Manteigas lembra suspeitas de ilegalidades nas eleições que ditaram vitória de Vieira sobre Noronha Lopes

«Se vir ou tiver conhecimento de ilegalidades não vou aceitar os resultados»

João Diogo Manteigas, candidato à presidência do Benfica de 25 de outubro, pela Lista C, promete lutar por um ato eleitoral sem mácula; 10 perguntas exclusivas na reta final da maratona

— Em Portugal, na política ou no desporto, há por vezes resistência em escolher o que é novo e as pessoas tendem a confiar mais nos cabelos brancos ou na continuidade do que propriamente na mudança. Os seus 43 anos são um problema para si nestas eleições?

— Não, de todo. Os meus 43 anos revelam 18 anos de experiência relacionada com o setor desportivo ao mais alto nível, seja em representação de agentes desportivos isoladamente, como treinadores, empresários, jogadores ou dirigentes e também a nível obviamente colegial, como federações, clubes, sociedades desportivas, a nível nacional e internacional. E também há na minha lista pessoas com essa mesma experiência e até mais acentuada do que a minha, como o nosso vice-presidente para as modalidades, Vítor Pataco, um homem do desporto também, que foi presidente do IPDJ. O nosso responsável pela área financeira para a SAD, Paulo Ferreira, que esteve quase 25 anos como diretor financeiro na Federação Portuguesa de Futebol. Portanto, aquilo que nós trazemos é especialização, é conhecimento, é o know-how daquilo que tem de ser o Benfica dentro do ecossistema desportivo. Sou eu que vou à frente mesmo com os meus 43 anos, com a cara que tenho. Não tenho cabelos brancos, mas também não tenho cabelo.

— Seis candidatos, seis projetos, muitas ideias, muitas promessas e trunfos. Pergunto, pois, se ouviu alguma ideia que o deixasse impressionado e se tem um trunfo para lançar até ao dia 25.

— O nosso trunfo tem sido aglomerar as ideias dos sócios em conjunto com as nossas, mesmo tendo partido, como é óbvio, com a nossa base de ideias, projetos e visão. Quanto a propostas dos outros candidatos — e confesso que não é por ter de defender a nossa candidatura —, mas não vejo nenhuma medida tão profunda como as propostas que trouxemos para cima da mesa. São todas válidas, gosto de todas, porque é Benfica, mas acho que preparámos com muita profundidade a nossa candidatura e aquilo que queremos dar aos sócios do Benfica.

— Muitos benfiquistas acusam as gestões anteriores de se terem aproveitado do Benfica e do dinheiro do Benfica. Estas eleições marcarão uma nova era de transparência, integridade e honestidade ou há razões para continuar a recear?

— Eu acho que vão marcar, porque há um grande passo, o processo de revisão estatutária. Os estatutos estão muito melhores, mas é um caminho ainda a percorrer. Há regulamentos internos que têm de ser criados para vigorar na vida do Benfica e isso também traz mais transparência. Um deles é o regulamento eleitoral, podemos falar de um regulamento geral, também, que se aplica depois ao clube. Ganhando as eleições, nós comprometemo-nos com os sócios do Benfica em trazer ainda mais transparência. Queremos romper com esse estado de conformismo geral que existe no futebol português.

— Tem o apoio de parte do Movimento Servir o Benfica e uma das acusações que têm sido feitas à candidatura tem a ver com o facto de esses sócios dominarem assembleias gerais. É um problema, um calcanhar de Aquiles, ou, por outro lado, deve ser visto como algo positivo o facto de esses sócios marcarem, efetivamente, presença nas assembleias gerais?

— Relativamente ao Movimento Servir o Benfica, têm de perguntar, efetivamente, ao Movimento Servir o Benfica, porque aquilo que eu vejo são sócios do Benfica a apoiar várias candidaturas, não só a nossa. A nossa candidatura é de base associativa, virada para os sócios, e é normal que tenha adesão pela identidade que os sócios encontram em nós. Estive muito tempo ligado ao Benfica, através da BTV e noutro plano, e quando ia às assembleias gerais os benfiquistas já falavam comigo, eu ia à BTV discutir assuntos do futebol, das modalidades. Os sócios que vão às assembleias gerais estão mais presentes nas modalidades, nos pavilhões, no futebol. Portanto, é uma ideia criada ao longo do tempo e que é válida, porque há claramente maior aproximação da nossa candidatura com os sócios do Benfica, mas que não pode ser utilizada de forma perniciosa e negativa. Porque parece que estão a fazer de sócios do Benfica pessoas que não são válidas ou não têm uma palavra a dizer no Benfica. Aquilo que sustenta o Benfica são os sócios e isso é o que desapareceu do Benfica nos últimos 25 anos. Os sócios tornaram-se clientes, já não são sócios do Benfica. As direções do Benfica não conseguem perceber que os sócios têm mais valor do que um cliente que não se identifica com o clube. Não somos infalíveis, mas estamos aqui para aprender com eles e para tentar ir ao encontro deles.

— Do ponto de vista financeiro, tem números na cabeça? Em relação à redução do passivo, que o Rui Costa prometeu diminuir em €100 milhões, ao investimento na equipa ou à verba que poderá ser retirada dos dois anos de direitos televisivos?

— Tenho na cabeça os números dos resultados do último mandato, que é aquilo a que tenho de agarrar-me para poder construir qualquer coisa para o futuro. 18% de aumento de custos operacionais, 25% de aumento do passivo, 40% de aumento da dívida financeira. Quando diz que Rui Costa fala da diminuição do passivo, eu acho que é uma excelente notícia, todos nós o queremos, temos de ter uma gestão sustentável, financeira e desportiva. Mas há aqui um problema. Foi apresentado o Benfica District, para 200 milhões de euros. Como é que ele vai descer o passivo apresentando um projeto como o Benfica District? É contraditório. Há três grandes premissas. Reduzir custos operacionais com BTV e Benfica Estádio, por exemplo. Alocar a dívida financeira a maior maturidade — empréstimos obrigacionistas, entre outros — em função das receitas, daquilo que o Benfica tem a receber, porque só assim se consegue gerir e tornar mais sustentável, e depois há aqui uma coisa evidente, que são as patrocínios. Há coisas que nunca foram exploradas e vamos à tentativa de captação do naming do estádio. Há necessidade de sentar à mesa com os patrocinadores. O Benfica ganha à volta de 24.1 milhões de euros em patrocínios, parece-me curto. E depois há a grande incerteza futura, que é a  centralização dos direitos audiovisuais. Para nós, a centralização dos direitos audiovisuais não pode existir sem um alteração dos quadros competitivos, melhorar o produto do futebol em Portugal, ser mais transparente e não só (8:46) ter melhores condições.

— José Mourinho tem contrato com o Benfica e já afirmou que os contratos devem ser honrados. Desafiamo-lo, todavia, a revelar o seu perfil de treinador: português ou estrangeiro, conservador ou de ataque?

— Conservador, de todo, fora de questão. A identidade do Benfica é o futebol ofensivo, dominador. Não obstante, em determinados jogos e em determinadas fases da época tem de jogar com aquilo que é a equipa contra a qual vai jogar, dependendo depois da competição também. Não voltando a acontecer aquilo que aconteceu com Bruno Lage em Munique, ele próprio veio depois reconhecer que foi um erro. Aquilo não é o Benfica. O modelo está mais do que encontrado: um futebol avassalador, é a identidade do Benfica desde a sua fundação. Fundados para ganhar. Depois, a questão do treinador é complexa. As direções têm um projeto e os treinadores e os jogadores encaixam no projeto. Tal como os diretores, técnicos, gerais, desportivos. E o treinador não tem nacionalidade. Posso pensar em treinadores de projeto em Portugal, como Vasco Botelho da Costa, que está no Moreirense, parece-me um treinador de futuro. Se já tem arcaboiço para o Benfica? Não sei. É uma coisa que temos de perceber na altura em que temos de contratar um treinador. José Mourinho foi contratado pelo Benfica, é incontestavelmente um bom treinador, um ótimo treinador, um treinador de excelência, um dos melhores de sempre e a nível internacional. Mas eu também tenho que ter noção de que José Mourinho foi contratado por uma determinada Direção, que não é a nossa, e para um projeto desportivo que não é o nosso. São quatro anos de mandato e cinco treinadores, é um falhanço épico a nível de projeto desportivo. Mourinho é um nome tão pesado, no bom sentido, tão imponente, que veio para resolver o falhanço desportivo desta Direção. É mais do que um treinador. Mourinho é comunicação, é saber tudo o que há para saber de futebol. E também conhece o Benfica. Portanto, há que respeitar isso. O que tenho de fazer com a nossa equipa quando entrarmos? Explicar a José Mourinho o nosso projeto desportivo. E tenho a certeza de que vai aderir ao nosso projeto desportivo. Tenho de gerir o Benfica com aquilo que o Benfica fez nos últimos anos. Na primeira reunião com José Mourinho não vou criar desequilíbrios e entropias, é ao contrário, José Mourinho vai saber que vai contribuir, que vai ganhar muito mais connosco. Vamos defendê-lo, respaldá-lo de coisas com as quais não tem de preocupar-se.

— É advogado, conhece na perfeição as ferramentas da justiça. Aceitará o resultado das eleições, aconteça o que acontecer?

— É uma pergunta muito generalizada. Mas, obviamente, eu não compactuo com a ilegalidade. A partir do momento em que eu vir, assistir ou tiver conhecimento factual de que algo que aconteceu... Vou dar o exemplo de 2020. Se se repetir aquilo que aconteceu em 2020, podem ter a certeza de que eu faço tudo o que for necessário para que isso não volte a acontecer. E eu lamento que o candidato que foi vítima em 2020 [João Noronha Lopes, derrotado nas eleições com Luís Filipe Vieira] desse acontecimento não se tenha imposto até hoje por conta disso. Eu não aceito isso. E isto sou eu a falar enquanto sócio do Benfica. Eu não aceito que o Benfica esteja conotado com ilegalidades, irregularidades, tudo o que for contrário à lei ou aos regulamentos do Benfica. Não vou aceitar.

— Os resultados dos jogos com Newcastle e Arouca, este no dia das eleições, terão peso na decisão dos sócios?

— Não. Os jogos são para ganhar. Todos nós ganhamos quando ganhamos e perdemos quando perdemos. Quando nos colam ao associativismo, é de bom grado que nos colam. E nós provámos durante mais de um ano que fomentamos sempre aquilo que é a união. Já disse isto várias vezes e se calhar até vou fazer disto mote: os benfiquistas têm de estar unidos para voltar a ser temidos.