A decisão de Grimaldo

Lateral nunca chegou à seleção atuando por um gigante português. O problema não é o clube

GRIMALDO decidiu terminar a longa ligação com o Benfica, trocando o «conforto» da Luz, como o próprio assumiu, por um novo desafio num clube como o Leverkusen (onde se destacou um tal de Roger Schmidt) mas que não é um crónico candidato à conquista da Bundesliga. Compreendo quem critica o timing do anúncio antes de um dérbi que pode decidir o título, mas não fico surpreendido e provavelmente nem o técnico germânico dos encarnados. É preciso lembrar que o futebol alemão já nos habituou a uma transparência por vezes difícil de aceitar para aqueles que estão habituados aos formalismos do costume e a calendários estanques. O RB Leipzig anunciou, em 2018, a contratação do treinador Julian Nagelsmann ao Hoffenheim com um ano de antecedência (só entrou em funções em 2019) e nada de estranho se passou a partir daí: o jovem técnico tentou fazer o seu melhor e nos confrontos diretos perdeu dois jogos e empatou outro com o futuro clube. Mais recentemente, vimos o Bayern anunciar, ainda com a época em curso (fevereiro de 2021) a contratação do central Upamecano ao RB Leipzig, batendo a cláusula de €42,5 milhões. Um negócio transparente entre dois candidatos ao título. O que se passou a partir daí? Absolutamente nada de anormal: o internacional francês jogou até ao final da época, tentando ajudar a equipa a sagrar-se campeã na vez do futuro patrão. Não conseguiu, ficou em segundo, mas foi sempre titular e nunca se desviou do caminho que fez os bávaros contratarem-no.

Considero por isso positivo que o Benfica tenha decidido manter Grimaldo nos planos para Alvalade. É um passo em frente que se dá no sentido da responsabilização e na clareza dos processos (o que é melhor: um jogador que assume tudo às claras e promete ser profissional até ao fim ou aqueles que já trataram da sua vida em janeiro sem ninguém saber?) E haverá alguém que acredita que os colegas e equipa técnica não saberiam já que o futuro do espanhol não seria por estas bandas? O que mudou foi a perceção do público, mas não é o público que joga. E o pior que pode haver é uma gestão de uma equipa de fora para dentro.

Mas o que merece reflexão é o motivo da troca (além das questões económicas). Grimaldo deixou bem claro que não é apenas a saída de um clube para outro, é a entrada num novo campeonato, «uma liga mais competitiva», a rampa de lançamento para a seleção espanhola que provavelmente não sentiu haver em Portugal. É este o ponto-chave. Os clubes grandes em Portugal têm de entender de uma vez por todas que terão de fazer um esforço para puxar o campeonato para cima. Ainda esta semana ouvimos o co-CEO das águias, Domingos Soares de Oliveira, afirmar com uma total clareza: o clube que tem a maior capacidade de atração de investimento em Portugal não tem receitas suficientes para suportar os custos, sendo por isso obrigado a vender jogadores. Uma necessidade obviamente extensível a FC Porto, Sporting e SC Braga. O problema é o modelo existente: um campeonato parcialmente competitivo, de estádios despidos e pouco formatado para o espetáculo.