Sempre a cultura. Sempre!
We all want a strong culture. We all know that it works. We just don’t know quite how it works.
Cultura, estratégia e pessoas. Apesar do desporto de alto rendimento ter características muito próprias em determinados momentos, especialmente pela emoção e pelo impacto imediato do resultado em várias decisões profundas, a fórmula para um sucesso robusto em clubes e federações assenta nesses três elementos.
Há quem defina primeiro a estratégia e depois a cultura que pretende para casar ambas. No entanto, no desporto, pela própria cultura do clube e da indústria desportiva, tem um peso muito maior e é bem mais difícil de alterar, sobretudo em estruturas que carecem de maturidade. Que, infelizmente, acontece em muitos casos, se estivermos atentos a determinados episódios, quer em clubes profissionais quer em dirigentes. E percebemos que a melhor solução é mudar as pessoas. Porque raramente mudam, de forma profunda, os seus valores.
O acesso a várias histórias dos clubes sobre o seu (in)sucesso mostra-nos que estão quase sempre ligadas à cultura vivida ou tentada implementar nos clubes. O Athletic Bilbao é talvez um dos melhores exemplos. Dizia-me Oskar Coca, diretor de formação: «No nosso caso, vemos a particularidade do nosso clube como uma oportunidade para ser ainda mais exigente no processo de formação, não só dos jogadores, mas de todas as pessoas que nele participam. Representamos mais do que um clube. A cultura impacta no recrutamento.»
Se este é um caso muito específico, o exemplo recente mais visível talvez tenha sido o PSG. A questão não está tanto no que se gastou (já ninguém vence a Champions com trocos), mas sim na mudança de cultura e de estratégia, gastando menos, mas mudando abruptamente o perfil. Indo ao encontro de uma ideia mais duradoura. Mais atrás, tivemos o caso da cantera do Barcelona no futebol, as seleções do hemisfério sul no râguebi, ou os míticos Chicago Bulls, Boston Celtics e LA Lakers na NBA, só para dar alguns exemplos.
Sempre o dinheiro. Sempre que um clube com grande orçamento vence uma competição, muitos justificam o triunfo com o dinheiro. Mas quantas equipas ricas não vencem nada durante anos? O orçamento não pode servir de desculpa para perder contra quem gasta mais, se o mesmo critério não serve para explicar derrotas contra quem gasta menos. Dinheiro a mais desfoca da importância de definir uma excelente estratégia.
O que constrói (ou destrói) uma cultura? Estas devem ser as prioridades constantes de quem lidera. Apesar de a cultura poder ser definida pelo líder, o (des)alinhamento sente-se em toda a organização. E os primeiros a percebê-lo são atletas e treinadores, os que mais rapidamente sofrem as consequências dos maus resultados. Por isso, filtram cada desalinhamento entre o que é exigido e o que é praticado. Desorganização, incoerência, inverdades ou comportamentos desajustados minam qualquer estratégia. No fim do dia, os exemplos valem mais do que as palavras.
Como dizia Jorge Braz, selecionador nacional de futsal, no meu último livro: «A cultura organizacional pode ter um impacto brutal no nosso trabalho, nas regras de vida coletiva, porque nos pode ajudar a elevar a fasquia daquilo que pretendemos. A própria organização, no seu dia a dia, dá-nos vários sinais de exigência constante.»
Construir uma cultura forte leva tempo. Sei que os grandes clubes precisam de vencer hoje. Mas é preferível construir uma base sólida, ainda que no início se vença menos, do que investir todos os anos como se não houvesse amanhã e acabar por vencer pouco ou nada. Outro perigo é deixar que o sucesso alimente a soberba: quando as vitórias constantes fazem baixar a exigência interna sem que as pessoas se apercebam, abrem-se portas a derrotas inesperadas, normalmente contra equipas com orçamentos muito mais baixos.
Uma boa analogia é o próprio jogo: a identidade da equipa é uma ordem implícita que molda atitudes e comportamentos de forma duradoura por parte do treinador. As normas definem o que é encorajado, desencorajado, aceite ou rejeitado. E sabemos bem o que acontece quando surgem incoerências ou mentiras: isso destrói qualquer cultura, estratégia e motivação.
Um dos papéis mais importantes de um presidente ou CEO é ter consciência da cultura existente. Os líderes mais imaturos e/ou despreparados veem a cultura como último recurso. Os melhores fazem a si próprios, todos os dias, a pergunta essencial: qual o contexto certo para que as pessoas produzam mais e melhor?
No desporto, ainda há um fenómeno curioso: treinadores ou atletas que criam microculturas capazes de gerar os comportamentos de que necessitam quando percebem que o clube não responde as suas necessidades organizacionais.
Muitas vezes, o que destrói mais rápido do que qualquer adversário é a procura da autoexposição, a sede de aparecer apenas nos bons momentos. Essa entropia consegue aniquilar as melhores vontades. As pessoas estão na génese das melhores organizações e equipas, mas também são os maiores impedimentos de estruturas com bastantes recursos de darem os passos seguintes e positivos. A liderança máxima tem de assegurar, sem que seja necessária a sua presença constante, que estas situações não ocorram.
Concluindo, culturas fortes elevam os clubes para criarem, terem e viverem para uma missão, um propósito e definem quais valores da sua identidade. Inspiram colaboradores, geram orgulho de pertença e estabelecem uma espécie de código invisível que dita o que se pode ou não fazer. No fundo, todos nós queremos culturas fortes nas nossas equipas. Todos sabemos que funcionam. Só não sabemos bem como funcionam.