Tudo às cabeçadas na Calimero TV
Eu, ingénuo, me confesso. Assumo ter acreditado que a relação entre três presidentes com experiência de balneário significaria uma nova fase no futebol português, mas os últimos dias deixaram pouca ou nenhuma margem para alimentar a ilusão. Afinal, o antigo jogador do Benfica, o antigo treinador do FC Porto e o antigo médico do Sporting são incapazes de contrariar certos vícios do passado. Podem ter oferecido novas perspetivas aos seus adeptos, mas pouco parecem dispostos a fazer pelo futebol português. Quando olham para dentro, só conseguem ver as suas cores. Desafiados a apresentar uma visão moderna, decidiram recuperar uma personagem de animação criada em 1963.
A casca de ovo fica bem na cabeça de quem vive de queixas e queixinhas, manobra para desviar atenções tão antiga quanto o referido pintainho, mas, por este andar, o crucial processo de centralização dos direitos televisivos vai ganhar o nome de Calimero TV.
Nem era preciso que Villas-Boas viesse dizer que «os presidentes não se podem ver uns aos outros» e que andam «às cabeçadas». Há muito sabemos que é cada um por si e todos contra todos no futebol português. O presidente portista até pediu ajuda à Liga e à FPF, mas nessas instâncias a estratégia mantém-se: desvalorizar ou fingir que nada se passa. De tal forma que Pedro Proença, focado na organização da «maior «summit de futebol do mundo», ainda não comentou algo que merecia esclarecimento imediato, tal a gravidade da declaração de Frederico Varandas sobre o alegado «mapeamento das afinidades dos órgãos sociais da FPF».
Esta guerra aberta colide com a sede de internacionalização que está bem patente nos inglesismos da Summit, mas é justo valorizar o evento. O melhor exemplo talvez tenha sido o presidente do Famalicão, pela forma como explicou a importância do mercado interno, utilizando o uruguaio Manuel Ugarte como modelo, já que Miguel Ribeiro vendeu-o ao Sporting por um valor três vezes maior do que comprou, e os leões transferiram-no para o Paris Saint-Germain por 10 vezes mais. Promover esse círculo será benéfico para o futebol português, em alternativa a um modelo que insiste em contratar fora, quando tantas vezes nada acrescenta ao que existe por cá. Até porque, como disse Villas-Boas no mesmo evento, «os Vinícius Jr. da vida já são contratados por Chelsea e Real Madrid em vez de FC Porto e Benfica».
Mais uma razão para olhar para dentro.