» e não se deve «ignorar o que se sente», sublinha Filipa Marques, mental coach e especialista em performance no desporto de alta competição, em conversa com A BOLA.

«Obviamente a perda de alguém como Jorge Costa acaba por não ser só uma ausência. É alguém que marcou não só uma geração, como marcou um clube. E ainda por cima representa e continuava a representar o clube, portanto, mesmo quem nunca jogou com ele sente o peso da sua história. Neste caso, perde-se um líder, perde-se um exemplo, perde-se um amigo. Um alicerce do FC Porto e do futebol português. Esta perda acaba por ser emocional e simbólica ao mesmo tempo. Relativamente à forma como o rendimento de um plantel pode ser afetado, as equipas vivem de alto rendimento, num ritmo que não permite, na maior parte das vezes, espaço para parar nem para sentir. Neste momento, e perante esta dor, é impossível que os jogadores não sintam e, portanto, considero que é fundamental que se permita vivenciar essa dor, tristeza, alguns hão de sentir raiva, frustração», explica Filipa Marques, que trabalha diariamente com atletas, treinadores e equipas técnicas.

Filipa Marques é mental coach e especialista em performance no desporto de alta competição, trabalhando diariamente com atletas, treinadores e equipas técnicas (Foto: D.R.)

Cada atleta, realça, «vai vivenciar a dor de uma forma distinta», porque o luto «é individual»: «Vai também depender da relação que cada um deles tinha com Jorge Costa, da história de vida de cada atleta e da sua maturidade emocional e psicológica. Acima de tudo, é importante que haja espaço por parte do clube para que cada um possa aceitar esta dor e integrá-la. Ignorar o que se sente é a pior coisa que se pode fazer porque isso sim vai impactar a performance do atleta. Dar espaço aos jogadores para falar e para partilhar como se sentem e até para homenagear a pessoa que foi o Jorge Costa.»

Apesar de o plantel portista ter muitas caras novas e vários estrangeiros, o peso de Jorge Costa no emblema azul e branco era incontornável, pelo que já todos tinham noção de tudo o que o Bicho representava: «Acredito que já todos os jogadores estejam familiarizados e saibam um bocadinho da história de quem foi o Jorge Costa no futebol português e no FC Porto. É importante mostrar quem foi Jorge Costa, o exemplo, uma pessoa exigente, a forma como liderava e toda a paixão que colocava em tudo aquilo que ele fazia e em cada jogo. Pode ser canalizado como um combustível emocional. Levar para o balneário a pergunta: ‘O que é que o Jorge Costa faria neste momento?’»

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Quanto ao papel do treinador neste momento, ou até mesmo do psicólogo do clube, é crucial «estar atento à individualidade de cada atleta»: «Da parte do treinador, seja do psicólogo do clube ou mental coach, deve permitir-se momentos de homenagem dentro do clube e até só mesmo com o plantel, ou seja, longe dos holofotes, longe das câmaras, permitir que isto aconteça, abrir espaço para partilha, para que cada um possa falar, porque às vezes o silêncio torna-se ensurdecedor. Alguns atletas vão sentir mais necessidade de falar e de partilhar, outros vão ficar mais recatados e mais a ouvir, mas estes momentos são fundamentais. Falar sobre o assunto, abrir espaço de partilha e isto pode ser mesmo uma reunião informal, um vídeo em que se mostre o Jorge Costa em jogo, em ação, e depois mostrar que a dor tem lugar, que homenagear uma pessoa como o Jorge Costa é importante. É fundamental estar atento à individualidade de cada atleta. Fazer isto em grupo e depois, quando percebemos que há um atleta que pode estar a lidar com o luto de uma forma mais difícil, é fundamental que o clube esteja preparado para isso. Acredito que o FC Porto permita algum apoio especializado, sempre que seja necessário.»

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