José Azevedo lamenta falta de apoio na formação. Foto EFAPEL/instagram

Azevedo bate com a porta e acusa falta de combate ao doping em Portugal

Antigo corredor e atual diretor da Efapel não escondeu desilusão com o rumo da modalidade, apontando o dedo aos responsáveis da Federação e exigindo ética

Quatro anos depois de criar a Efapel Cycling, José Azevedo mostrou-se desiludido com o que se passa no ciclismo português e já avisou que para o ano a equipa vai correr fora de portas. Em causa está o retrocesso no combate ao doping no pelotão nacional. «É necessário aplicar os regulamentos para credibilizar a modalidade. E haver consciência e haver ética, e haver fair-play e respeito pelos adversários e por quem investe. E isso foi feito com a direção anterior [da FPC]. E foi um caminho de sucesso que estava a ser construído. Nesse aspeto, eu muitas vezes falei com o anterior presidente, com o Delmino, que conheço há muitos anos, e ele sabe que eu sempre fui um dos grandes defensores da implantação do passaporte biológico e um grande defensor da verdade desportiva», argumentou o antigo corredor e ex-manager dos russos da Katusha, em declarações à Agência Lusa.

«Eu, infelizmente, na minha equipa, tive situações de atletas que não estavam neste projeto, mas que tiveram implicações e tiveram de abandonar o ciclismo. São pessoas por quem eu tenho muita estima, porque enquanto estiveram na Efapel tiveram um comportamento exemplar. E tenho o máximo respeito por eles. O que está para trás, não vou julgar. Mas eu tomei as medidas, porque nesta equipa há regras de que eu não abdico. Mas, se calhar, somos os únicos a trabalhar dessa forma», explicou referindo-se a Rafael Silva e João Benta, ex-corredores da formação que foram suspensos devido a anomalias no passaporte biológico.

As criticas continuam severas em relação ao tema do doping.

«Há dois anos criou-se esta ferramenta [passaporte biológico] que foi muito importante. E isso aí foi algo de muito positivo. Deveria ser usado como um instrumento de credibilidade. Mas para isso tem de haver rigor. Rigor, 100%. Não pode haver 99%», reforçou.

«Não se pode permitir que, por exemplo, no ano passado, haja corredores a ganhar provas, quando todos nós sabemos [que vão ser suspensos]. Se calhar não existe motivo para suspender os contratos, mas as equipas podiam deixá-los em casa. Para a verdade desportiva prevalecer, um corredor não deveria estar a competir quando está um processo aberto. E isso compete às equipas e à federação tomar medidas, porque se não vamos descredibilizar o ciclismo», justificou em declarações à Lusa.

José Azevedo foi durante anos um dos maiores nomes portugueses no ciclismo internacional, tendo terminado no 5.º lugar no Giro 2001 e no Tour 2004, bem como na 6.ª posição da Volta a França 2002.

Sob a liderança de Cândido Barbosa, o novo presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, Azevedo identifica um retrocesso. «Não sei o porquê, mas houve um retrocesso. Isso não pode acontecer. Isso volta a ser penalizador. E, claro, faz-nos ponderar tudo isso, se vale a pena investir no ciclismo português», exclamou o diretor desportivo da Efapel.

«A formação está abandonada, os apoios deixaram de existir. Havia apoios à formação de parte da federação, que foram cortados este ano. Cria dificuldades a todos, porque é lógico que os investimentos na formação são mais reduzidos. O ciclismo em Portugal é possivelmente a segunda modalidade mais popular. É um desporto que eu não tenho dúvidas que as empresas veem como um excelente veículo publicitário das suas marcas. Não há dúvida. […] Mas precisa de ser repensado. E se tiver que deixar ir mais abaixo e construir de novo e, eu sempre disse isto, não há problema nenhum», argumentou.

«O ciclismo nacional anda a puxar a manta, mas deixa sempre algum bocado destapado. Andamos quase a enganar-nos uns aos outros. Se tiver de começar de base, que comece. Mas se calhar vamos construir daqui a cinco ou 10 anos um desporto sólido, em que as pessoas acreditam, onde há investimento, onde há salários dignos e onde há capacidade de dar às marcas o retorno a nível da exposição mediática que eles querem. Porque nesta altura a verdade é que não conseguimos fazer isso, porque não conseguimos ter comunicação social», lamentou.

Para Azevedo, «quem comanda o ciclismo em Portugal, quem tem a obrigação de defender os interesses do ciclismo, não está a fazê-lo».

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