Mentalidade e coerência como base do sucesso
O BENFICA NO RELVADO
Aprimeira opinião que assinei nas páginas de A BOLA foi dedicada ao alemão Roger Schmidt, que apresentei como a figura mais importante do primeiro terço do campeonato. Dezoito jogos depois, mantenho-o. O sucesso pode ser analisado sob diferentes perspetivas. No caso do Benfica, não se mede (neste momento) em títulos, até porque já foi afastado de duas competições e sem ter conhecido o sabor da derrota. Tendo em conta este facto, se questionarmos os adeptos encarnados, todos vão demonstrar enorme satisfação pelo percurso da equipa.
Este é um dos grandes méritos de Schmidt. Através de um estilo de jogo muito intenso, pressionante e dominador, convenceu todos os jogadores que este é o caminho para vencer. Teve a perspicácia de colocar as peças nos lugares certos. Deu liberdade e confiança aos jogadores, pensa pela sua cabeça e valorizou ativos que estavam desvalorizados. Criou uma forma de jogar que agrada aos adeptos e aos jogadores. Tem sabido motivá-los pelos objetivos mas, sobretudo, pela forma alegre como devem desfrutar do jogo. Este foi o caminho escolhido, mas, ainda mais importante do que a forma como se podem alcançar as vitórias, é a mentalidade. Essa é que faz a diferença. Fazer com que todos percebam que não existem adversários impossíveis de ultrapassar e que se podem encarar olhos nos olhos. O que este Benfica vem demonstrando é um enorme respeito pelos oponentes e por si mesmo.
O jogo frente ao Brugge demonstrou, mais uma vez, esta característica. Com um pé e meio nos quartos de final, Roger Schmidt não poupou ninguém, nem geriu amarelos. Colocou aqueles que, para ele, são os melhores, focou-se apenas naquele jogo e não nos que aí vêm. O presente é sempre o mais importante. O último aspeto que noto nesta equipa, e que tem o dedo do treinador, é a união, transparência, organização e compromisso que existe no grupo. Ninguém se coloca em bicos de pés, todos querem contribuir respeitando sempre o coletivo. Isso nota-se no comportamento dos jogadores no relvado. As vitórias tornam tudo mais fácil, mas estas características são as bases que permitem vencer de uma forma mais consistente.
Compromisso que existe na equipa do Benfica tem o dedo do treinador, Roger Schmidt
O BENFICA NA GESTÃO
FORA dos relvados, o Benfica parece outro clube. Muita instabilidade, promovida por práticas de gestão duvidosas. Os processos acusatórios vão surgindo, muitos deles sem pernas para andar. No entanto, a contaminação e desvalorização da marca Benfica tem sido uma constante, pelo ruído negativo que existe em torno destes episódios.
De uma forma simples, existe só uma solução para quebrar este caminho, que passa por cortar com o passado. A renovação já deveria ter ocorrido anteriormente e tarda em acon- tecer. É preciso haver transparência e rigor nas decisões. Como exemplo, na última quarta-feira, os órgãos sociais do clube reuniram-se com um ponto importante na ordem de trabalhos: a saída de Domingos Soares de Oliveira da SAD. E o argumento utilizado foi o de que está acusado (e não julgado) no âmbito do processo Saco Azul. Ora, um dos pilares de uma boa gestão é a coerência das decisões. Havendo nos corpos sociais um vice-presidente (Fernando Tavares) que também está acusado e vai a julgamento no caso Operação Lex, este não deveria também ter si- do afastado? Ou existem casos especiais? Afirmo com insistência que o futebol, embora esteja conotado de forma negativa, dá muitos exemplos à sociedade.
No caso do Benfica, basta analisar a forma como se gere a equipa profissional para perceber a base do sucesso deste ano: caráter, coerência nas decisões, transparência, igualdade, lealdade, compromisso e seriedade. Aplicando-se estas características na área da gestão, com certeza que o ambiente vai ser muito mais clean, obviamente em benefício da marca Benfica, que sairá reforçada. É necessário coragem para se tomarem as decisões!
LIGA: PÉS PELAS MÃOS
P OR estes dias, ficámos a saber que a Liga Portugal destacou um alto quadro para participar num evento organizado por cinco dezenas de adeptos benfiquistas. O objetivo seria explicar a fórmula de negociação dos direitos de centralização de TV. Conforme referi no artigo publicado a 22 de janeiro, «A Liga Portuguesa de Futebol Profissional foi inicialmente criada com o objetivo de organizar as competições profissionais de futebol. Com o passar dos anos, e com a evolução cavalgante desta indústria, foi entregue à LPFP um papel mais ativo. Assim, a missão da LPFP passa por criar um produto apelativo e com valor.» Será que este tipo de eventos se enquadram nas funções da LPFP? Se assim é, estará a LPFP disponível para fazer esta mesma apresentação a outros grupos de adeptos dos restantes clubes, caso o pretendam? Deve a LPFP falar diretamente com adeptos de um clube ou deve falar com os próprios clubes? Será que esta operação de charme é assim tão crucial para que a negociação de direitos da centralização de TV tenha mais sucesso? A principal preocupação da LPFP não deveria ser a sensibilização dos clubes para que sejam criadas regras de forma a tornar a nossa liga, globalmente, num produto muito mais atrativo? De uma forma sincera, parece-me que a LPFP deve- ria direcionar os seus recursos (que são limitados) para não permitir que, por exemplo, treinadores faltem a conferências de Imprensa antes de jogos (FC Porto e Benfica, por exemplo), em vez de tentar criar uma boa imagem perante um grupo de adeptos, em circuito fechado. Para finalizar, e analisando o tema da centralização dos direitos de TV, o que me parece é que estamos a querer construir esta casa pelo telhado, ou seja, primeiro queremos conseguir um bo- lo grande e depois é que nos vamos preocupar em criar um produto mais interessante e apelativo. O que deveria ser feito era o contrário, criar regras para poder tornar o nosso produto mais valioso e, aí sim, vendê-lo com capacidade para gerar maior retorno financeiro.
A CRENÇA DE RÚBEN AMORIM
OSporting, na Liga Europa, fez um grande jogo frente ao primeiro classificado da Premier League inglesa. Com muito menos armas do que o Arsenal, Rúben Amorim conseguiu fazer com que os seus jogadores interpretassem na perfeição o que tinham de fazer. A mentalidade que o Sporting transportou para dentro das quatro linhas foi a chave do bom desempenho, num ano em que muita coisa tem corrido mal.
A estratégia preparada, a capacidade de sofrimento, a força mental, a união, a agressividade que colocou nos duelos e a simplicidade de movimentos ofensivos foram fundamentais para colocar em sentido rival tão poderoso. Os adeptos, puxados pelos jogadores, também tiveram papel importante. O Sporting, mais uma vez, demonstra que é uma equipa capaz de se bater contra qualquer adversário apenas num jogo. O mesmo não sucede nas maratonas pelo número muito limitado de opções no plantel.
A VALORIZAR
Gonçalo Ramos. Mais uma grande exibição, coroada com dois golos e uma assistência, num jogo de Liga dos Campeões. Destaca-se não só pela capacidade de fazer o mais difícil no futebol (golos), mas também pelas desmarcações, trabalho defensivo e leitura de jogo.
Rúben Amorim. Podia ter saído com uma vitória no jogo frente ao Arsenal. Estrategicamente preparou muito bem o jogo, condicionando o adversário e potenciando os pontos fortes da sua equipa. Um belo cartão de visita para potenciais interessados em Inglaterra.
A DESVALORIZAR
PSG. Dinheiro não garante títulos. Para ganhar a Liga dos Campeões não basta ter uma equipa recheada de qualidade individual. Ao PSG falta união, compromisso, qualidade coletiva, equilíbrio e sacrifício.