Sim, Eriksson chegou a treinar o Benfica
Sven-Goran Eriksson (à direita) com o médio Jonas Thern no Benfica

Sim, Eriksson chegou a treinar o Benfica

OPINIÃO14.01.202410:00

Sueco foi um revolucionário nos encarnados e no próprio futebol português

Eriksson chegou, de facto, a treinar o Benfica. Não há aqui erro algum, a frase apenas peca por defeito. Por largo defeito, sublinhe-se. Para quem não sabe do que escrevo, foi assim que, nas redes sociais, descreveram o sueco, depois de este ter assumido, publicamente, estar há meses a lutar pela vida.

As redes sociais, sabe-se, têm destas coisas. São sempre demasiado superficiais, vagas e até injustas. Que serviço uma publicação como esta presta a um jovem adepto que a lê e que, naturalmente, não viveu esses tempos? Nenhum.

Sven-Goran Eriksson foi mais do que um técnico que passou por Portugal e que chegou a treinar os encarnados. Aterrou na Luz depois de conquistar uma Taça UEFA com o IFK Gotemburgo e revolucionou por completo hábitos, mentalidade e a forma de se jogar em Portugal. Levou os encarnados a duas finais, a da Taça UEFA, perdida a duas mãos para o Anderlecht logo no seu primeiro ano, e a Taça dos Campeões Europeus diante do Milan dos três holandeses e de Arrigo Sacchi, em 1990. Depois, conquistou o segundo scudetto da história da Lazio, além de uma Taça das Taças e uma Supertaça Europeia. E, por aí fora, numa longa carreira, que talvez não lhe tenha trazido tantos troféus quantos os que realmente merecia.

Lateral-direito tornado técnico aos 28 anos no Degerfors, da segunda divisão, devido a uma lesão grave, e influenciado pelo seu treinador Tord Grip (futuro adjunto de Georg Ericsson nos AA suecos) e pelas observações do trabalho de Bobby Robson no Ipswich Town e de Bob Paisley no Liverpool, Eriksson tornou-se um discípulo da influência britânica trazida por Bobby Houghton e Roy Hodgson para o Malmo nos primeiros tempos do profissionalismo no país. Uma filosofia que abdicava do líbero e da marcação individual e apostava na zona, na pressão ao portador e na linha de quatro defesas, embora com um futebol mais direto, de bolas longas para as costas do último reduto contrário. 

Pragmático, o resultado sempre foi o mais importante para Eriksson, um treinador obcecado pela geometria defensiva e pelas obrigações posicionais sem bola por parte de cada um dos seus jogadores. No entanto, com esta nos pés, deixava os atacantes livres para se expressarem. Foi assim que conseguiu aliar a latinidade  de Portugal e Itália a um rigor que pouco de latino tinha. Juntou a técnica à ética de trabalho e à perceção tática, com foco ainda na dimensão física do jogo, quebrou vícios e acrescentou dimensão até à forma como os próprios futebolistas se viam a si mesmos e à equipa. Foi um revolucionário, fundamental para um segundo fôlego do Benfica a nível continental.

Cavalheiro e de gosto requintado, nem sempre tomou as decisões certas que o mantivessem à tona com o seu legado. Eriksson devia ser daqueles que depois de um Manchester City não deveria treinar uma Costa do Marfim, na China ou a seleção de Singapura. Há técnicos que não podem baixar a fasquia. E isto é válido para muitos outros. Força, Sven!