Gonçalo Almeida Ribeiro, candidato a presidente da Mesa da Assembleia Geral do Benfica na lista de João Noronha Lopes, 2025. Foto: Ana Rocha Nené
Gonçalo Almeida Ribeiro, candidato a presidente da Mesa da Assembleia Geral do Benfica na lista de João Noronha Lopes, 2025. Foto: Ana Rocha Nené

Benfica: «Se ganharmos não seremos do governo nem da oposição»

Gonçalo de Almeida Ribeiro, até agora vice-presidente do Tribunal Constitucional, é candidato a líder da Mesa da AG na lista de Noronha Lopes

— O que o motivou a deixar o Tribunal Constitucional e candidatar-se à presidência da Mesa da Assembleia Geral do Benfica?

— O meu mandato no Tribunal Constitucional terminou em Julho. Apesar de a lei determinar a prorrogação do mandato até o juiz ser substituído, há muito que havia decidido que sairia no fim de setembro, regressando à vida académica, após ter dado tempo suficiente ao Parlamento para me substituir. Fi-lo porque entendo que a eternização num alto cargo, devida à inércia do poder político, é perversa em democracia. Tende a transformar o serviço público, transitório e excecional, num privilégio pessoal. Quando João Noronha Lopes me desafiou para encabeçar uma lista à Assembleia Geral do Benfica nestas eleições, já tinha tomado a firme decisão de que, por esta altura, sairia do Tribunal Constitucional se entretanto não tivesse sido substituído. Aceitei o desafio porque tenho uma grande vontade de contribuir para a mudança no Benfica, com um projecto ambicioso e pessoas de inequívoca excelência e integridade. Saliento que é um cargo largamente não remunerado; não se trata de uma opção de vida profissional, mas de um serviço ao meu clube do coração. Só pedi a Noronha Lopes que o meu nome não fosse lançado até eu ter tido a oportunidade de anunciar publicamente a minha renúncia. Foi o que sucedeu.

— Como viu os incidentes que se iniciaram quando Luís Filipe Vieira quis falar na última AG e que medidas defende para garantir maior ordem, respeito e segurança nas assembleias gerais?

— Com estupefação. Os sócios têm o direito de não ouvir um consócio que desprezam, mas não têm o direito de o impedir de falar. E nenhum sócio tem o direito a usar da violência para garantir o seu direito a falar ou para impedir um consócio de falar. A Assembleia Geral é um órgão deliberativo, em que se tomam decisões com base numa discussão aberta e franca. Isso só é possível numa atmosfera de liberdade ordeira: liberdade de expressão em todas as suas vertentes e respeito pela igual liberdade dos demais. O funcionamento do órgão é inviabilizado se esse equilíbrio entre liberdade e segurança se romper: se a liberdade degenerar em anarquia ou se a segurança degenerar em ditadura. Não pode haver AGs sem respeito e civismo, por um lado, e com repressão e intimidação, por outro. A principal função da MAG, liderada pelo seu presidente, é salvaguardar esse princípio de liberdade ordeira, usando os instrumentos que os Estatutos lhe conferem, com firmeza e convicção, mas também sentido das proporções. Para isso contribui de modo decisivo que o PMAG seja uma personalidade respeitada, alguém que os sócios tenham razões fundadas para considerar um árbitro imparcial e judicioso.

— De que forma pretende reforçar a proximidade da MAG com os adeptos, e não apenas com os órgãos sociais?

— A MAG tem uma função essencialmente arbitral: não pode ser uma extensão da direcção, que tem o dever de prestar contas aos sócios; nem pode ser protagonista de uma fação de sócios que tomam parte activa na vida do clube. Uma MAG exemplar não exprime opiniões, nem tem estados de alma; desempenha o seu papel de facilitar e regular o exercício da faculdade deliberativa dos sócios reunidos em AG, o órgão que, segundo os estatutos, é detentor do poder supremo no clube. Por outro lado, a MAG deve conduzir os trabalhos com transparência e procurar, na medida do possível, soluções consensuais, que contribuam para a confiança de todos na integridade do processo deliberativo. Se ganharmos a eleição, não seremos nem do governo, nem da oposição. A MAG deve ser rigorosamente suprapartidária — a encarnação da regularidade, da universalidade e da civilidade.

— Como define o papel do presidente da MAG num clube da dimensão do Benfica?

— O que torna o Benfica extraordinário e maravilhoso é que constitui uma grande síntese entre o associativismo — é uma agremiação desportiva de centenas de milhares de sócios — e o profissionalismo — é uma organização sofisticada que opera numa indústria enorme e exigente. São poucos os grandes clubes europeus que conservaram o substrato associativo. A tendência é no sentido de o futebol se resumir a um negócio, em que o sócio é substituído pelo proprietário — um oligarca, um investidor ou um milionário — e o adepto é reduzido a um consumidor — um adquirente de camisolas, bilhetes e tantos produtos quanto a imaginação comercial conceber. A sobrevivência de um clube com a dimensão e a exigência do Benfica depende da conciliação entre o associativismo e o profissionalismo. Para isso, é fundamental que seja dirigido por benfiquistas apaixonados que sejam profissionais competentes. Mas é ainda indispensável que o poder supremo e residual na vida do clube permaneça na esfera dos sócios. A expressão orgânica desse poder é a Assembleia Geral, e a função do presidente da MAG é liderar a equipa de arbitragem que garante a legalidade do jogo cívico.

— Que soluções propõe para aumentar a transparência dos processos e a confiança dos associados nas votações?

— Na sequência das eleições de 2020, muitos sócios formaram a convicção de que a verdade democrática tinha sido adulterada e que o principal instrumento dessa adulteração foi o voto eletrónico. Essa experiência gerou uma crise de confiança na integridade dos processos eleitorais. Para restabelecer essa confiança, são indispensáveis três medidas: privilegiar os métodos de votação mais fiáveis, nomeadamente o voto físico depositado em urna; procurar consensos alargados entre candidaturas sobre o modo de organizar eleições; e respeitar o poder deliberativo dos sócios reunidos em Assembleia Geral. Na última AG, a MAG submeteu a votação uma proposta de regulamento eleitoral apresentada pela direcção, sem consentir que a mesma sofresse alterações da iniciativa dos sócios presentes. Foi uma tripla derrota para o clube: da legalidade, porque os estatutos conferem à direcção um poder de iniciativa, mas o poder de escolha é da AG; da democracia, porque um processo deliberativo foi transformado num plebiscito, em que a palavra dos sócios ficou reduzida a «sim» ou «não»; e da excelência, porque estavam presentes muitos juristas de créditos firmados disponíveis para melhorar um texto com insuficiências e ambiguidades.

— Em que é que a sua candidatura difere das outras que já são conhecidas?

— Todos os candidatos conhecidos me merecem a maior consideração. Não duvido do profundo benfiquismo de nenhum deles. Em princípio, só um benfiquista apaixonado se candidata a um cargo desta natureza. Mas julgo ser o candidato que dá mais garantias de neutralidade e equidistância — alguém que não faz fretes a quem dirige o clube, mas também não cai na tentação de liderar movimentos de contestação. Um bom PMAG deve ser um grande árbitro: rigoroso, consistente, imparcial e, em última análise, invisível. O seu papel não é amordaçar ou mobilizar os sócios, mas facilitar e regular a expressão da sua vontade. O desafio que João Noronha Lopes me lançou baseou-se na convicção dele de que uma pessoa com o meu perfil de jurista, com sólida formação académica e habituado ao exercício de uma função de exigência, está em condições de prometer aos sócios que não será nem mais nem menos do que um guardião dos seus direitos de participação democrática.

— Como viu os incidentes que se iniciaram quando Luís Filipe Vieira quis falar na última AG e que medidas defende para garantir maior ordem, respeito e segurança nas assembleias gerais?

— Com estupefação. Os sócios têm o direito de não ouvir um consócio que desprezam, mas não têm o direito de o impedir de falar. E nenhum sócio tem o direito a usar da violência para garantir o seu direito a falar ou para impedir um consócio de falar. A Assembleia Geral é um órgão deliberativo, em que se tomam decisões com base numa discussão aberta e franca. Isso só é possível numa atmosfera de liberdade ordeira: liberdade de expressão em todas as suas vertentes e respeito pela igual liberdade dos demais. O funcionamento do órgão é inviabilizado se esse equilíbrio entre liberdade e segurança se romper: se a liberdade degenerar em anarquia ou se a segurança degenerar em ditadura. Não pode haver AGs sem respeito e civismo, por um lado, e com repressão e intimidação, por outro. A principal função da MAG, liderada pelo seu presidente, é salvaguardar esse princípio de liberdade ordeira, usando os instrumentos que os Estatutos lhe conferem, com firmeza e convicção, mas também sentido das proporções. Para isso contribui de modo decisivo que o PMAG seja uma personalidade respeitada, alguém que os sócios tenham razões fundadas para considerar um árbitro imparcial e judicioso.

— De que forma pretende reforçar a proximidade da MAG com os adeptos, e não apenas com os órgãos sociais?

— A MAG tem uma função essencialmente arbitral: não pode ser uma extensão da direcção, que tem o dever de prestar contas aos sócios; nem pode ser protagonista de uma fação de sócios que tomam parte activa na vida do clube. Uma MAG exemplar não exprime opiniões, nem tem estados de alma; desempenha o seu papel de facilitar e regular o exercício da faculdade deliberativa dos sócios reunidos em AG, o órgão que, segundo os estatutos, é detentor do poder supremo no clube. Por outro lado, a MAG deve conduzir os trabalhos com transparência e procurar, na medida do possível, soluções consensuais, que contribuam para a confiança de todos na integridade do processo deliberativo. Se ganharmos a eleição, não seremos nem do governo, nem da oposição. A MAG deve ser rigorosamente suprapartidária — a encarnação da regularidade, da universalidade e da civilidade.

— Como define o papel do presidente da MAG num clube da dimensão do Benfica?

— O que torna o Benfica extraordinário e maravilhoso é que constitui uma grande síntese entre o associativismo — é uma agremiação desportiva de centenas de milhares de sócios — e o profissionalismo — é uma organização sofisticada que opera numa indústria enorme e exigente. São poucos os grandes clubes europeus que conservaram o substrato associativo. A tendência é no sentido de o futebol se resumir a um negócio, em que o sócio é substituído pelo proprietário — um oligarca, um investidor ou um milionário — e o adepto é reduzido a um consumidor — um adquirente de camisolas, bilhetes e tantos produtos quanto a imaginação comercial conceber. A sobrevivência de um clube com a dimensão e a exigência do Benfica depende da conciliação entre o associativismo e o profissionalismo. Para isso, é fundamental que seja dirigido por benfiquistas apaixonados que sejam profissionais competentes. Mas é ainda indispensável que o poder supremo e residual na vida do clube permaneça na esfera dos sócios. A expressão orgânica desse poder é a Assembleia Geral, e a função do presidente da MAG é liderar a equipa de arbitragem que garante a legalidade do jogo cívico.

— Que soluções propõe para aumentar a transparência dos processos e a confiança dos associados nas votações?

— Na sequência das eleições de 2020, muitos sócios formaram a convicção de que a verdade democrática tinha sido adulterada e que o principal instrumento dessa adulteração foi o voto eletrónico. Essa experiência gerou uma crise de confiança na integridade dos processos eleitorais. Para restabelecer essa confiança, são indispensáveis três medidas: privilegiar os métodos de votação mais fiáveis, nomeadamente o voto físico depositado em urna; procurar consensos alargados entre candidaturas sobre o modo de organizar eleições; e respeitar o poder deliberativo dos sócios reunidos em Assembleia Geral. Na última AG, a MAG submeteu a votação uma proposta de regulamento eleitoral apresentada pela direcção, sem consentir que a mesma sofresse alterações da iniciativa dos sócios presentes. Foi uma tripla derrota para o clube: da legalidade, porque os estatutos conferem à direcção um poder de iniciativa, mas o poder de escolha é da AG; da democracia, porque um processo deliberativo foi transformado num plebiscito, em que a palavra dos sócios ficou reduzida a «sim» ou «não»; e da excelência, porque estavam presentes muitos juristas de créditos firmados disponíveis para melhorar um texto com insuficiências e ambiguidades.

— Em que é que a sua candidatura difere das outras que já são conhecidas?

— Todos os candidatos conhecidos me merecem a maior consideração. Não duvido do profundo benfiquismo de nenhum deles. Em princípio, só um benfiquista apaixonado se candidata a um cargo desta natureza. Mas julgo ser o candidato que dá mais garantias de neutralidade e equidistância — alguém que não faz fretes a quem dirige o clube, mas também não cai na tentação de liderar movimentos de contestação. Um bom PMAG deve ser um grande árbitro: rigoroso, consistente, imparcial e, em última análise, invisível. O seu papel não é amordaçar ou mobilizar os sócios, mas facilitar e regular a expressão da sua vontade. O desafio que João Noronha Lopes me lançou baseou-se na convicção dele de que uma pessoa com o meu perfil de jurista, com sólida formação académica e habituado ao exercício de uma função de exigência, está em condições de prometer aos sócios que não será nem mais nem menos do que um guardião dos seus direitos de participação democrática.