A História resolverá
Um dos predicados essenciais, para um jornalista profissional, é a equidistância. A tentativa sistemática de ter uma visão ampla, suficientemente transversal e abrangente de todos os ângulos de análise de determinada questão. Essa perspetiva permite-lhe relativizar reações, sustentar e avaliar alguns comportamentos, e até compreender a ausência deles.
Escrevo, claro, a propósito do falecimento de Jorge Nuno Pinto da Costa, das reações que provocou e, sobretudo, dos silêncios que tão ruidosos se tornaram. E isso, sublinhe-se desde logo, só sucedeu porque a personalidade em causa é realmente importante e impactante na história do futebol português, nas suas conquistas, nos seus objetivos e no seu modus operandi.
E aqui bifurcam-se as primeiras opiniões, justamente porque o modo escolhido por Pinto da Costa para agir e reagir ao longo dos seus 42 anos de mandato, foi, em crescendo, mais aglutinador, mais fechado no discurso redondo de um bairrismo talvez não justificável para um pequeno retângulo com as diminutas dimensões de Portugal.
Mas foi, paradoxalmente, esse modo de fazer e construir que levou um FC Porto de cunho eminentemente regional a tornar-se símbolo de um país no mundo do futebol, e a garantir o espaço e o tempo necessários e suficientes para que Jorge Nuno, verdadeiramente, se sentasse numa cadeira de poder quase indestrutível, barricada numa fortaleza além-Douro e daí partindo para uma conquista de territórios e de influências por força da dinâmica de vitória.
Foi exatamente esta dinâmica, quer a nível nacional, quer no estrangeiro, que provocaram um exponencial aumento da base de adeptos do FC Porto, desde logo porque se sabe que as gerações que vão surgindo e ganhando o seu espaço (até para legitimar essa tentativa de emancipação), o fazem escudando-se no suporte e na adesão a quem mais ganha, a quem mais notoriedade tem e a quem melhor poderá representar os seus valores e os seu anseios.
Jorge Nuno Pinto da Costa representou, por isso, muito valor acrescentado para quem seguiu o seu consulado e percebeu, a uma razoável distância de segurança para garantir a tal honestidade de avaliação, que jamais seria homem de consensos, tal a dimensão dos seus feitos e, por outro lado, a cadeia de influências criada ao longo de mais de quatro décadas na afirmação nacional de um símbolo e de uma ideia outrora apenas contidas nas fronteiras naturais do Douro.
Dito isto, e levando em consideração o clima hostil, muitas vezes de guerrilha assumida, com alguns dos principais dirigentes dos dois grandes da capital, não admira as divergentes opiniões em relação ao silêncio de Benfica e Sporting, do ponto de vista oficial, ao desaparecimento físico do eterno Presidente azul e branco. Mas vale aqui, de novo, rebuscar a memória e perceber que, quase à vez, Pinto da Costa havia estabelecido relações de grande cooperação e assumida amizade com nomes fortíssimos da história da Luz e de Alvalade.
Lembram-se de Fernando Martins, Presidente do Benfica e proprietário do Hotel Altis? Os laços eram de lacre entre dois nomes incontornáveis da história de cada um dos clubes, ao ponto de os portistas, em cada deslocação a Lisboa ou arredores, continuarem a pernoitar no conhecido hotel da Rua Castilho.
Ou de Sousa Cintra? Também os dois homens se deram bem e mantiveram uma relação pessoal que ultrapassava a componente institucional a que, supostamente, seriam obrigados pelos cargos que desempenhavam.
Pois o curioso de tudo isto é que, num momento de maior acalmia nas muito encapeladas relações formais entre Porto, Benfica e Sporting, com o advento de um Presidente nortenho que, embora mantendo o foco na rivalidade, fecha o discurso para dentro, diminuindo claramente a fuga para a frente de uma dialética permanentemente agressiva, impulsiva, de humor cáustico, surge, da parte dos dois principais rivais, a possibilidade de apaziguarem e relativizarem discursos e polémicas antigas, e darem um sinal de modernidade, humanismo e empenho num quadro distinto de diplomacia desportiva, a pior atitude.
O desprezo a que dirigentes jovens e bem formados como Rui Costa e Frederico Varandas votaram a morte de JNPC quer dizer algumas coisas e permite tirar determinadas conclusões.
Primeira, e mais direta: os líderes de Benfica e Sporting pouco ou nada querem saber de um clima mais transparente, tranquilo, lúcido no futebol português. À primeira grande hipótese que têm de provar o contrário, não o fazem, escudam-se no silêncio que, afinal, compromete. Costa e Varandas ainda não perceberam que, tão importantes como os seus associados, é a indústria em que todos são parceiros.
Segunda, e mais profunda: os Presidentes da Luz e de Alvalade não são cavalheiros, estão-se nas tintas para qualquer possibilidade de mostrarem adesão à diplomacia futebolística que seria imperiosa num caso destes, e que poderia, tão simplesmente, resumir-se a uma pequena nota formal no respetivo site, endossada à família e ao FC Porto.
Uma situação destas seria inimaginável no estrangeiro e acaba por nos lembrar que, afinal, estamos em Portugal.
Creio que a História do futebol português se lembrará de Rui Costa, o genial futebolista, mas dificilmente de Rui Costa, o não talhado para dirigente. E mais depressa se lembrará de Frederico Varandas, o diligente médico em missões de Paz, do que de Varandas como líder verde e branco.
Quanto a Pinto da Costa, é evidente que a História o marcará como o Presidente dos Presidentes.
Cartão branco
Planeamento e condições de trabalho serão sempre essenciais. E o velódromo de Sangalhos, como infraestrutura de ponta, é elemento essencial à criação de um ecossistema competitivo único para a evolução do ciclismo de pista em Portugal. Mas o talento é inato e pode, depois, ser trabalhado e potenciado. Os resultados internacionais conseguidos por Iúri Leitão e Rui Oliveira (entre outros grandes valores do ciclismo de pista português) são fruto disso mesmo: de um extraordinário talento, de uma imensa capacidade de sacrifício e de foco nos objetivos, de uma grande qualidade em treino e em competição. Continuarão, decerto, uma carreira de topo, de exceção e com total mérito.
Cartão amarelo
Num jogo de capital importância, o sangue-frio é essencial, ainda para mais num dos jogadores mais importantes e determinantes de um grupo. Stephen Eustáquio está, até, na linhagem de capitães do FC Porto e sabe, talvez muito melhor do que alguns companheiros, tudo o que está em jogo numa eliminatória europeia. A sua atitude, em Roma, não o penaliza apenas a ele. Foi fundamental para que, durante quase metade de um jogo dificílimo, a equipa oscilasse e não mais encontrasse o equilíbrio necessário, devido a um cartão vermelho… desnecessário.