Nuno Gomes: «Não há clube que resista a tanta instabilidade»
- Como foram passadas as longas horas de contagem dos votos?
Foram realmente longas horas e foi um processo que demorou a ser conhecido. Houve sempre aquela expectativa de saber quem iria ganhar ou se iria haver segunda volta. E cá estamos de novo para ir a eleições no próximo dia 8, com vontade de explicar aos benfiquistas mais uma vez o nosso projeto, aquilo que defendemos e o que achamos que o Benfica pode ser no futuro.
- Foi difícil para vocês perceber que não iriam ganhar?
Os benfiquistas são soberanos e votam em consciência naquele candidato que acham que será o melhor para o futuro do clube. Acho que nos deram um voto de confiança para, nestes dias que faltam até ao dia 8, nós voltarmos a reforçar as nossas ideias. Para voltarmos a reforçar o nosso projeto, darmos a conhecer ainda mais as pessoas que estão com o João Noronha Lopes e que somos uma lista com gente competente e capaz para alterar o rumo do Benfica do que tem seguido nos últimos anos.
- Houve alguma parte dessa mensagem que não passou, porque se tivesse passado como acreditavam, os resultados teriam sido outros.
Com seis candidatos, foi normal haver uma grande dispersão de votos e, portanto, no final os benfiquistas decidiram que deve haver uma segunda volta entre os dois mais votados. Vamos perceber em quem vão votar nesta segunda volta as pessoas que foram votar nos outros candidatos. A nossa expectativa é que a maior parte dessas pessoas possa votar em João Noronha Lopes.
Carinho por Rui Costa enquanto jogador? Eu também sou ex-jogador do Benfica
- João Noronha Lopes teve 27.109 votantes e Rui Costa 32.898, o que diz que há aqui uma diferença de votantes de 5.789 sócios do Benfica, muitos deles com 50 votos. Essas pessoas estão mais ligadas a Rui Costa pelo carinho que têm pelo jogador que foi? O carisma de Rui Costa enquanto jogador é uma vantagem para ele enquanto candidato e uma desvantagem para a vossa lista?
Eu também sou ex-jogador do Benfica. Joguei 12 anos da minha carreira no Benfica e amo o Benfica tanto como os outros benfiquistas amam. Não há benfiquistas de primeira nem de segunda. São todos iguais. Todos nós sofremos pelo Benfica, todos nós vamos votar de acordo com aquilo que esperamos ser o melhor para o futuro, no candidato que nos transmite uma maior confiança, também naquilo que poderá mudar ou não no futuro do Benfica.
- João Diogo Manteigas assumiu que vai votar em João Noronha Lopes, mas disse que era uma «mudança fofinha» e não uma mudança radical, como o Benfica precisa. Nesta segunda volta há um lado da continuidade e outro da mudança?
Eu interpreto os resultados olhando para aquilo que foram os mais de 50% dos votantes que não votaram em Rui Costa e preferiram votar noutros candidatos. João Diogo Manteigas representava também o rosto de uma mudança, que eu acho que João Noronha Lopes também a representa, mas nós não queremos fazer uma mudança que seja radical. Eu já trabalhei no Benfica, outros que pertencem à lista, e que irão trabalhar no Benfica caso João Noronha Lopes vença, acreditam em muitos dos colaboradores que trabalham atualmente no Benfica e sabem reconhecer o valor deles. Nós não vamos fazer essa mudança radical no sentido de chegar e cortar com o passado e com as pessoas, porque acreditamos nelas. Sabemos que há gente que trabalha atualmente no Benfica que tem muito valor e que, se calhar, esse valor não tem sido reconhecido nos últimos anos e não tem de ser só quando há eleições.
- Durante esta campanha falaste várias vezes do quão importante é para o Benfica fazer uma mudança urgente. Isso tem por base o quê, enquanto vice-presidente?
Mais do que tudo queremos devolver a alegria dentro de campo aos sócios e aos adeptos do Benfica, que reconheçam uma equipa de futebol com identidade. Nos últimos anos tem havido uma série de troca de jogadores, inclusive de treinadores, que não permite que haja essa construção de identidade. Nós vamos querer ter muita atenção a esse aspeto e vamos querer ganhar, ganhar e ganhar. Ganhar à Benfica é uma expressão muito usada, mas infelizmente temos ganhado alguns jogos, perdido outros, mas os jogos que temos ganho saímos do estádio com a sensação que não foi uma vitória à Benfica. Nós queremos que os adeptos se sintam emocionados, empolgados com aquilo que foi e aquilo que é o que esperamos do futebol do Benfica. Se calhar no primeiro ano de Roger Schmidt os adeptos sentiram isso. Se calhar com Jorge Jesus também houve essa euforia de irmos ao estádio e de vermos o Benfica a dominar um jogo. E pelo menos naquela primeira passagem do Bruno Lage, quando o Benfica é campeão, naqueles últimos seis com o João Félix a ser importante, também empolgou os adeptos e é isso que nós sonhamos e queremos. Temos de analisar de uma forma fria aquilo que têm sido os últimos quatro anos de investimento em jogadores, de vendas e de compras, e defendemos que é quase praticamente impossível uma equipa ter sucesso desportivo quando não tem essa estabilidade. Quando não tem um grupo de jogadores que possa ficar mais de uma ou duas épocas no plantel e que saiba aquilo que representa ser jogador do Benfica. Para que possam receber jogadores que chegam e que lhes seja transmitido muito rapidamente aquilo que é jogar no Benfica, para que eles percebam que o Benfica não pode ser, nem é, um trampolim para outros voos. O Benfica tem de ter jogadores que saibam o que representa ser jogador do Benfica. Acreditamos que é preciso uma maior estabilidade, principalmente a nível de jogadores, e já agora de treinadores, Nos últimos quatro anos, além de mais de 400 milhões investidos em jogadores, também investimos em três ou quatro ou cinco treinadores e, lamento dizer, mas não há clube que resista a tanta instabilidade naquilo que toca à construção de um plantel.
Fui eu que apresentei o nome de Roger Schmidt ao Rui Costa
- Por falar em treinadores, que papel tiveste na vinda de Roger Schmidt para o Benfica?
Desde que acabei a minha carreira de jogador de futebol não houve um único ano em que eu não trabalhasse. Nas últimas semanas até fui chamado de incompetente muitas vezes e de não ter experiência. Acabei a carreira em agosto de 2013 e rapidamente comecei a trabalhar no Benfica como diretor de Relações Internacionais. Depois fui nomeado diretor do atual Benfica Campus. Quando saí do Benfica, fui trabalhar. E um dos trabalhos que acumulava com outros era ajudar na empresa do meu irmão e essa introdução de Roger Schmidt ao Benfica surge na sequência de um trabalho que eu estava a desempenhar nessa altura, e sim, é verdade que fui eu, através de um outro empresário, que me contactou para o ajudar, que apresentei o nome de Roger Schmidt ao Rui Costa. Confirmo que existiu a minha intervenção na vinda de Roger Schmidt.
- Orgulha-te de alguma forma de teres indicado um treinador que acabou por ser campeão no clube?
Sim, infelizmente nos últimos quatro anos o Benfica só ganhou uma vez e foi com Roger Schmidt. Acho que nesse ano apresentou um futebol que empolgou os adeptos, de uma forma que se calhar não voltámos a ver até aqui.
- Também estiveste envolvido na rescisão do contrato?
Não. Estive envolvido na vinda, apesar de ter contacto regular com o Roger Schmidt, porque criei amizade com ele e com a família, não estive envolvido, seja na renovação, seja naquilo que foi a rescisão do contrato.
«Tentativas de denegrir a minha imagem»
- Durante estes dias, uma das notícias que veio a público teve a ver com uma investigação do Ministério Público por causa da transferência do jogador líbio Elhouni, em 2016, na altura do Santa Clara para o Benfica B, quando eras diretor do Benfica Campus. O que aconteceu?
Essa foi uma das tentativas de denegrir a minha imagem. Eu enquanto diretor geral da formação do Benfica nada tinha a ver com assinaturas de contratos de jogadores para a equipa B e para a equipa A. Não fui informado sobre a contratação desse jogador, e ao que sei esse jogador foi proposto ao diretor de scouting na altura, pelo meu irmão, através do empresário do jogador, que contactou o meu irmão para apresentar ao Benfica. Passado um período de observação e de análise, o Benfica resolveu contratar o jogador e foi o que se passou. Não tive rigorosamente nada a ver com o negócio, nem tive conhecimento dos contornos do negócio. Ninguém foi chamado à justiça por causa desse negócio.
A saída da empresa do irmão
- Quando a 1 de agosto decides sair dessa empresa com o teu irmão, a Nplayers, foi porque sabias que ao apoiares Noronha Lopes haveria uma série de informações que começavam a circular?
Sim. Eu considero que para trabalhar no Benfica tem de se trabalhar em exclusividade. Quando fui convidado por João Noronha Lopes, como é óbvio, eu não podia dar a cara por ele e estar ligado a uma empresa de agenciamento. E, decidi, juntamente com o meu irmão, que iria sair da empresa porque não é compatível estar a fazer campanha e, ao mesmo tempo, estar a trabalhar numa empresa de representação e intermediação de jogadores e treinadores. Saí da empresa porque ao entrar no Benfica não vai haver qualquer tipo de negócios em que a Nplayers, a empresa do meu irmão, seja envolvida. Esquece, não há a mínima hipótese. Confio na pessoa e na integridade do João Noronha Lopes naquilo que ele acha que o clube deve ser, na visão que ele tem para o futuro do clube. Ele inspira-me e se fosse um novo Vale e Azevedo, eu não estaria ao lado dele, sem sombra de dúvidas.