Ofendidos estão os adeptos

OPINIÃO14.07.202004:00

Faz 30 anos que o Benfica disputou a sua última final dos Campeões Europeus, em Viena, diante de uma das mais poderosas formações do Milan que, além de três pérolas holandesas, Rijkaard, Ruud Gullit e Van Basten, tinha  uma defesa de ferro, com  Tassotti, Baresi, Costacurta e Maldini, e um  quarteto de categoria no meio-campo formado por, além de Rijkaard, Colombo, Ancelotti e Evani. O  treinador era Sacchi.

O Benfica bateu-se com denodo, foi um verdadeiro finalista e digno vencido. Sem fórmulas mágicas, apenas com onze jogadores que honraram a camisola, a saber: Silvino; José Carlos, Ricardo, Aldair e Samuel; Valdo, Hernâni e Thern; Vítor Paneira (Vata, 76’), Magnusson e Pacheco (César Brito, 60’). O treinador era Sven-Goran Eriksson, que viu naquele Milan a equipa mais forte do mundo, na altura. Sem grande surpresa, os italianos venceram com um golo solitário de Rijkaard, já depois da uma hora de jogo.

Dois anos antes, em 1988, o Benfica, treinado por Toni, chegara igualmente à final dos Campeões Europeus, em Estugarda, tendo perdido frente ao PSV, na marcação de penáltis (6-5). Desfalcado da sua principal figura, Diamantino Miranda, por lesão, lutou com as armas que tinha. Que eram poucas. Eis a equipa:  Silvino; Veloso, Dito, Mozer e Álvaro; Chiquinho Carlos, Elzo, Shéu e Pacheco; Rui Águas (Wando, 56’)  e Magnusson (Hajry, 112’).

Numa fase em que tanto se tem falado (e  gozado, até)  acerca da pretensão de Luís Filipe Vieira em revitalizar o projeto europeu da águia, uma das suas grandes bandeiras, e quando há cerca de dois meses Rui Costa, administrador e ele próprio campeão europeu ao serviço do Milan, em 2003,  treinado por Carlo Ancelotti, afirmou ao canal da águia que «quando qualquer jogador chega ao Benfica podemos dizer, orgulhosa e vaidosamente, que fomos campeões europeus duas vezes e  que estivemos em sete finais (…) e utilizarmos isso para afirmar que é o que queremos voltar a fazer no nosso clube, o sonho de todos os benfiquistas», conclui-se que, internamente, se fala a uma só voz quando o tema é a internacionalização da águia.

A ideia é magnífica, tem o respaldo da história e pernas para avançar, desde que não se teime  no erro grosseiro de pensar que só o dinheiro resolve. Semelhante teoria  mata à nascença todos os esforços de mudança, e se fosse assim tão óbvio o PSG e o Manchester City seriam os soberanos do futebol mundial.

Olhando para as equipas  do Benfica naquelas duas finais, sobretudo a mais antiga, alguém admitiria  que fossem capazes de percurso  desportivo tão relevante na mais importante prova da UEFA? As estrelas eram poucas e de fraco brilho, mas havia qualidade, experiência e, fundamentalmente, coragem, força de vontade e disponibilidade para lutar. A camisola que vestiam, cada vez menos encarnada nos tempos que correm, por manias do marketing, e o emblema da águia estampado ainda tinham  peso e significado, incutiam um respeito solene nos jogadores, quase intimidador.  Respeito esse que nos últimos anos,  fruto de circunstâncias diversas, se foi esvanecendo.  

Admiro a obra de Luís Filipe Vieira e sei que, apesar do que está à vista ser extraordinário e de uma dimensão que a eleva a caso de referência, a cabeça dele é uma espécie de fábrica de ideias em permanente  laboração na descoberta de mais projetos. Por isso o acusam, injustamente, de prometer e não cumprir quando a questão não é essa: ele tem um sem número de planos em mente, uns mais adiantados, outros alinhavados, uns mais fáceis de executar, outros mais complexos, mas sempre com o objetivo supremo de acrescentar grandeza e riqueza ao Benfica.

O presidente encarnando, no seu infatigável empreendimento de valorização da marca, precisa que os resultados do futebol o ajudem, mas a inevitável perda deste campeonato, por motivos que me escapam em toda a sua extensão, foi choque brutal com que não contava.

Bruno Lage já foi despachado, mas a equipa continua em rendimento chocho, cirandando por ali artistas que já nem disfarçam.  Se vão para o  banco de suplentes, não se comprometem; se são colocados em jogo, pouco se esforçam.

Trouxe as equipas das finais de 1988 e 1990 à colação como exemplo a reter que faça corar de vergonha algumas vedetas (?) principescamente pagas, tratadas com todos os luxos, mas que têm medo de meter o pé e não gostam de  lutar pela recuperação da bola, que evitam o choque, que bola dividida é… bola para o adversário, que não pressionam e não têm estofo para aguentar nem 90 minutos na  intensidade simpática da Liga portuguesa.

Luís Filipe Vieira não deve ceder no projeto europeu, por consideração à história da águia. Se for necessário, troca  todos os desonrados deste plantel por quem  entenda a tal mística, tenha fibra de campeão e encare cada jogo como o mais importante da carreira.

Ofendidos estão os adeptos por causa da correnteza  de desempenhos negligentes de alguns senhores jogadores.