Mbappé, Ronaldo, Di Stéfano e Eusébio
Esta sexta feira, Kylian Mbappé recebeu, no camarote de honra do Santiago Bernabéu, a sua primeira Bota de Ouro, acompanharam-no todos os seus colegas de equipa numa cerimónia com discursos do presidente Florentino Pérez, de Juan Ignacio Gallardo, diretor de MARCA e vice-presidente da ESM (European Sports Media), a entidade que institui o prémio, e palavras finais de agradecimento do próprio Mbappé. Tudo muito formal, pouco a ver com o ato sério e ao mesmo tempo descontraído e divertido que, há 14 anos, A BOLA organizou em Madrid para entregar a Cristiano Ronaldo, então jogador do Real, a segunda Bota de Ouro da sua carreira.
Foi algo histórico que na mesma mesa principal se tenham sentado Cristiano, Eusébio e Alfredo Di Stéfano numa das pontas estava Vitor Serpa, então diretor do nosso jornal, e na outra eu, para, modestamente, procurar conduzir a sessão, olhando para os três e procurando imaginar como teria sido o futebol com eles pertencendo à mesma geração e jogando na mesma equipa.
A nota alegre foi dada por Eusébio ao contar como na final europeia de Amesterdão viu realizado o seu sonho de ter a camisola do Di Stéfano. «Na equipa o único que falava espanhol era o Coluna e foi ele que, antes de o jogo começar, foi ter com ele para o tentar convencer. Quando terminou o desafio fui a correr ao seu encontro e, com toda a modéstia, pedi-lhe: 'D. Alfredo, por favor, gostava muito de ter a sua camisola, tirou-a, deu-ma, agradeci-lhe e escondia-a nas cuecas, sabia que, depois de termos ganho, ia haver invasão do campo com o perigo de, no meio da confusão, alguém me a roubar. Eu quase não sabia o que era a Taça dos Campeões Europeus, não lhe dava grande importância, o que eu de verdade queria era ter a camisola do Di Stéfano, esse era o meu grande troféu».
O público, que enchia a sala, delirou e aplaudiu a mais não poder a simples e despretensiosa forma como Eusébio contou a sua história que era a da grande admiração de um jovem pelo seu grande ídolo. Com o tempo ambos se tornaram bons amigos, admiravam-se um ao outro e suspeito que esse dia de novembro de 2011 foi o último em que estiveram juntos. A Eusébio não voltei a vê-lo antes de nos deixar pouco mais de dois anos depois, Di Stéfano durou seis meses mais, dias antes de partir, abriu-me as portas da sua casa para conceder para o nosso jornal a sua última entrevista, uma honra tão grande como triste, pois teria preferido mil vezes que os dois amigos ainda estivessem entre nós para continuarem a contar-nos as suas deliciosas histórias. Mas a vida, quando decide aplicar a sua lei, é implacável e não perdoa.