José Mourinho dá instruções a Dedic no Benfica-Nápoles da Champions League - foto: Miguel Nunes
José Mourinho dá instruções a Dedic no Benfica-Nápoles da Champions League - foto: Miguel Nunes

Como Mourinho ganhou a batalha tática a Antonio Conte

Encarnados venceram por 2-0, com o técnico português a conseguir condicionar bastante o jogo do seu adversário

O Benfica salvou o segundo match point consecutivo na actual edição da UEFA Champions League, agora diante do Nápoles. Em casa e perante os seus adeptos, o Benfica apresentou nuances estratégicas (posicionais e comportamentais) determinantes para o desfecho vitorioso, naquela que foi a exibição mais completa dos encarnados desde a chegada de José Mourinho.

Comportamentos sem bola:

- Opção clara por um bloco mais alto e pressionante. Com dois dias a mais de descanso em relação ao adversário, Mourinho foi inteligente ao promover uma pressão mais alta e intensa sobre a Fase de Construção do Nápoles;

- Com indicações claras para impedir ligações intersectoriais sobre o corredor central defensivo italiano e direcionar a saída de bola napolitana para os corredores laterais, de modo que entrassem nas zonas de pressão identificadas pelo treinador português, os posicionamentos de Ivanovic, Barreiro, Ríos, Barrenechea, Aursnes e Sudakov acabaram por ser fundamentais;

- Ivanovic, fisicamente mais fresco e mentalmente disposto a provar que merece mais minutos, foi o condutor da pressão. A partir do momento em que decidia sobre que lado os italianos iriam começar a construir, o n.º 9 encarnado prontificou-se sempre a fechar linha de passe interior para o central do meio da linha de 3;

- Simultaneamente, Barreiro disparava em direção ao outro central que ia receber a bola, adotando sempre um posicionamento que não só fechava linha de passe para Elmas e McTominay (bem vigiados de perto por Enzo e Ríos), como obrigava a uma tomada de decisão com ligação mais longa;

- Graças a isso, quer Sudakov sobre a esquerda, quer Aursnes sobre a direita puderam manter alinhamento sobre o meio-campo, o que lhes permitiu controlar as investidas ofensivas de Di Lorenzo e Olivera;

- Esta novidade posicional e comportamental do Benfica em organização defensiva (estrutura em 1x4x4x2 em vez do habitual 1x5x3x2 com o Aursnes a recuar para a linha defensiva) foi decisiva para que os encarnados manietassem o momento ofensivo do atual campeão italiano;

- Ao estrangular o Nápoles sobre um corredor lateral, as águias basculavam Aursnes e Sudakov para zonas mais centralizas e opostas ao centro de jogo. Esta compactação a 2/3 verticais tornaram as coberturas defensivas sobre o corredor central mais eficazes, dando igualmente maior tranquilidade à linha defensiva, que nunca teve de se desfazer quando Neres e Lang procuraram baixar entrelinhas para espaços que não existiam, tal a compactação horizontal encarnada;

- Mesmo quando não houve hipótese de pressionar alto com uma estrutura 2 + 4, o Benfica soube manter a serenidade e a organização necessária para não abrir espaços para ligações interiores e entrelinhas. Organizados em 1x4x4x2, os comandados de José Mourinho tiveram igualmente a capacidade de retirar a profundidade aos italianos sempre que a bola esteve descoberta;

- A presença de Tomás Araújo no onze inicial também ajudou a precaver uma eventual opção mais vertical e direta por parte de Antonio Conte. E sempre que houve bola lançada em profundidade, o n.º 44 mostrou segurança e inteligência, não cedendo espaços a Hojlund;

- Das poucas vezes em que se viu obrigado a organizar-se defensivamente em 1x5x3x2 (sempre Aursnes a baixar para a linha defensiva), o Benfica esteve sereno e tranquilo, contando ainda com a disponibilidade física e mental de Barrenechea e Ríos para eventuais segundas bolas.

Comportamentos com bola:

- Ter Tomás Araújo na linha defensiva é ter muito mais do que apenas um defesa central competente. A capacidade de passe alicerçada numa inteligência de jogo acima da média torna Araújo num jogador fundamental para quem quer sair com critério e qualidade de zonas de pressão, seja através de passe curto, seja através de passe longo;

- Embora o Nápoles não tenha sido uma equipa sufocante na reacção à perda, o parceiro de Otamendi no centro da defesa encarnada trouxe aquilo que a equipa precisava para chegar com qualidade às zonas mais adiantadas do terreno;

- O posicionamento de Enzo sobre a meia esquerda aquando da saída de bola encarnada foi importante para a superioridade encarnada ao longo de boa parte do jogo. Com Lang preocupado em acompanhar o posicionamento de Dedic, Hojlund procurou condicionar Tomás Araújo e Neres derivava para dentro de modo a poder pressionar Otamendi, caso o argentino recebesse a bola;

- Aquele que poderia parecer um encaixe perfeito nunca o foi por dois motivos: Neres não tem bons timings de pressão e nunca acertou quando deveria condicionar o capitão encarnado; Barrenechea percebeu onde havia espaço e passou a baixar para uma saída 1 + 3 vs 2;

- Dahl, projectado sobre a esquerda, atraía as atenções de Di Lorenzo e beneficiava do posicionamento mais interior de Sudakov, que procurava esconder-se atrás de Elmas e McTominay;

- Aursnes replicava o posicionamento do ex-Shakhtar Donetsk, de repente, o Benfica passava a ter 3 vs 2 sobre o corredor central. Se um dos médios italianos saltasse sobre Ríos, o outro teria de se preocupar com o ucraniano e o norueguês em simultâneo;

- Graças a isso os encarnados conseguiram invadir com relativa facilidade o meio-campo defensivo italiano. Nem sempre em vantagem numérica, mas muitas vezes em vantagem posicional;

- A presença de Ivanovic também se fez sentir no momento ofensivo encarnado. Tal como o posicionamento de Leandro Barreiro;

- Forte no ataque ao espaço, o croata foi importante para segurar a linha defensiva italiana. Ao contrário de Pavlidis, que gosta de se associar e abrir espaços para os colegas de equipa, Ivanovic é um avançado de área, mais físico, menos dotado tecnicamente, mas muito forte nos duelos físicos. Com a sua inclusão no onze inicial, o Nápoles nunca pode subir a sua linha defensiva, o que causou desconforto na dupla de médios do campeão italiano. Consequentemente a equipa esteve menos compacta e mais estendida dentro de campo, algo que beneficiou o momento ofensivo encarnado;

- Ivanovic não foi chamado a jogo para abrir espaços, mas essa tarefa esteve a cargo de Barreiro. O internacional luxemburguês partiu sempre de posições mais próximas aos centrais italianos, de modo a atraí-los sempre que procurava baixar entrelinhas;

Em duelo de estrategas, Mourinho levou a melhor sobre Conte. Preparou melhor a equipa e soube aproveitar as debilidades defensivas do conjunto italiano. Ao mesmo tempo soube condicionar a saída de bola napolitana e nunca permitiu que Lang e Neres (principais desequilibradores italianos) pudessem surgir entrelinhas com tempo e espaço para se associarem e/ou servir Hojlund.

Vitória de régua e esquadro do Benfica que, com este triunfo, ainda sonha com a permanência na maior prova de clubes da Europa.